Sete anos após os conflitos, Manuel Nota lamenta a «falta de fundos», canalizados agora para outras situações de emergência no globo, e afirma que eleições em Moçambique esquecem a situação da região
Lisboa, 06 out 2024 (Ecclesia) – O diretor da Cáritas da Diocese de Pemba, em Moçambique, afirmou que as eleições no país esquecem a situação em Cabo Delgado e alerta para a “falta de fundos” para ajudar em “situações de emergência” e criar “projetos de desenvolvimento”.
“Nós precisamos de apoio, porque, por vezes, só vemos gente a sofrer, mas não podemos fazer nada, porque não temos como ajudar”, afirma Manuel Nota na entrevista semanal à Renascença e à Agência ECCLESIA.
O diretor da Cáritas da Diocese de Pemba considera que “o ambiente de emergência agora já não se faz sentir tanto”, apontando para a necessidade pensar projetos “com uma componente de desenvolvimento”.
“Não digo que Cabo Delegado esteja esquecido, não está. Mas a falta de fundos dá essa ideia de que parece estar esquecida”, lamenta.
Para Manuel Nota, “os financiamentos não estão a ser transparentes” e a sua ausência está “a fazer com que possa parecer que as organizações não têm vontade de atender àqueles que são os necessitados” na região
“A última vez que contactamos os nossos financiadores da Europa disseram-nos que o foco deles agora é olhar para as outras áreas que também estão a sofrer por conflitos armados. Então, para Moçambique tem pouco a fazer. A grande atenção está virada para os outros países”, afirmou.
Manuel Nota considera que, atualmente, “as coisas parecem estar calmas”, apesar da existência de “incursões” que “não têm sido relatadas como eram no passado”.
O diretor da Cáritas de Pemba lembra que a existência de forças ruandesas na região, nomeadamente nas zonas de exploração do gás, “tem vindo a garantir a segurança” e fala-se em ataques “nas zonas circunvizinhas ou mais próximas”.
“A minha perceção é que, querendo-se explorar, sem problema, há uma segurança forte, mas nas zonas que não são de maior interesse dos exploradores de gás, a população fica à deriva. Só Deus está lá para proteger”, lamenta.
Manuel Nota afirma que já chegaram a existir “perto de um milhão de pessoas deslocadas” na região, falando-se agora em 583 mil pessoas que regressaram, apesar de nem todas conseguirem encontrar os seus locais seguros e, por isso, “voltaram a sair para outros sítios”.
O diretor da Cáritas de Pemba referiu-se às eleições presidenciais em Moçambique, a 9 de outubro, afirmando que é necessário que “as coisas mudem um pouco” e lamenta que a situação de conflito em Cabo Delgado esteja esquecida.
“O conflito de Cabo Delgado já parece algo com que se convive. Parece que já nos habituamos a viver com ele. Um ou outro preocupa-se, fala e pronuncia-se um pouco sobre a questão da província de Cabo Delgado e dos conflitos. Mas, para os outros, é como se nada estivesse a acontecer; é algo que praticamente já estamos a viver com ele. Então, não há tanta preocupação”, afirmou.
Manuel Nota referiu-se também aos pronunciamentos do Papa sobre o conflito no norte de Moçambique e considerou que “as palavras do Papa Francisco foram ouvidas” e as pessoas “mudaram de estratégia de atuação”.
A 5 de outubro de 2017, em Mocímboa da Praia, na província de Cabo Delgado, em Moçambique, deflagrou o conflito na região provocado por guerrilhas que, nos últimos sete anos, atacaram as populações e provocaram centenas de deslocados.
Henrique Cunha (Renascença) e Paulo Rocha (Ecclesia)