Iniciativa aposta na leitura de poemas em língua portuguesa, italiana e dialeto romano para combater a solidão através do telefone 926134678
Lisboa, 05 fev 2021 (Ecclesia) – O projeto «A poesia faz companhia» quer levar a leitura de textos poéticos a pessoas em tempo de confinamento que, através de um telefonema, podem escutar esta arte literária em português, italiano ou dialeto romano.
“Temos tempo a mais, temos dons que não partilhamos, dispomos de livros e podemos dedicar mais tempo a nós a selecionar peças para partilharmos, e depois levarmos aos outros, promovendo a leitura”, explica Rui Teigão, que junto da namorada Federica Fiasca, impulsiona esta iniciativa.
A ideia nasce do amor que ambos têm à poesia e da possibilidade que encontram de, “ao ouvido”, fazer despertar nos outros a emoção que um telefonema pode iniciar, “como antigamente”.
“Um telefonema pode desencadear uma pequena emoção que faz a diferença no dia ou naquele momento. É uma emoção partilhada, nós também o sentimos. A leitura em voz alta cria emoção, e, neste caso, ainda mais porque não se olha quem lê, estamos no plano da audição e da concentração. O telefonema lembra um tempo antigo, quando se telefonava e confidenciava a vida. Passa emoção, proximidade, intimidade e surpresa”, relata.
Federica Fiasca conta que no primeiro confinamento em Itália, de onde é natural, e quando os teatros fecharam, “surgiram várias iniciativas, que envolveram informalmente artistas”, com disponibilidade para dirigir propostas à população.
“Gostaríamos de chegar a pessoas que não têm contacto com poesia, a pessoas mais novas. Todos nós conhecemos situações de pessoas que vivem isoladas e esta é uma forma de ir ao encontro delas. Pessoas em lares que, eventualmente, terão um recurso telefónico, acessível”, completa Rui Teigão.
A iniciativa começou no dia 21 de janeiro e, inicialmente previsto para a quinzena do confinamento decretado em Portugal, estende-se agora até, pelo menos, ao dia 14 de fevereiro.
Pelo número de telefone 926134678, todos os dias entre as 19h e as 20h, já passaram autores como Maria Teresa Horta, Fernando Assis Pacheco, José Tolentino Mendonça, Daniel Jonas, Manuel Gusmão, Florbela Espanca, Sophia de Mello Breyner Andresen, mas também autores italianos como Sandro Penna, Cristina Campo, Pier Paolo Pasolini, Alda Merini, Trilussa, Franco Arminio, Erri de Luca ou Poeti der Trullo, um movimento periférico poético italiano.
O casal fez uma seleção prévia de poemas que pudesse, neste tempo, transmitir “algum conforto, luz e abertura”.
A poesia sempre fez parte da formação de Rui Trigão, com um percurso em Teatro, Literatura portuguesa e francesa e, presentemente, a trabalhar na Direção Geral das Artes.
“Desenvolvi a leitura em voz alta mais recentemente. Sempre li, fiz teatro amador e leio em vários sítios, no projeto «Passo a rezar» (ligado aos Jesuítas), na comunidade da Capela do Rato, participei em vários momentos de poesia”, conta.
Já Federica Fiasca estudou Teatro e Ciência Política em Roma, e, atualmente, em Lisboa, está a fazer uma pós graduação de escrita de Teatro, e a trabalhar com projetos europeus para financiamento de Teatro e desenvolvimento público.
Recentemente uma senhora de 86 anos quis, também ela, partilhar um poema, recordam.
“Há espaço para reações humanas. Existe um fator de surpresa e é muito bom, não controlar tudo”, conta Federica Fiasca.
Todos os dias recebem chamadas e assiduamente, no final da leitura, “as pessoas querem saber mais, é um efeito positivo”.
“Trata-se de um momento de atenção quando falamos do livro, o nome do poema, a editora, o poeta, e acaba por desenvolver um interesse”, explica Rui Teigão.
Os autores apostam na divulgação da iniciativa que, asseguram, terá o tempo limitado do confinamento em Portugal, mas afirmam a vontade de chegar a outros com “amor e generosidade”.
LS