Cristãos no Médio Oriente lembrados por Bento XVI

Intenção de oração do Papa para o mês de Julho pede paz e liberdade Que os cristãos do Médio Oriente possam viver a sua fé em plena liberdade e ser instrumento de reconciliação e paz

1. Em risco de desaparecer

É amplamente ignorado o facto de as comunidades cristãs no Médio Oriente se encontrarem, em muitos casos, em risco de desaparecer. As razões são muitas. Entre elas, cabe destacar: a discriminação religiosa e civil e, mesmo, a perseguição violenta por causa da fé, na Síria, no Iraque, no Egipto; a violência, sobretudo no Iraque e na Palestina; a dificuldade em integrar-se socialmente, sobretudo em Israel e na Palestina, onde os cristãos são vistos com desconfiança, quer pelo lado palestiniano, quer pelo lado judeu; a violência endémica, sobretudo no Líbano; a permanente situação de minoria religiosa, numa região onde a pertença religiosa é fundamental… São motivos suficientes, embora não exclusivos, para a emigração continuada dos cristãos desta região, em busca de melhores condições de vida e de mais tolerância. Associada a taxas de natalidade notavelmente mais baixas do que as das populações muçulmanas locais, esta emigração reduziu as outrora importantes minorias cristãs da região a pequenos grupos, cada vez mais acossados, alvo da violência fundamentalista e de discriminações de toda a ordem.

2. Uma presença com raízes milenares

Os cristãos não constituem um "corpo estranho" no Médio Oriente, como por vezes se pensa, vista a esmagadora predominância do Islão. Pelo contrário, em alguns casos, as comunidades e Igrejas cristãs locais têm a sua origem nos apóstolos e primeiros discípulos de Jesus – seis séculos antes do aparecimento da religião islâmica. E, não raro, quando da conquista pelos árabes muçulmanos, iniciada depois da morte de Maomé (ano 632 d.C.), os cristãos constituíam a maioria da população. Séculos de férreo domínio muçulmano e a condição de dhimmitude (princípio islâmico segundo o qual os cristãos e judeus a viver em países muçulmanos são legalmente cidadãos de segunda, com os seus direitos civis notavelmente diminuídos face aos crentes muçulmanos) acabaram por alterar o balanço demográfico a favor do Islão, facto que jamais se inverteu, antes se foi acentuando ao longo dos tempos. Apesar disso, as comunidades e Igrejas cristãs permaneceram e mantiveram as suas tradições e a sua fé. Foi necessário chegar às décadas finais do século XX para ter início aquilo que, hoje, parece ser o irreversível declínio e desaparecimento de muitas destas comunidades cristãs.

3.  Bento XVI na Terra Santa

Na sua recente viagem à Terra Santa, em Maio, Bento XVI empenhou-se activamente nesta questão, valorizando, por todos os meios ao seu alcance, a presença dos cristãos no Médio Oriente. Na Eucaristia celebrada em Jerusalém, afirmou: «Faço votos por que a minha presença aqui seja um sinal de que vós não fostes esquecidos, que a vossa presença e o vosso testemunho perseverantes são efectivamente preciosos aos olhos de Deus e constituem um componente do futuro destas terras. Precisamente por causa das vossas profundas raízes nestes lugares, da vossa antiga e forte cultura cristã, e da vossa confiança duradoura nas promessas de Deus, vós cristãos da Terra Santa sois chamados a ser não apenas como um farol de fé para a Igreja universal, mas também como fermento de harmonia, sabedoria e equilíbrio na vida de uma sociedade que tradicionalmente foi e continua a ser pluralista, multiétnica e multi-religiosa».

4. Razões de esperança

Apesar das dificuldades, vão surgindo algumas razões de esperança. A primeira é, sem dúvida, a fé e firmeza no sofrimento das comunidade cristãs – as Igrejas locais, não obstante as violências, perseguições, extorsões e assassínios, resistem às exigências de conversão ao islamismo e às tentativas de colocar os cristãos em guetos. Há, por outro lado, uma consciência mais clara, por parte da Igreja universal, de que estas Igrejas do Médio Oriente devem ser continuamente lembradas e ajudadas. Há, também, sobretudo por acção do Papa Bento XVI, uma atenção maior à exigência de reciprocidade da parte dos países de maioria muçulmana – se ser muçulmano nos países ocidentais, de tradição cristã, é totalmente livre e não implica nenhuma discriminação, o mesmo deve suceder nos países de religião islâmica relativamente aos crentes de outras religiões e, em particular, aos cristãos. Nesta área, a abertura de espaços de diálogo entre católicos e muçulmanos, muito "por culpa" do tão vilipendiado discurso de Bento XVI em Ratisbona, sobre as relações entre fé e razão, deixa entrever motivos para esperar melhores dias.

São razões de esperança, embora ténues. Os próximos anos serão decisivos para saber se estes cristãos poderão continuar a viver nas terras dos seus antepassados, como cidadãos de pleno direito, sem temer violências e perseguições, ou se a sua presença bimilenar naquelas terras estará a chegar ao fim.

Elias Couto

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