Frei Hermínio Araújo,Assistente Espiritual e Religioso do Hospital do Mar (Bobadela, Lisboa)
As alterações que se têm verificado, nas últimas décadas, em relação ao padrão epidemiológico e também as alterações sociais e demográficas estão na origem de novas necessidades de saúde e de apoio social. Estas necessidades exigem novas respostas, mais adequadas e específicas. Basta pensar nas doenças crónicas de evolução prolongada e na complexidade de patologias como as de cariz crónico degenerativo. Na maior parte dos casos, as pessoas chegam a situações de grande fragilidade pelas inúmeras perdas que vão ocorrendo. O aumento da esperança média de vida está na origem de um número crescente de pessoas com necessidades cada vez maiores. Estamos perante novos desafios: a criação de condições que permitam obter ganhos em saúde e evitar o isolamento e a exclusão social.
Em Portugal, foi criada, em 2006, a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, no âmbito dos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Solidariedade Social. A Rede tem a participação dos setores público, privado e social. A sua implementação tem sido progressiva: teve o seu início em 2006, e prevê-se um desenvolvimento em três fases, até 2016 (Fase 1: 2006 a 2009; Fase 2: 2009-2013; Fase 3: 2013-2016). Esta Rede procura responder às novas necessidades de saúde e de apoio social. Para isso, conta com muitas instituições da Igreja Católica e outras onde muitos católicos desenvolvem a sua missão, uns de forma remunerada e outros como voluntários. Estamos a caminho. Há ainda muito para fazer. Trata-se de uma realidade de grande complexidade, que, por este motivo, precisa da participação cada vez mais estruturada de toda a sociedade. A experiência dos principais agentes deste tipo de cuidados ainda não é muita. No entanto, estão a ser feitos grandes esforços por parte de todos. A formação dos membros das equipas interdisciplinares é certamente um dos aspetos principais para garantir a qualidade destes cuidados. Assim como também a gestão justa e solidária dos recursos escassos é um imperativo ético por parte de todos os cidadãos.
A sequencialidade, no tempo e nas instituições, das intervenções de saúde e de apoio diversificado é uma das particularidades dos cuidados continuados. Pelo contrário, os cuidados agudos, geralmente, são prestados num curto período de tempo para tratar uma doença ou a agudização de uma situação existente. A sequencialidade constitui uma oportunidade privilegiada para uma abordagem global da pessoa, tendo em conta o corpo, a mente e o espírito. Esta forma de entender a pessoa (presente no Manual do Prestador – Recomendações para a Melhoria Contínua, da Unidade de Missão para os Cuidados Continuados Integrados, de 2011) está em sintonia com a antropologia cristã: “que o Deus da paz vos santifique totalmente, e todo o vosso ser – espírito, alma e corpo – se conserve irrepreensível para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo” (1Ts 5, 23). Mesmo que a vulnerabilidade física e mental se acentue progressivamente, a visão cristã da pessoa reconhece no espírito todo o potencial de equilíbrio dinâmico e de harmonia global: “não perdemos a coragem; e ainda que o nosso corpo se desgaste, o nosso interior renova-se de dia para dia” (2Cor 4, 16). Esta antropologia fundamenta a maneira de entender este tipo de cuidados de saúde. Muito mais do que cuidados centrados na doença da pessoa, são cuidados centrados na pessoa da doença; mais ainda, na relação entre a pessoa vulnerável e o cuidador. Esta relação é determinante para uma boa continuidade de cuidados.
A realidade dos cuidados continuados é composta por uma grande variedade de componentes: as Unidades de Convalescença, as Unidades de Média Duração e Reabilitação, as Unidades de Longa Duração e Manutenção, as Unidades de Dia e Promoção da Autonomia, as Unidades de Cuidados Paliativos; mas também as Equipas Intra-hospitalares de Cuidados Paliativos, as Equipas Comunitárias de Cuidados Paliativos, as Equipas de Gestão de Altas, e as Equipas de Cuidados Continuados Integrados (Centros de Saúde). É evidente que estamos todos a aprender a lidar com uma realidade totalmente nova. No que diz respeito ao acompanhamento espiritual e religioso, há aqui muitos desafios novos. São desafios que passam por várias coisas, como: a formação dos agentes, o trabalho em equipa interdisciplinar, uma organização ecuménica e inter-religiosa dos serviços, uma nova forma de presença da Igreja Católica.
Frei Hermínio Araújo,
Assistente Espiritual e Religioso
do Hospital do Mar (Bobadela, Lisboa)