Francisco evoca dramas no Mediterrâneo e impactos da pandemia
Nicósia, 02 dez 2021 (Ecclesia) – O Papa criticou hoje na capital do Chipre os “muros do medo” e o ressurgimento dos interesses nacionalistas na Europa, evocando os dramas no Mediterrâneo e os impactos da pandemia.
“O continente europeu precisa de reconciliação e unidade, tem necessidade de coragem e ímpeto para seguir em frente. Pois não serão os muros do medo e os vetos ditados por interesses nacionalistas que ajudarão o seu progresso, nem a recuperação económica por si só poderá garantir a sua segurança e estabilidade”, referiu, no Palácio Presidencial de Nicósia, num encontro que encerrou o primeiro dia da 35ª viagem apostólica do pontificado, que decorre até segunda-feira, com passagens pela ilha e pela Grécia.
Francisco aludiu ao Mediterrâneo, “infelizmente lugar de conflitos e tragédias humanas”.
“Na sua beleza profunda, é o ‘mare nostrum’, o mar de todos os povos que se banham nele para estar ligados, não divididos. Chipre, encruzilhada geográfica, histórica, cultural e religiosa, tem esta posição para implementar uma ação de paz. Que seja um estaleiro aberto de paz no Mediterrâneo”, apelou.
A intervenção do Papa decorreu após a cerimónia oficial de boas-vindas e a visita de cortesia ao presidente da República de Chipre, Nicos Anastasiades.
Perante autoridades políticas e religiosas, representantes da sociedade civil e membros do corpo diplomático, Francisco apresentou-se como “peregrinos” num “país geograficamente pequeno, mas grande pela história”, a “porta oriental da Europa e a porta ocidental do Médio Oriente”.
Sois uma porta aberta, um porto que une: Chipre, encruzilhada de civilizações, traz em si a vocação inata ao encontro, favorecida pelo caráter acolhedor dos cipriotas”.
O discurso aludiu à importância do território cipriota, onde se encontram Europa e Oriente, para a “primeira grande inculturação do Evangelho”, no século I, manifestando o desejo de que “a boa nova do Evangelho daqui leve uma mensagem feliz à Europa sob o signo das Bem-aventuranças”.
O Papa evocou a presença de muitos imigrantes no país, com a percentagem mais significativa entre os países da União Europeia, considerando “importante tutelar e promover todos os elementos da sociedade, de forma especial aqueles que são estatisticamente minoritárias”.
Os católicos representam cerca de 4,5% da população do Chipre.
Francisco destacou o impacto negativo da pandemia na atividade turística e as consequências da crise económico-financeira na “pérola” do Mediterrâneo.
“Neste período de retoma, porém, não há de ser a ânsia de recuperar o perdido que pode garantir um desenvolvimento sólido e duradouro, mas o empenho em promover a saúde da sociedade, particularmente através duma decidida luta à corrupção e às chagas que lesam a dignidade da pessoa; penso, por exemplo, no tráfico de seres humanos”, acrescentou.
A visita do Papa ao Chipre acontece num momento em que, nos primeiros 10 meses deste ano, chegaram à ilha mais de 10 mil migrantes, a maioria deslocando-se do norte cipriota turco para procurar asilo no sul.
Em 1974, a Turquia invadiu o Chipre e autoproclamou a República de Chipre do Norte.
Segundo Francisco, “a ferida que mais faz sofrer esta terra, é causada pela terrível laceração que padeceu nas últimas décadas”.
“Penso no sofrimento interior de quantos não podem voltar para as suas casas e locais de culto. Rezo pela vossa paz, pela paz de toda a ilha, e almejo-a com todas as forças”, declarou.
A viagem do Papa ao Chipre prossegue até sábado, dia em que Francisco segue para Atenas.
OC
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