Inês Simões apresenta projetos da organização focados no acesso e na adoção de práticas sustentáveis
Lisboa, 21 mar 2024 (Ecclesia) – A coordenadora do departamento de cooperação da Fundação Fé e Cooperação (FEC) defende que é “inquestionável” que o acesso à água pelas populações contribui para “uma maior coesão social”, quando muitas vezes a escassez é fonte de discórdia.
“Não só a água, mas outros bens, mas quando conseguimos que eles existam e que estejam disponíveis para todos, existe uma maior coesão social, isso é inquestionável. A questão é que quando este acesso à água efetivamente não é igual para todos, provoca aqui algumas questões”, afirmou Inês Simões, em entrevista à Agência ECCLESIA.
A conversa decorreu no âmbito do Dia Mundial da Água (22 de março), declarado em 1993 e promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU).
“A nível mais comunitário, aquilo a que nós assistimos, quando nós não temos a água tão disponível nas comunidades, as mulheres e as crianças normalmente são quem têm a tarefa de ir buscar a água, têm que percorrer cada vez distâncias mais longas e o que é que isto faz? Faz com que também exista uma maior abstenção escolar”, lamenta.
Outra das questões que se levanta com a falta de acesso a este recurso é a transumância, isto é, a deslocação periódica dos rebanhos, da planície para as montanhas e vice-versa, que fica implicada.
“No fundo, são os pastores que têm o gado e que cada vez têm que percorrer distâncias maiores para que o gado tenha acesso à água e a pastagem. Portanto, no sul de Angola, esta é uma questão bastante importante, porque temos uma grande comunidade que faz este tipo de atividade e, por isso, é uma questão”, destacou.
“Se nós conseguirmos efetivamente garantir melhores condições de água dentro das próprias comunidades, estas questões são minimizadas”, acrescentou.
A Fundação Fé e Cooperação desenvolve esforços na defesa da utilização e controlo dos recursos de água potável, objetivo defendido pela ONU, em vários países lusófonos como Guiné-Bissau, Moçambique e Angola, cuja intervenção é adequada tendo em conta o contexto em que estão inseridos.
“No Natal apoiámos uma organização exatamente nesta temática da água, em Moçambique também num projeto na área de educação inclusiva, também construímos recentemente um ponto de água numa das escolas com as quais trabalhamos e, portanto, é sempre uma preocupação o trabalho nesta questão da água e do acesso à água potável”, explicou Inês Simões.
A responsável destaca que a FEC tem em Angola um trabalho “mais sustentado”: “O sul de Angola, pela questão das alterações climáticas, está muito sujeito à questão das secas, com a questão das secas vem a questão da insegurança alimentar e nutricional e a diminuição no acesso e na disponibilidade de água, e é nesse sentido que nós estamos a trabalhar, portanto, com projetos nestas áreas”.
Atualmente, a organização não governamental leva a cabo o projeto MA TUNINGI, que tem como objetivo “contribuir para a redução da fome, pobreza e vulnerabilidade à insegurança alimentar e nutricional das comunidades afetadas pelas mudanças climáticas na província do Namibe, através do fortalecimento sustentável da agricultura familiar, conservação e uso sustentável dos solos e pastos”.
Segundo a responsável, o projeto incide sobre cinco cooperativas agrícolas, com foco no acesso à água, sendo trabalhada a questão da formação e capacitação em técnicas agrícolas mais sustentáveis.
“As cooperativas são compostas por vários agricultores, mas cada cooperativa, no âmbito do projeto, elaborou aqui um campo demonstrativo onde, no fundo, são colocadas em prática algumas técnicas agrícolas e algumas culturas que, até então, não eram utilizadas pelas populações”, sustentou.
Inês Simões refere que o espaço conjunto onde as técnicas são aplicadas é uma solução ao receio que alguns agricultores tinham de começar a implementar as culturas nas próprias lavras familiares.
“Foram construídas cinco infraestruturas de água, uma para cada um destes campos demonstrativos das cooperativas e, no fundo, o que é que estas infraestruturas têm? Têm um sistema de rega gota a gota, que, no fundo, vai permitir que exista uma disponibilidade das culturas que estão a ser trabalhadas nos campos”, indica, em entrevista emitida hoje no Programa ECCLESIA (RTP2).
Além disso, foi implementado um chafariz em cada uma das infraestruturas, que depois estende o acesso às comunidades beneficiárias.
“Fizemos análises para ver a qualidade da água que estava disponível nestes chafarizes e, no fundo, aquilo que demonstrou foi que esta água não é um risco para a saúde pública”, disse a coordenadora, que adianta que, em conjunto com as autoridades locais, foram realizadas ações de sensibilização junto das “comunidades para uma correta utilização da água”.
Não faz sentido nós estarmos a implementar infraestruturas sem qualquer envolvimento da comunidade, é muito importante envolver até para existir uma apropriação por parte da comunidade daquilo que são as infraestruturas que estão a ser colocadas. Só desta forma é que nós também vamos conseguir que exista uma utilização sustentável”
A entrevistada lembra que “é importante perceber que quando se constrói este tipo de infraestruturas”, o trabalho é feito em parceria entre as autoridades e comunidades, sendo que estas últimas são capacitadas para pequenas reparações.
A FEC, criada em 1990, tem como missão promover o “desenvolvimento humano integral”, com a visão de construir uma sociedade onde cada pessoa possa “viver com dignidade e justiça”, atualmente desenvolve projetos em Angola, Guiné-Bissau, Moçambique e Portugal.
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