“Vigiai, porque não sabeis quando chega o momento… O que vos digo a vós, digo-o a todos: vigiai” (Marcos 13, 33-37).
Esta recomendação é-nos feita pelo Evangelista S. Marcos no primeiro Domingo do Advento, com o qual iniciamos um novo ano de celebração da nossa Fé e, ao mesmo tempo, iniciamos os preparativos para o Natal.
Apesar dos muitos condicionamentos que a pandemia nos continua a impor, queremos acolher a oportunidade que Deus nos oferece, neste novo ano, para viver e ajudar a viver o maravilhoso dom da fez. É ela que, nos momentos mais dolorosos diante da pandemia causada pelo covid-19, pode constituir a força e a esperança necessárias para uma vida com sentido, apesar das adversidades.
I Quando os nossos planos não são os planos de Deus
Os planos de Deus muitas vezes não coincidem com os nossos planos ou, pelo menos, pedem realizações diferentes daquelas que nós projetámos. E isso é o que está a acontecer connosco nestes tempos da pandemia, o que nos obriga, primeiro, a parar para repensar o que projetámos e, depois, a procurar novos caminhos, mais ajustados às situações que estão em permanente e rápida mudança.
Ora, o Tempo do Advento, com que estamos a iniciar o novo ano, é tempo especialmente oportuno para reforçarmos essa procura de novos caminhos, sobretudo com duas atitudes de fundo que são determinantes para juntos superarmos a crise da pandemia e aprofundarmos a Fé.
Uma dessas atitudes de fundo é a vigilância, de que a Palavra de Deus nos fala abundantemente durante todo este Tempo do Advento, a começar já no primeiro domingo; a outra é a esperança, que também neste período de Advento nos é garantida pela encarnação do Verbo de Deus que celebraremos no Natal.
1. A vigilância perante as crises e os comportamentos
A vigilância leva-nos, primeiro que tudo, a identificar bem os sinais de Deus dentro da Igreja, mas também fora dela, pois o Espı́rito de Deus sopra onde quer e a sua liberdade não tem fronteiras. Os sinais de Deus apontam-nos os caminhos novos que são importantes para a nossa realização pessoal e para a construção das nossas comunidades. E são igualmente indicadores do que deve ser uma vida em sociedade, cada vez mais digna. Também nos revelam as nossas fragilidades, ao mesmo tempo que nos sugerem e oferecem os meios para as superar. De facto, com os Seus sinais, Deus fala para dentro e para fora da Igreja. A nós pertence-nos discernir a sua mensagem, para dela sermos portadores, no cumprimento da missão que o mesmo Jesus nos confia. Todos os nossos comportamentos, dentro e fora da Igreja, também precisam de ser vigiados para ver se se ajustam ou não aos caminhos apontados pelos sinais de Deus, o que exige de nós contínua revisão de vida e discernimento quanto às opções que temos de tomar em cada momento.
2. Os sinais e os apelos de Deus na pandemia
Estamos convencidos de que os sinais de Deus também estão na pandemia causada pelo novo coronavı́rus, que a todos continua a afligir-nos, sem sabermos até quando se prolongará. No esforço por entender esses sinais, com a luz do Espı́rito, vamos percebendo que esta pandemia traz à luz do dia várias outras “pandemias” que, já há muito, nos estão a afetar, mas que a nossa falta de vigilância não no-las tem deixado identificar e combater.
Se reforçarmos a nossa atenção, olhando para dentro e também para fora da Igreja, descobrimo-las nas muitas crises que, de facto, afetam e fazem sofrer as pessoas. Por isso, usemos também este tempo do Advento para identificá-las, entre outras: a crise da vida; a crise da família; a crise da proteção social, que teima em não dar a devida atenção aos mais vulneráveis; a crise no uso dos bens materiais, que não pode resumir-se, como muito frequentemente acontece, ao ritmo da produção e do consumo, mas tem de saber sujeitar-se à grande prioridade que é o bem total de cada pessoa e o Bem comum; a crise da solidariedade e da organização do trabalho; a crise da saúde, a que agora estamos especialmente sensíveis pela conjuntura que nos afeta.
Ora, a vigilância que o Evangelho recomenda, obriga-nos a estar atentos a todas elas. Já estão instaladas entre nós há muito tempo, mas agora a pandemia dá-lhes maior visibilidade e convida-nos a rever os comportamentos adotados perante elas.
3. A esperança na procura de uma nova normalidade
A esperança motiva-nos e impele-nos para a procura de caminhos novos, portadores de uma normalidade que não poderá ser aquela a que estávamos habituados e à qual dificilmente voltaremos.
E é bom termos em conta que já há muito tempo estamos a ser avisados sobre as grandes mudanças em curso no nosso mundo e também na vida da Igreja, aquilo que o próprio Papa recorrentemente tem vindo a chamar de “mudança de época”.
Esta é, portanto, a hora de nós, como Diocese, no conjunto das suas paróquias, grupos de paróquias, arciprestados, serviços e movimentos apostólicos, reforçarmos o nosso compromisso na procura conjunta da nova normalidade que a pandemia e as muitas crises a ela associadas nos estão a impor.
Aqui se situa a força da esperança, motivando-nos para o esforço de marcar presença e ação na vida da Igreja e do mundo.
A esperança leva-nos a acreditar numa nova normalidade, na qual, primeiro que tudo, aprendamos a conviver com as crises que nos afetam, sem possibilidade de as superar, pelo menos tão depressa quanto desejávamos, e nos convidam a purificar e repensar os nossos compromissos com Jesus Cristo e o Evangelho.
4. A obrigação de dar resposta às necessidades dos mais frágeis
É da mesma esperança que recebemos o incentivo para atender a tanta solidão e abandono que persistem no nosso mundo. Os idosos e os lares que os acolhem merecem muita mais atenção do que aquela que lhes tem sido dada.
Essa é mais uma razão para as nossas comunidades cristãs procurarem reforçar as suas respostas a situações desta natureza, mesmo diante das limitações que nos impõe a atual situação pandémica. Não podemos abandonar as pessoas, mas temos de saber concertar formas novas e inovadoras de as acompanhar. Tratá-las como objeto descartável seria o pior escândalo, com o qual não podemos pactuar.
Todos nós fizemos alguma experiência de solidão, pelo menos durante os primeiros tempos de confinamento, quando ficámos impedidos de utilizar as habituais manifestações de afeto, nomeadamente na despedida dos nossos familiares e amigos falecidos, a quem não pudemos prestar a merecida homenagem.
Foi doloroso e, dessa experiência, havemos de saber agora tirar partido para reforçar o serviço de apoio aos idosos, doentes e mais frágeis, assim como a nossa capacidade e disponibilidade para atender quem mais precisa.
Somos assim alertados para a necessidade de criar ou motivar mais, nas nossas comunidades, os serviços de caridade organizada, chamemos-lhes “Caritas” ou “Conferências Vicentinas” ou outras denominações, sempre com a finalidade de descobrir e acompanhar as fragilidades.
5. A obrigação de motivarmos para participar nas celebrações da Fé
Ficámos proibidos de realizar, durante largo tempo, as nossas assembleias dominicais, o que, por um lado, apelou ao reforço da experiência da Igreja doméstica nas nossas famílias, mas, por outro, fez passar a ideia falsa de que afinal é a mesma coisa participar na assembleia celebrante ou assistir por transmissão televisiva ou em streaming, pelas redes sociais. Não há comparação possível! E pode mesmo acontecer que esta ilusão continue instalada em algumas pessoas, a qual, associada a algum receio, as leve a justificar a sua não participação na assembleia dominical.
Também aqui temos de saber remar contra a maré e educar para o verdadeiro sentido e dever, enquanto cristãos, de participar sobretudo na assembleia do domingo.
Sem prejuízo de fazermos reforçado apelo à participação nas celebrações, sobretudo nas assembleias dominicais, havemos de continuar a oferecer às famílias as ajudas necessárias para progredirem na consciência e na prática de verdadeiras Igrejas domésticas.
6. Apelo ao empenho redobrado no serviço da Catequese
Outra ação eclesial muito afetada pela pandemia foi, e continua a ser, a catequese, nomeadamente a Catequese da infância e adolescência.
Interrompemos o modo como se fazia catequese e encontramos novos modos que envolvem necessariamente as sessões presenciais de catequese, mas também a valorização de outros fatores importantes, que estavam, pelo menos em alguns casos, a ser esquecidos ou subalternizados. Entre eles está o compromisso dos pais no processo da catequese dos filhos, quanto possível dentro da experiência de uma família que seja verdadeira Igreja doméstica, onde se reza, se escuta e partilha a Palavra, se ensaia o diálogo e a correção fraterna, assim como se dá atenção às diferenças e às fragilidades.
Por sua vez, sendo a catequese essencialmente iniciação à experiência da Fé, primeiro vivida pelos catequistas inseridos na comunidade e depois pelos catequizandos, a formação dos catequistas tem de ser prioridade, pois ninguém dá o que não tem. E tem de ir além da transmissão de conhecimentos, sejam eles doutrinais, psicológicos, pedagógicos ou outros, e conduzir à experiência da Fé vivida para depois poder ser partilhada.
Ora, é precisamente isso que pretende a nova proposta de formação dos catequistas, nomeadamente com o texto agora publicado, que leva o titulo “Ser catequista” e pretende ser verdadeira catequese de adultos.
Esperamos que este material possa ajudar os nossos catequistas a aprofundarem a sua Fé, para, com mais autoridade, nela poderem iniciar quantos lhes estão confiados.
Por outro lado, se antes já assim era, agora, com mais razão, temos de deixar de pensar e organizar a catequese somente em função das festas que lhe andam ligadas, seja a Primeira Comunhão, a Profissão de Fé ou o Crisma. Antes, temos de fazer da catequese o percurso da Fé, que promove o amadurecimento pessoal e a inserção comunitária.
7. A renovação e reorganização das nossas comunidades
A nova normalidade vai exigir-nos esforço conjunto para fazermos das nossas comunidades cristãs – sejam elas paróquias ou unidades pastorais, sejam movimentos e obras de apostolado ou outros espaços – lugares onde se experimenta a comunhão, a partilha fraterna, a participação, o mais alargada possível, pela qual cada um descobre e põe ao serviço as suas capacidades entendidas como verdadeiros dons de Deus ou carismas para enriquecimento de todos. E este será um dos melhores serviços que nós podemos prestar à própria sociedade no conjunto das suas estruturas de governo e de serviço às pessoas e às comunidades, pois um dos grandes défices que continuamos a sentir na sociedade atual é o défice de vida comunitária.
Se a pandemia, por um lado, nos obrigou a parar e a repensar as estratégias, não pode desvincular-nos do grande objetivo da nossa reorganização pastoral que é criar condições para que todos se sintam responsáveis e participantes na vida das suas comunidades e que todas as comunidades cresçam na consciência da comunhão que deve existir entre si e da sua responsabilidade missionária.
Na realidade, a nossa Fé não pode ser apenas um meio de conforto pessoal e de refúgio para defesa de medos e perigos vindos do exterior, mas sim e antes de mais, força que nos impele a levar a novidade de Jesus e do Evangelho ao mundo, a começar por aquele mundo que está mais perto de nós ou mesmo dentro dos nossos ambientes, mas continua estranho ao Bem Supremo que Jesus nos traz.
II Plano Pastoral Diocesano
O novo ano litúrgico encontra a nossa Diocese com um plano pastoral que estava definido para três anos (2019-2022), com objetivos gerais e específicos para cada um desses anos e voltado para o cuidado dos jovens e das famílias.
Assim, para o primeiro ano, propusemo-nos conhecer mais e melhor a realidade dos nossos jovens e famílias. No segundo ano propusemo-nos atuar sobre estas duas realidades pastorais como fossem identificadas, sobretudo através de iniciativas de acolhimento, acompanhamento e formação. Para o terceiro ano a proposta feita é celebrarmos juntos com os nossos jovens o entusiasmo da Jornada Mundial da Juventude e com as nossas famílias a alegria do amor, num evento diocesano a definir.
1. Do que programámos ao que havemos de conseguir
A fim de levar à prática este plano pastoral trienal, no primeiro dos três anos (2019-2020) propusemo-nos, em concreto:
a) No que se refere aos jovens, fazer a análise e o estudo da realidade juvenil e vocacional na nossa Diocese e organizar uma jornada pastoral sobre os jovens e a vocação.
b) No que se refere às famílias, fazer a prospeção da realidade diferenciada das famílias entre nós, incluindo a identificação, por meios naturalmente discretos, das situações que envolvam possível declaração de nulidade matrimonial, e organizar uma jornada pastoral sobre a família.
Estavam calendarizadas algumas atividades e iniciativas para atingir estes objetivos. Dadas as circunstâncias, não foram propriamente cumpridos os objetivos definidos para este primeiro ano, pelo menos nos moldes propostos. Mas sentimos que a sua importância não nos permite colocá-los de parte. Pelo contrário, continuamos apostados em lhes dar cumprimento, embora conscientes das dificuldades impostas pela nova conjuntura.
Assim pedimos aos agentes pastorais integradores destas duas realidades, especialmente aos departamentos diocesanos da pastoral Juvenil, Universitária e Vocacional e da Pastoral Familiar, que, dentro do possível, procurem e utilizem estratégias para irem concretizando estes objetivos.
É de realçar que, no que à pastoral juvenil diz respeito, há uma equipa diocesana a trabalhar para motivar a Diocese e os seus jovens rumo a Jornada Mundial da Juventude, que foi adiada do ano de 2022 para o de 2023, e os símbolos que deviam ter sido entregues no passado Domingo de Ramos, em Roma, e que, devido à pandemia, só no último domingo, dia de Cristo, Rei do Universo, foram entregues.
Também a pastoral da Família teve agendada para o passado dia 1 de maio uma jornada diocesana sobre a realidade familiar na nossa Diocese. O facto de as circunstâncias não terem permitido a sua realização, não vai desfazer a vontade de levar por diante o levantamento referido, para o qual a nova coordenação deste serviço pastoral vai canalizar esforços.
2. Na redefinição dos nossos calendários de atividades
Para o ano 2020-2021 resolvemos não produzir, como é costume, um plano pastoral mais especifico ou um calendário de atividades pastorais programadas e definidas para se realizarem em lugares e tempos predeterminados.
Reconhecemos que a planificação pastoral, nestes tempos, permanece aberta a continuas adaptações que nos vão sendo exigidas, segundo o que as circunstâncias em permanente mudança aconselham ou permitem.
Este constitui claramente um trabalho acrescido para os distintos serviços diocesanos, paroquiais ou interparoquiais, e também para as instâncias intermédias, como é o caso dos arciprestados.
Algumas das ações a desenvolver transitaram do calendário do ano anterior, por não ter sido possível realizá-las, pelo menos nos moldes em que estavam programadas. Embora de forma ajustada às novas condicionantes, iremos tentar retomá-las, particularmente as que foram programadas para a pastoral juvenil e para a pastoral familiar.
Este é o momento de os diferentes serviços de pastoral exercerem a sua responsabilidade para discernir os procedimentos mais adaptados à evolução da situação social que estamos a viver, sempre na procura da tal nova normalidade que nos permita viver a Fé com esperança nos novos contextos impostos pela pandemia.
Convido, por isso, todos os serviços diocesanos de pastoral a se manterem vigilantes, em constante diálogo com os párocos, para discernirem as iniciativas que podem e devem ser desenvolvidas, em cada momento.
3. Reorganização da Diocese
No final de 2019, que foi um ano missionário especial, em jornada pastoral com base no tema “O Papa Francisco e a Missão”, indicaram-se caminhos para que toda a Diocese progredisse na consciência da sua missão como Igreja particular, sobretudo para levar à prática a recomendação de que toda a ação pastoral seja missionária.
Para melhor concretizar essa ação pastoral em “constante saída missionária”, propusemo-nos também que o ano 2019-2020 fosse o ano da aplicação das orientações sobre a reorganização pastoral da Diocese, as quais foram amadurecidas desde a nossa Assembleia Diocesana realizada em 2017, através de Comissão nomeada para o efeito.
Até este momento, foram emitidos dois decretos, um sobre a constituição dos novos arciprestados e outro sobre a constituição e organização dos serviços diocesanos. Foi já possível reunir cada um dos sete arciprestados e eleger os respetivos arciprestes e delegados ao Conselho Presbiteral. Estão a ser constituídos os conselhos pastorais arciprestais e também decorre a reflexão e o diálogo sobre cada um dos conjuntos de paróquias que havemos de fazer evoluir para as futuras unidades pastorais.
Mesmo tendo em conta as adversidades causadas pela pandemia do novo coronavı́rus, pretendemos continuar este labor, dando os passos possíveis que as circunstâncias atuais forem permitindo.
III Na preparação e celebração do Natal
Como sabemos, o Advento, para além de dar início a um novo ano, é também preparação para o Natal.
Tanto a preparação como a celebração do Natal, este ano, não vão ser iguais aos anos anteriores. Mas a verdade é que o acontecimento do Natal permanece. Nas circunstâncias atuais, torna-se ainda mais necessária a mensagem que brota do Natal.
Vamos procurar, com criatividade e partilha de sugestões o mais alargada possível, encontrar as formas ajustadas a cada comunidade, a cada lugar e a cada ambiente para que a celebração do Nascimento do Salvador continue a ser motivo de alegria e de esperança, especialmente em tempos de maior sofrimento, como os que estamos a viver.
Mesmo com os novos constrangimentos, as novenas da Imaculada e do Natal não serão proibidas. Não poderão, é certo, ter as expressões efusivas dos anos anteriores.
Também os habituais atendimentos às pessoas, que geralmente procuram os sacerdotes, em maior número, para prepararem o Natal, sobretudo com o Sacramento da Reconciliação, não os vamos interromper, embora respeitando sempre as regras e cuidados imprescindíveis.
Pedimos a bênção de Deus e a proteção maternal de Maria Santíssima e confiamos-lhes todo o nosso esforço para promover a vivência e o anúncio da Fé, ao longo deste novo ano.
29.11.2020, I Domingo do Advento
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda
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