Enfrentar a fragilidade da doença e treinar líderes para o serviço, duas experiências portuguesas em Taizé

Animadores do grupo Terceiro Dia e da Academia Ubuntu falaram das suas experiências

António Marujo, jornalista do religionline.blogspot.pt; em serviço especial para a Agência ECCLESIA (o autor escreve segundo a anterior nota ortográfica)

Taizé, França, 24 ago 2015 (Ecclesia) – Foi na sequência de uma recidiva de um cancro que Mariana Abranches, 43 anos, arquitecta paisagista, pensou que precisava de um grupo assim: pessoas que passassem por doenças graves, mas com vontade de vencer os problemas que a situação provoca.

Surgiu, assim, o Terceiro Dia, grupo que reúne actualmente 16 pessoas, com várias doenças: cancro da mama, doença de Gilbert, Alzheimer, artrite reumatoide… Em comum, têm ainda a profissão de fé cristã.

“Procuramos o melhor caminho para a aceitação da realidade da doença e para nos encontrarmos como pessoas”, diz Mariana.

Chama-se Terceiro Dia, numa alusão à ressurreição de Jesus. Foi uma das experiências portuguesas apresentadas em Taizé (Borgonha, França), nos últimos dias, no âmbito do encontro Por uma Nova Solidariedade.

Na semana de 9 a 16 de Agosto, o encontro assinalou os 100 anos do nascimento do fundador de Taizé, o irmão Roger, bem como os dez anos da sua morte e os 75 anos da sua chegada à aldeia.

A fundadora do grupo diz agora à ECCLESIA que não esquece o que atravessou: um cancro da mama com duas recidivas, uma filha que teve de fazer quimioterapia entre os dois e os quatro anos (hoje, com dez anos, está bem), “pessoas que diziam coisas horrorosas, como de que Deus devia gostar muito de mim, para me fazer sofrer e me pôr à prova desta maneira”.

Não era nesse Deus que Mariana acreditava. “Deus está nos mais vulneráveis”, diz.

A 9 de Abril de 2013, o primeiro grupo de cinco pessoas reuniu no Porto. “Jesus não precisou de três dias para ressuscitar”, ouviu ela dizer ao padre jesuíta Vasco Pinto de Magalhães, numa catequese.

“Os apóstolos é que precisaram. O primeiro dia foi o do desânimo, pensando que aquilo não estava a acontecer. O segundo foi o dia de fazer perguntas, porque Jesus tinha dito que ressuscitaria. O terceiro é o dia de começar a fazer caminho com uma nova realidade. Foi o tempo que os apóstolos precisaram “para sair do choque, da queixa e da angústia”.

Depois, acrescenta Mariana Abranches, o caminho pode demorar muito tempo, pode ter de ser reiniciado.

Mariana sonha estender a experiência a mais pessoas. “Não é um grupo de autoajuda, mas antes de combater a tentação do fechamento em si mesmo. Trata-se de ouvir o outro e dar voz aos mais pobres, na fragilidade.”

Também do Porto, chegou a Taizé a experiência da academia Ubuntu.

Filipe Pinto, casado com Mariana, formado em gestão, trabalha com o Instituto Padre António Vieira.

A experiência Ubuntu é inspirada numa ideia zulu, da África do Sul: “eu sou, porque tu és”. Há dois anos, a academia começou, em Lisboa, a trabalhar com imigrantes e seus descendentes (há ainda um polo na Guiné-Bissau).

Com o evoluir da experiência, abriu-se o leque e o estilo de participantes, atingindo também pessoas em contextos vulneráveis ou outras que, não vivendo essa realidade, pretendem trabalhar nessa situação.

Quinzenalmente, aos sábados, durante dois anos, os participantes aprendem estratégias e pedagogias para lidar com o outro, para desenvolver programas de liderança de serviço, inspirados em personalidades como Nelson Mandela, Desmond Tutu, Luther King ou Teresa de Calcutá.

 O que se aprende no primeiro ano é devolvido, no segundo, em projectos sociais. A reabilitação do espaço público, por exemplo, é um deles.

Numa das acções, a GNR colaborou: os alunos vestiam a farda e os agentes faziam de manifestantes. “Todos reflectiram sobre os desejos e aspirações de um lado e sobre a necessidade da ordem ou o que é estar com uma farda e ser atingido por objectos”, explica Filipe. 

AM

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