Crentes e Políticos na transição da Monarquia para a República

A Universidade Católica Portuguesa acolhe durante dois dias as Jornadas de Estudo Crentes e políticos: protagonistas sócio-políticos na sociedade portuguesa contemporânea. São dias de aprofundamento sobre as personalidades que na vida portuguesa foram determinantes no contexto da viragem da Monarquia para a República, sem esquecer o Estado Novo até aos dias da Democracia. Na tarde de Sexta-feira, as personalidades do Cónego José de Almeida Correia, António Lino Neto, Joaquim Dinis da Fonseca e Manuel Ribeiro, foram apresentados como visionários no seu tempo e personalidades cimeiras no posicionamento dos católicos no regime republicano. “Perceber a relação as motivações religiosas e intervenção política, como exercício de cidadania”, foi um dos objectivos traçados por António Matos Ferreira, membro da Comissão Organizadora e do Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR) da UCP. Estas jornadas “pretendem prosseguir o trabalho iniciado em 2008, em torno da «Politização dos católicos e motivações religiosas». Num campo mais amplo, a reflexão das jornadas vão ainda inserir-se na investigação que decorre sobre os católicos portugueses na política do Séc. XX, entre duas gerações – “António Lino Neto e Francisco Lino Neto”. António Matos Ferreira indicou as jornadas como um “trabalho conjunto”. Para além de personalidades que integram o CEHR, outros investigadores foram convidados para “não dizer tudo, mas dispondo-se à discussão sobre o que estudamos”. O Cónego José de Almeida Correia foi recordado por Paulo Alves como um “homem de Igreja, jornalista e político, e um defensor dos ideais monárquicos e valores nacionalistas”. Esta figura do Séc. XX esteve em Coimbra, “numa altura em que fervilhavam as ideias políticas, e onde estas mesmas ideias se digladiavam nas páginas dos diferentes jornais”. José Correia de Almeida esteve na origem e na direcção de vários títulos católicos. “Quando encerrava um, logo na semana seguinte surgia outro título”, conta. A Coimbra forma “beber os fundadores do Centro Católico Português”, local de “refúgio dos nacionalistas depois de terminada a monarquia”. Paulo Alves, investigador do Centro de Estudos Interdisciplinares do Séc. XX da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, destacou o Cón. José de Almeida Correia como uma figura “ímpar do nacionalismo católico e um fervoroso construtor do Centro Católico Português”. João Almeida, mestre sobre o Centro Católico Português, traçou a personalidade de Joaquim Dinis da Fonseca, um “militante católico de integração política”, e o centrista que “mais interviu no parlamento, depois de António Lino Neto”. Joaquim Dinis da Fonseca é o “representante do catolicismo social”. Personalidade que passou por Coimbra, fundou, na Guarda, o Centro Católico e também, nesta cidade foi director do jornal «A Guarda». João Almeida relembrou a figura que no Parlamento, se debateu pela questão social, nomeadamente na assistência aos pobres e na causa social do Centro Católico Português. “Foi o CCP que primeiro se preocupou com os mutilados da Primeira Guerra Mundial”. Joaquim Dinis da Fonseca escreveu um editorial de «A união» “manifestando reservas quanto ao parlamentarismo, não o condenado, mas pedindo uma forma diferente de trabalhar”. “Tinha a clara percepção que também a Portugal chegaria uma ditadura tal como acontecera em Espanha e Itália”. Em 1924, Joaquim Dinis da Fonseca condena no Parlamento todas as ditaduras. A personalidade de António Lino Neto, foi apresentada por Marco Silva, mestrando em Ciência Política. A figura que durante 15 anos foi presidente do Centro Católico Português, foi destacada como um visionário do seu tempo, pois “a actualidade apresenta inúmeras situações do debate político português, condenados no início do Séc. XX”. Marcos Silva referiu a existência de cargos públicos por nomeação partidária, a falta de sobriedade legislativa que conduz a leis confusas e contraditórias, e o debate entre a centralização e a descentralização como questões discutidas por António Lino Neto e seus contemporâneos. O mestrando em Ciência Política destacou a “acção parlamentar e a defesa da fé católica” na vida de António Lino Neto. “O seu pensamento político foi baseado na doutrina cristã”, esclarece. José Manuel Quintas, Major da Força Aérea, apresentou a figura de Hipólito Raposo e usou da expressão que o próprio escreveu na sua obra “Folhas do Meu Cadrastro” para apresentar o seu percurso de vida, na forma de “sonho, sacrifício e desengano”. Hipólito Raposo “teve uma curta passagem pelo Seminário da Guarda”, local onde se constituiu “o grupo dos 13, núcleo fundador do nacionalismo lusitano”. “Era um grupo de jovens precocemente literados, que juntos iniciaram o projecto do integralismo lusitano”. “Este projecto nasce por correspondência”, destaca José Manuel Quintas, pelas mãos de Hipólito Raposo, e apresentava o municipalismo e o povo como principais fundamentos deste projecto. O percurso de trânsito de Manuel Ribeiro foi apresentado por Sérgio Pinto, do Centro de Estudos de História Religiosa da UCP. “Uma vida de trânsito entre o partido comunista português e o catolicismo deram a Manuel Ribeiro no nome de o convertido”. Com Manuel Ribeiro, autor da trilogia social, percebe-se a “interpenetração da realidade política, social e religiosa e o mútuo condicionamento entre as três”. A público vieram percurso de personalidades “de crentes em diversas conjecturas políticas, desde finais do Séc. XIX, aos processos recentes de democratização das sociedades peninsulares”, destacou Matos Ferreira. “Não queremos hiper-valorizar uns em detrimento de outros”, avisou, indicando que as sociedade e a história “existem porque forma construídas por pessoas. As ideias, as instituições e as práticas são sempre corporizadas por alguém”. CEHR e o Centenário No seguimento do trabalho que tem vindo a ser realizado pelo Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR) nos últimos anos, e considerando as exigências do debate historiográfico existente sobre o final da Monarquia Constitucional e a instauração do regime republicano em Portugal, estabeleceu-se uma programação de investigação, de grupos de trabalho e de iniciativas científicas. Considerou-se que esta programação se deveria articular com diversos âmbitos de carácter oficial eclesial e académico, respondendo também às necessidades de participação pública no decorrer de iniciativas das Comemorações Nacionais referentes aos 100 anos da República. Esta programação, própria do CEHR, constitui-se exclusivamente com carácter científico, no âmbito da historiografia. A programação é constituída por quatro níveis de realização: 1) a investigação, com a constituição de um grupo de trabalho envolvendo os colaboradores na execução dos diferentes encargos assumidos pelo CEHR; 2) a publicação de estudos e de fontes documentais inéditas; 3) a realização de um Seminário continuado e aberto para investigadores, de 2009 a 2011, de balanço historiográfico sobre «Religião, Cristianismo e Republicanismo»; e, 4) a organização do Congresso Internacional sobre «Religião, Estado e Sociedade: 100 anos de Separação», em abril de 2011. Nessas circunstâncias foi também aceite o convite da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República (CNCCR) para que o CEHR participasse no seu programa oficial, com o contributo científico próprio.

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