Covid-19/Crise: «É preciso deixar ideologias, esta é a hora de todos colaborarem» – Eugénio Fonseca

Cáritas Portuguesa lançou «estratégia nacional» para inverter «curva da pobreza» e não aumentar «os 17% de pobres» que existem no país

Lisboa, 18 jun 202 (Ecclesia) – O presidente da Cáritas Portuguesa afirmou hoje que a crise económica e social que Portugal atravessa pede a colaboração de todos, sendo hora de deixar “ideologias” e “posicionamentos periféricos” para resolver a “vida dos portugueses”.

“Assim aconteceu quando se viabilizaram as medidas de prevenção do Covid-19, no nosso país, portanto é possível. Que os deputados com assento parlamentar discutam a real situação da pobreza, se revelem verdadeiros políticos, que a sua motivação seja a defesa do bem comum”, sublinha à Agência ECCLESIA.

A Cáritas Portuguesa lançou no último dia 11 uma estratégia nacional com o objetivo de “inverter a curva da pobreza” e afastar dos números da pobreza estrutural a situação que muitos portugueses enfrentam.

Eugénio Fonseca apresenta a «estratégia nacional» a dois tempos: numa primeira, concretizada através da Cáritas Portuguesa, das suas congéneres diocesanas e paroquiais, visa uma “resposta imediata” a problemas que as pessoas apresentam, nomeadamente “encargos com as necessidades básicas que passam pela eletricidade, águas, gás, pagamentos de propinas, pagamento de contas de saúde, medicamentos”, exemplifica.

Este primeiro tempo, “que pode acontecer em simultâneo com o segundo”, tem por objetivo “evitar o máximo o endividamento das famílias” e que, apesar de algumas linhas de crédito que o governo tenha aberto de forma a “suavizar” algumas prestações, “pode não ser suficiente”.

“A suavidade não me tranquiliza totalmente, porque as pessoas vão ter de continuar a pagar e vai acrescentar sempre ao custo. Mesmo suave há muitas pessoas que vão ficar com um rendimento muito básico, Rendimento Social de Inserção (RSI) ou subsídio de desemprego”, explica.

Eugénio Fonseca gostaria de ver criado um “rendimento de substituição”, em troca de “trabalho social por parte de desempregados” e uma “reformulação no RSI”, no que ao acesso e ao montante diz respeito.

“Pessoalmente penso, que o RSI tem de sofrer uma reformulação para responder ao que sofremos. Na questão do acesso, acabar com os três meses sem rendimentos para poder aceder, e encurtar os prazos entre a aprovação da candidatura e o recebimento da prestação, isso já foi manifestado, mas os valores têm de ser revistos porque os que existem não revertem a curva da pobreza, atenuam a agressividade da pobreza”, indica.

Para que a “curva da pobreza seja invertida, Eugénio Fonseca fala em medidas que “permitam às pessoas não cair na pobreza estrutural e não acrescentar aos 17% de pobres”, em Portugal, sendo antes uma “situação transitória de privação de recursos financeiros”.

É necessário não matar a esperança das pessoas que estão a viver estes problemas e mantê-las animicamente predispostas para abraçar projetos que apareçam, caso contrário, se não criarmos medidas que sirvam de ancoragem à situação precária em que se encontram, vão entrar numa espiral de desalento e falta de esperança que pode acarretar consequências de ordem debilidade física e à saúde mental”.

Eugénio Fonseca recorda a seriedade de uma crise, “consequência da crise pandémica”, com efeitos financeiros e económicos “sem precedentes” e cujos efeitos se deverão sentir com maior intensidade “mais para o final do ano”.

“A partir de setembro vamos ver o desemprego acentuado. As empresas estão a anunciar o lay-off e não há orçamento que resista, esse quadro tem um tempo. As moratórias da suspensão de pagamentos de impostos que as empresas estavam obrigadas, no próximo ano vão ter de começar a pagar. Há outras que não vão resistir porque os ativos que tinham estão a escoar-se. Está em causa a efetiva sustentabilidade de muitas empresas”, manifesta.

O presidente da Cáritas Portuguesa explica que o nosso país, habituado a dependência externa, vai ter de encontrar mecanismos de superação, pois também “os mais fortes na União Europeia confronta-se com a crise”.

Foto: Cáritas Portuguesa

“Não quero ser anunciador de desgraça mas penso que ou a estratégia de relaçamento da economia está bem alicerçada, em pressupostos que desconheço, ou não se vai conseguir resistir à criação de medidas onerosas para se poder pagar os eventuais que possam surgir”, vaticina.

Eugénio Fonseca aponta a necessidade de criação de emprego e não exclui a possibilidade, “consoante a generosidade dos portugueses”, de que os donativos enquadrados nesta «estratégia nacional» pensados para respostas imediatas, possam ser veiculados para projetos de criação de emprego.

Também após a especulação imobiliária e a inflação de rendas, o presidente da Cáritas afirma que seria benéfico que os “senhorios ponderassem baixar rendas”, sendo “preferível receber menos do que ter créditos mal parados”.

O responsável dá conta do “diálogo permanente” com a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, e da “recetividade” às medidas propostas pela instituição de ação social da Igreja católica, mas afirma que o esforço tem de ser de todos, sendo necessário conhecer “atempadamente” a situação da pobreza em Portugal.

“Não basta fazer o que o INE, com o seu esforço vai fazendo; nesta situação é um trabalho perdido, porque conhecer a realidade ano a ano não basta. O governo poderia criar condições, mantendo a proteção de dados, mas conhecer, como, tal como acontece com a situação do desemprego, fazer o mesmo com a situação dos níveis de obreza em Portugal”.

Aos empresários, Eugénio Fonseca pede “viabilidade empresarial” e indica que este tempo “não pode ser facilitador de oferta de trabalho a preços indignos”; também os sindicatos se devem centrar nos que “não têm trabalho e ajudar a criação de condições realistas para que as pessoas não sejam privadas do que é indispensável”.

Reconhecendo que este tempo de confinamento pesou financeiramente as paróquias e as estruturas ligadas à Igreja, o presidente da Cáritas Portuguesa afirma que, independentemente da área pastoral, “haja uma união de esforços, porque todos têm algo a dar” e que em cada paróquia se “organize ou rejuvenesça os grupos de pastoral social como expressão evidente da caridade da comunidade cristã. É urgente que isto aconteça para dar credibilidade à fé que professamos e razões da esperança”.

O responsável pede ainda à comunicação social que não deixe cair da “agenda mediática” a realidade concreta, procurando “sem expor as pessoas, manifestar as carências sentidas” com “total transparência a aplicação das verbas confiadas”.

LS

Covid-19: Cáritas Portuguesa lança estratégia para «inverter a curva da pobreza»

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