A Palavra de Deus que acabamos de escutar permitiu-nos ouvir novamente vários anúncios pascais:
Segundo o Evangelho de São João, Maria Madalena, na manhã do primeiro dia da semana, “(…) foi ter com Simão Pedro e com o discípulo predileto de Jesus e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram»”.
Na mesma página do Evangelho relata que, depois de Pedro entrar no sepulcro vazio, entrou também João (…) que “viu e acreditou”; isto é, acreditou que Jesus tinha ressuscitado.
Na primeira leitura, tomada dos Atos dos Apóstolos, Pedro anunciou com entusiasmo e coragem a toda a gente presente em Jerusalém: “(…) eles mataram-n’O, suspendendo-O na cruz. Deus ressuscitou-O ao terceiro dia (…)”.
E também na segunda leitura, tomada da Epístola de São Paulo aos Colossenses, o Apóstolo exorta: “Se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus” (Cl 3,1).
Estas citações permitem-nos entender um aspeto fundamental da missão da Igreja através dos séculos até hoje: anunciar e testemunhar que Jesus ressuscitou. Esta é a verdade principal que também hoje a Igreja deve anunciar: Jesus ressuscitou. É a verdade que cada um de nós deve crer e testemunhar com coragem, como Pedro, também nos nossos dias: que Jesus, o Salvador único e universal, foi ressuscitado por Deus Pai e reina no Céu à espera da sua vinda gloriosa e definitiva. É o anúncio que há vinte séculos a Igreja, sobretudo mediante a sua ação evangelizadora e missionária, espalha por todo o mundo, convidando as pessoas a crer em Jesus ressuscitado.
A celebração do Mistério Pascal é, portanto, um momento de graça no qual cada um de nós é convidado a verificar se a própria experiência de fé está verdadeiramente fundada no Mistério da Ressurreição de Jesus. Trata-se da verdade que constitui o eixo central em torno do qual adquirem significado e beleza todas as outras verdades de fé.
E se efetivamente a Ressurreição de Jesus ocupa o centro da nossa experiência de fé, há toda uma série de consequências na maneira de ver e realizar a nossa vida e a nossa ação apostólica. A este respeito São Paulo, na segunda leitura de hoje, faz duas recomendações:
A primeira é: “Aspirai às coisas do alto, onde está Cristo. (…).:
Isto significa olhar sobretudo para os Céus donde está o nosso Deus, que Jesus nos ensinou a invocar com as palavras: “Pai nosso que estais nos Céus”;
significa estar em comunhão com a Igreja triunfante constituída pela Virgem Maria, os anjos, os santos e todos os que já merecem gozar da glória do Paraíso;
significa não se cansar de olhar o céu, a meta final donde está a nossa Pátria celeste;
significa estar numa vigilante espera da vinda gloriosa de Cristo, que julgará a todos para avaliar se seremos dignos de receber o prémio ou o castigo;
significa viver intensa, generosa e corajosamente esta vida, uma peregrinação terrena, para ser depois dignos de receber o prémio eterno.
E a segunda recomendação de São Paulo é a seguinte: “Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra”:
Isto significa cortar os vínculos excessivos ou até desordenados que podemos ter com as pessoas e as coisas;
significa estar dispostos a renunciar a coisas, projetos, e satisfações humanas para se entregar totalmente ao Senhor;
significa estar dispostos a doar até a própria vida e as próprias coisas para ser fiéis ao Senhor e responder adequadamente ao seu imenso amor;
significa não buscar o próprio interesse pessoal ou o que nos agrada para estar disponíveis para fazer, como a jovem Maria, a vontade do Senhor;
significa manter-se livres de muitas coisas para estar dispostos a sacrificar e oferecer a própria vida por amor a Deus e aos irmãos;
significa, crer na justiça divina e, portanto, aceitar as limitações da justiça humana.
Tudo isto não é uma fuga das responsabilidades que temos na comunidade humana. Ao contrário, na medida em que aspiramos às coisas do alto e nos afeiçoamos às do Céu, adquirimos a capacidade e a generosidade de entregar tudo, hoje e aqui, para merecer o prémio eterno. Se há cada vez menos pessoas dispostas a sacrificar-se pelo Senhor, pela Igreja, pelos irmãos, por um mundo melhor, é porque estão afeiçoadas às coisas da terra. Se há poucas vocações à vida sacerdotal e religiosa, significa que falta entre os jovens a capacidade de se entregar pelos outros, ignorando que receberemos o cêntuplo nesta terra e a vida eterna (Mc 10, 29-30).
À luz das reflexões que acabámos de fazer, pedimos à Virgem Maria, a fim de que nos ajude a adquirir um autêntico espírito pascal, segundo o qual saibamos testemunhar com as palavras e as ações a nossa fé na Ressurreição de Jesus e a nossa esperança na nossa futura ressurreição.
Igreja Catedral, Angra, 17 de abril de 2022
D.Ivo Scapolo, Núncio Apostólico