Primeira encíclica de Bento XVI deve confirmar grandes linhas de actuação e reflexão No dia 19 de Abril de 2005, ao final da tarde, os Cardeais eleitores escolhiam o Cardeal Joseph Ratzinger para suceder a João Paulo II. A eleição gerou uma onda de desconfiança perante a herança de um pontificado excepcional, de 26 anos e meio, num mundo em mudança, com desafios específicos em cada continente: desde a pobreza e as desigualdades sociais à secularização e indiferença religiosa, passando pelo diálogo com as outras religiões e o relativismo moral. Quando, há quase 27 anos, foi apresentado ao mundo o Cardeal Karol Wojtyla houve uma espécie de atordoamento geral; há nove meses, pelo contrário, todos sabiam (ou julgavam saber) quem era aquele homem que surgia vestido de branco. A verdade é que o Papa de quem se esperavam duras tomadas de posição sobre temas de moral ou de liturgia opta por dedicar a sua primeira encíclica aos temas da caridade e do amor. A decisão confirma a tendência mais conciliadora de Bento XVI, que enquanto Cardeal prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé tinha uma missão bem diferente, podendo deixar mesmo adivinhar a intenção de favorecer uma perspectiva reformadora da própria Igreja – embora para isso seja preciso esperar pelo próprio texto. “Deus Caritas est”, com publicação anunciada pelo Papa para 25 de Janeiro, fala do conceito do amor nas diversas dimensões. “Ali surge a caridade cristã, como único movimento em diversas direcções”, referiu esta manhã, na audiência geral. À primeira vista, parece que estaremos na presença de um texto eminentemente doutrinal, mas é admissível esperar que a primeira encíclica retome, pelo menos, algumas das ideias do primeiro discurso de Bento XVI, após a sua eleição. Nesse dia, o Papa comprometeu-se a dar continuidade à dinâmica gerada pelo II Concílio do Vaticano, que abriu à Igreja ao mundo, nos passos do seu predecessor, João Paulo II, que “deixou uma Igreja mais corajosa, mais livre, mais jovem”. O Papa considera, desde então, que a reconciliação entre os cristãos é o seu “compromisso primário” ao qual se prometeu entregar “sem poupar energias”. A luta contra a “ditadura do relativismo” tem sido a bandeira destes meses, nos quais o Papa se adaptou à missão de ser o líder de mais de mil milhões de pessoas em todo o mundo. A crescente globalização abre problemas novos, na relação com o mundo e na definição da Igreja: colegialidade, prática litúrgica, ministério da presidência, questões éticas, doutrina social, pastoral familiar, produção teológica, tudo o que se conseguir pensar sobre as comunidades eclesiais. Os constantes conflitos internacionais e as desigualdades no campo socio-económico são ainda outro desafio, depois de João Paulo II ter feito da Igreja uma referência moral nesse campo, mesmo em países não católicos. A Igreja de amanhã, porque é nela que falamos, não será fechada em si mesma numa defesa auto-apologética ou na restauração de um velho confessionalismo – mesmo se era isso que muitos esperavam de Joseph Ratzinger. Questões como o lugar do Cristianismo na Europa, o secularismo, as desigualdades sociais, as catástrofes da humanidade, o terrorismo e as relações diplomáticas têm marcado este arranque de pontificado. O Papa olha, agora, para dentro da Igreja e deve apresentar, na sua encíclica, o “amor” como condição necessária para fazer frente aos desafios mais prementes que hoje se colocam aos católicos e à sociedade em geral. Primeira mensagem de Bento XVI • Papa apresenta o seu programa de pontificado
