Margarida Avillez Ataíde
Presente de múltiplas formas no panorama cinematográfico nacional, a Igreja tem na Comissão Episcopal para as Comunicações Sociais e Bens Culturais da Igreja representação oficial na sua mais elevada hierarquia.
Na sua vertente cultural – se é que o cinema assim se pode dissociar -, o organismo que tutela a relação da Igreja com o cinema, é o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, directamente tutelado pela Comissão Episcopal anteriormente referida. No SNPC, “o cinema é emanado para o seu público como a sétima de um conjunto que integra outras seis artes. Fundamental como veículo evangélico, o SNPC tece diária e delicadamente uma teia onde as diferentes sensibilidades artísticas se entrecruzam, num tear de matriz marcadamente cristã, católica apostólica romana, mas aberta a e descobrindo-se também noutras referências. Assim, fabrica um tecido rico e colorido de partilha que é, em simultâneo, a veste da militância anti-materialista que a impulsiona”.
Como meio de comunicação, é pela acção do Secretariado das Comunicações Sociais que mais se encontra representado o cinema motor de uma Nova Evangelização. A ele ligadas, encontra-se uma entidade fundamental: a Agência Ecclesia, cuja edição electrónica e impressa semanal reserva um espaço exclusivamente dedicado às novidades do panorama cinematográfico nacional e internacional. Crítica e agenda cinematográficas, entrevistas e cobertura de eventos de destaque, como sejam ciclos, mostras, retrospectivas, prémios ou festivais, são alguns exemplos dessa cobertura.
Além da sua representação nacional, o Secretariado das Comunicações Sociais é membro da destacada SIGNIS – Associação Católica Mundial para a Comunicação que congrega os sectores de Cinema, Rádio, Televisão e Internet – entre nós. Vastíssima rede de apoio, partilha, divulgação e promoção que simultaneamente une comunicadores católicos do mundo inteiro e amplifica o que de melhor cada um faz no seu país, na sua especificidade cultural, a SIGNIS está presente em Portugal desde há 25 anos. A participação da SIGNIS no panorama cinematográfico nacional fez-se, até 2009, através da presença de um Júri Especial no Festival de Cinema de Tróia, um festival de grande tradição e características únicas que visa divulgar a melhor cinematografia de pequenos países que, geralmente, à margem dos circuitos comerciais, jamais se poderiam dar a conhecer de outra forma. A partir do corrente ano de 2010, estreitando laços e amplificando a visão da Igreja face ao cinema, a SIGNIS esteve também presente com o Prémio Árvore da Vida no Indielisboa. Tal facto é de celebrar de forma particularmente entusiasta, pelo que representa de interesse no diálogo cultural com e da Igreja, sobretudo por parte de uma organização, a Zero em Comportamento que, em apenas sete anos, firmou com o seu festival de cinema uma das mais bem sucedidas manifestações de diversidade cultural no nosso país. Com efeito, objectivamente falando, o Indielisboa é, hoje, um dos festivais nacionais com maior adesão de público, mais amplo espectro de cinematografias representadas e maior amplitude de espectadores, em termos etários – não obstante a predominância de jovens -, socioculturais e económicos.
Para além da presença da SIGNIS em Portugal, a relação entre ambos tem-se desenvolvido, ainda ao nível cinematográfico através da presença portuguesa em Júris SIGNIS em festivais no mundo inteiro (não necessariamente organizados por qualquer instituição cristã ou católica) – nalguns dos quais tive a honra de participar –, o que constitui, não só uma forma plenamente enriquecedora de conhecer cinematografias, culturas e pessoas de realidades muitos diversas, como, acima de tudo, comungar de um olhar, de uma inspiração, de um património de valores cristãos, humanistas, universais expressos nos filmes vistos, debatidos, seleccionados e, finalmente, premiados. Um excelente entreposto, além do mais, para a circulação de filmes que veiculam uma mensagem cristã ou que se coaduna coma mensagem cristã, entre países. Uma excelente forma de desempenhar um papel activo e na promoção de filmes nacionais. Para compreender, na sua plenitude, a riqueza que constitui a participação nestes júris, é de referir que estes podem ser unicamente católicos ou ecuménicos, o que ainda os torna mais representativos de uma Igreja que se pretende aberta.
Com a Sua visita a Portugal, Sua Santidade o Papa Bento XVI deu inigualável impulso ao compromisso que fervilha desde há muito no íntimo de todos quantos têm contribuído para uma relação construtiva e dialogante entre a Igreja e o Cinema ao longo dos anos.
Desaparecidos que foram alguns dos mais representativos agentes construtores dessa boa relação, como é o caso da Cinedoc – o Centro de Documentação Cinematográfico e Audiovisual de que tive o enorme prazer e honra de fazer parte, pela mão de Francisco Perestrello e que tão bem representou a presença da Igreja Portuguesa entre todos os agentes cinematográficos nacionais e internacionais -, torna-se maior e mais urgente a necessidade de reforçar laços e amplificar a postura dialogante da Igreja com a Cultura, mais concretamente com o mundo do cinema.
Apontando caminhos futuros para o entrelaçar mais estreito e mais amplo entre a Igreja e Cinema, apontaria, para além da ainda mais estreita relação entre os já bem coordenados Secretariados referidos e, de ambos sob a respectiva Comissão Episcopal, com a SIGNIS, as seguintes vertentes fundamentais:
O apoio, pela proximidade, da produção nacional, promovendo e reforçando o diálogo com produtores, realizadores e promotores cinematográficos que actuam em Portugal.
O apoio, pela divulgação, de toda a produção nacional enquadrada numa cultura de valores cristãos, não necessariamente confessionais ou, ainda, que de modo sério e construtivo promovam o diálogo e o debate de ideias, diferentes das que dominam a essência cristã.
A partilha, pela presença de agentes da igreja e do cinema nacionais em eventos estrangeiros e vice-versa, de cinematografias de origem e sensibilidades culturais diversas. Promovendo o diálogo inter-cultural, incluindo sobretudo, naturalmente, o inter-religioso.
A promoção, através da organização de visionamentos e debates de toda a cinematografia nacional e internacional construtiva, com participação dos mais diversos “actores” da cena cinematográfica e cultural, crentes e não crentes, capaz de estimular o espectador a perscrutar a realidade, compreender o seu passado e perspectivar ou construir, de forma activa e empenhada, o seu futuro e o dos seus semelhantes. Sempre à luz dos valores cristãos, universais.
O apoio, pela promoção e organização de percursos de maior ou menor duração, de uma vertente pedagógica do cinema, como linguagem cultural e meio de comunicação de ponta. Vertente esta desenvolvida em escolas, paróquias, associações, integradas, ou não, em cursos específicos, que contemplaria necessariamente as mais modernas plataformas em que o cinema se inscreve – como as digitais, as promovidas por via internáutica – bem para lá do conceito de sala de cinema ou dos multiplex.
Margarida Avillez Ataíde