D. José Policarpo: A densidade da palavra e do silêncio no bispo conciliar

O II Concílio do Vaticano e a investigação sobre «Os Sinais dos tempos» cunharam os gestos pastorais do patriarca emérito de Lisboa, D. José Policarpo, que faleceu a 12 de março de 2014. Com 78 anos de idade (feitos a 26 de fevereiro), D. José Policarpo disse que na “aventura da liberdade”, a palavra foi “elemento decisivo, tantas vezes dramática”, mas também “sugestiva e iluminadora”.

O II Concílio do Vaticano e a investigação sobre «Os Sinais dos tempos» cunharam os gestos pastorais do patriarca emérito de Lisboa, D. José Policarpo, que faleceu a 12 de março de 2014. Com 78 anos de idade (feitos a 26 de fevereiro), D. José Policarpo disse que na “aventura da liberdade”, a palavra foi “elemento decisivo, tantas vezes dramática”, mas também “sugestiva e iluminadora”.

Na construção de uma vida, a palavra reveste-se da “densidade do drama, em que o leitor ou ouvinte é protagonista central”, sublinhou na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, a 21 de outubro de 2008. Na conferência «Literatura e o drama da palavra», D. José Policarpo frisou que nas primeiras etapas da sua vida não descortina “nenhum papel significativo da leitura”. Aquele período de vida foi o tempo “dos modelos vivos” de pessoas. “Esse é o perigo da influência marcante de personagens cuja vida” atrai quem acompanha os seus passos: “fazer da vida uma imitação”.

Anos mais tarde, o patriarca emérito de Lisboa conceptualizou que a vida “também é palavra” e que “as mais belas expressões da liberdade e da generosidade” são o fruto “fecundo da palavra escutada”. O risco de imitação foi relativizado pelo confronto com “pessoas «não-modelo», ou mesmo «anti-modelo”. Esta reflexão foi “uma experiência nova” que o levou a confrontar-se “com modelos que não conhecia”, que o “atraíam ou que rejeitava só pelo que escreviam”.

Neste amadurecimento entre a palavra e o silêncio, o cardeal que nasceu na freguesia de Alvorninha (Concelho das Caldas da Rainha) confrontou-se com questões fundamentais sobre o sentido da vida, “entre as quais a da existência de Deus ganhou uma centralidade inevitável, porque decisiva”. E acrescenta que procurou respostas “na literatura, mais do que em modelos vivos de pessoas que conhecia”.

D. José Policarpo vasculhou autores “que questionavam a existência de Deus, de Marx a Camus”. Depois destas leituras, o patriarca emérito de Lisboa conclui que os argumentos da razão não conseguiram dar-lhe força “para comprometer a vida com Deus”. A negação de Deus em nome da grandeza do homem e a história concebida “sem o desafio da transcendência” mergulharam-no “numa dolorosa sensação de vazio e de ausência de sentido”.

Na sua conferência, D. José Policarpo revela que está “grato” ao livro de Antoine de Saint-Exupéry, «Le Petit Prince», que foi “a cereja no bolo” na busca de uma palavra que lhe “pacificasse o coração”. Com este autor, o prelado percebeu que é preciso “deixar-se cativar” e que o “segredo da verdade passa pelo coração”.

A descoberta da beleza exprime “o drama e a densidade da existência”. Neste contexto, o cardeal emérito de Lisboa revela que a “etapa final” da caminhada humana “é sempre atracção da beleza”. Nesta descoberta que ultrapassa os olhos do homem, D. José Policarpo confessou que leu e visitou textos de Antero de Quental, Miguel Torga, José Régio, Fernando Pessoa e Sophia de Mello Breyner Andresen. Nesta caminhada literária percebeu que tantas vezes “o poeta, na sua palavra, se transcende a si mesmo”, exprimindo o recôndito “do que não quer ser, mas deseja ser”. Palavras e silêncios fundados nos «Sinais dos tempos» e na leitura atenta ao concílio convocado pelo Papa João XXIII.

LFS

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