Covid-19: Rúben Figueiredo, padre e enfermeiro, decidiu regressar à «linha da frente» do combate da pandemia

Sacerdote de Santarém trabalha em Estrutura de Apoio de Retaguarda, em Fátima

Santarém, 26 jan 2020 (Ecclesia) – Rúben Figueiredo, padre e enfermeiro, decidiu avançar para a “linha da frente” e está a ajudar doentes com Covid-19 numa Estrutura de Apoio de Retaguarda (EAR), que recebe mais de 40 pessoas, em Fátima.

“Neste contexto de pandemia, em que há imensa necessidade de enfermeiros e de profissionais de saúde, não resisti e estou na linha da frente”, disse à Agência ECCLESIA.

O padre Rúben Figueiredo explicou que a EAR é “uma espécie de hospital de campanha” com utentes positivos à Covid-19 e “com alguma estabilidade hemodinâmica, isto é, os sintomas são mais ou menos controlados, não estão em estado crítico”.

Nesta estrutura cumprem o tempo de isolamento, “estão previstos 10 dias”, e depois de um novo teste negativo, podem regressar ao domicílio, “seja uma instituição, um lar, a própria casa”.

O sacerdote da Diocese de Santarém está nesta Estrutura de Apoio de Retaguarda, em Fátima, desde 14 de dezembro, logo que abriu, e com uma colega enfermeira foi responsável pela “parte da saúde do princípio, a partir do zero, – os equipamentos, recursos, inventário, tudo e mais alguma coisa”.

“Temos passado momentos difíceis e de provação, com este aumento dos casos, e os lares ilegais foram para lá todos os utentes positivos, vamos fazendo um acompanhamento. Quer seja o médico, o enfermeiro, o auxiliar, o bombeiro todos vão diante do doente da mesma forma, a aparência física é sempre igual”, explica sobre um serviço que se presta “muito no anonimato e na confidencialidade”.

O Papa Francisco escreveu a mensagem ‘«Um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos» (Mt 23,8). A relação de confiança na base do cuidado dos doentes’, para o Dia Mundial do Doente 2021, que a Igreja Católica vai celebrar no dia 11 de fevereiro.

“Destaco sobretudo a confiança e a esperança. Vivemos tempos de medo em que a gramática e o léxico é a morte, o sofrimento e a infeção, há muito esse registo e queria destacar a confiança no nosso Serviço Nacional de Saúde que, apesar de viver momentos complicados e complexos, tem conseguido dar resposta aos inúmeros casos e tem sido capaz de acompanhar, cuidar e tratar. Também enquanto cristãos sabemos que Cristo está connosco, Cristo caminha connosco, e se faz presente nestas horas. Enquanto cristãos temos que ter um olhar de fé e esperança que é o que procuro ter”, salientou o padre Rúben Figueiredo.

O padre Rúben Figueiredo salienta que tem “a sorte de estar em Fátima”, a residir na Casa Nossa Senhora do Carmo, e pode ter uma “vida espiritual de acordo com o horário laboral”.

O sacerdote licenciou-se em enfermagem, antes do percurso de formação em Teologia, mas “já não exercia desde 2011, há quase 10 anos”, realçando que o regresso “está a ser muito interessante”.

O entrevistado destaca o contacto com os colegas enfermeiros, que “também sentem uma provocação” por terem um colega que é padre.

Os profissionais são poucos e é importante compreenderem que a Igreja não está de braços cruzados e fechada a este sofrimento e é bom verem que os padres estão disponíveis e vestem a camisola”.

Depois da licenciatura em enfermagem exerceu “na área da hemodiálise, que gostava bastante”, mas com a entrada para o seminário e a “vida de padre”, com quatro paróquias, “não foi possível exercer em simultâneo”.

“Agora foi mais forte e tem sido uma mais-valia para mim, do ponto de vista humano, espiritual, do ponto de vista de padre, cristão, e até profissional. Depois de 10 anos sem exercer há coisas que estou obrigado a formar-me, a ir novamente aos livros, técnicas, procedimentos, protocolos”, desenvolveu o sacerdote.

O padre Rúben Figueiredo é pároco de Chouto, Parreira, Ulme e Vale de Cavalos, na zona da Chamusca, e adianta que, antes da suspensão das celebrações comunitárias, “dedicava sempre um grande tempo”, nos avisos, a reforçar as medidas que as pessoas deviam ter para evitar a propagação do novo coronavírus.

“Mais do que serem recomendações, dizia que eram obrigações e enquanto cristãos devemos ter esse sentido ainda mais presente. Insistia sempre com os cuidados da desinfeção, da distância social, e fazia sempre essa formação, educação, para a saúde”, explica, referindo que agora procura “acompanhar” as comunidades “de uma forma muito simples”, pelo telefone, através das redes sociais.

Neste contexto indica que sentiu “uma grande alegria de poder colaborar nesta luta” quando falou sobre a hipótese de “colaborar como enfermeiro” aos seus paroquianos, aos sacerdotes da sua vigararia, e contou também com “todo o apoio” do bispo de Santarém, D. José Traquina.

CB/OC

Para além do serviço na Estrutura de Apoio de Retaguarda, o padre Rúben Figueiredo esteve a acompanhar o padre Fernando Campos da Silva que faleceu vítima de Covid-19, na madrugada deste domingo, no seu quarto da casa sacerdotal.

“Foi um privilégio ter estado nos últimos instantes da vida dele. Estava de folga no fim de semana e ofereci-me para ir cuidar do padre Campos. No sábado, com o médico, fizemos a avaliação, ele esteve sempre lúcido, sempre muito colaborante na medicação, na alimentação, no internamento, sempre muito comprometido com as nossas tarefas e cuidado. Até que por volta da 1 da manhã enquanto tinha a tocar a ‘Missa Solene’ de Mozart, enquanto tocava o Kyrie, ele muito serenamente morreu”, recordou.

Neste contexto, destaca a “graça” de ter acompanhado o padre Fernando Campos “neste final da peregrinação na terra” que foi “tão rica e valiosa para a Igreja, para a cidade de Santarém e tantos cristãos que o conheceram”.

“Será sempre uma memória de alegria, de fé, de serviço, de dedicação”, acrescentou, sobre o sacerdote que faleceu aos 91 anos.

“Éramos e fomos muito amigos. Ele gostava imenso de poesia e sabia que eu também gostava e comprava alguns livros, lia-os primeiro e depois oferecia-me, e vice-versa, fazíamos este intercâmbio de cultura e gostos”, partilhou ainda sobre o padre Fernando Campos que é “uma referência muito grande” para si, quando era seminarista e mesmo depois da ordenação presbiteral, a 16 de julho de 2017.

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Agência ECCLESIA

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