Bispo do Funchal pede atenção particular aos jovens e aos lugares que frequentam

Mensagem de Quinta-Feira Santa aos sacerdotes O apostolado do padre não consiste em reunir gente à sua volta mas em redor de Cristo Bom Pastor. Os jovens merecem uma atenção particular do padre. Eles ressentem a crise contemporânea que perde o sentido de Deus, do pecado e do arrependimento e sentem uma atracção irresistível para o dinheiro e divertimentos. Não excluem uma relação sincera com Jesus Cristo, embora não saibam nem consigam alargar esta relação com coerência a toda a sua vida de estudo, de trabalho e de tempo livre. A Jornada Mundial da Juventude em Colónia, está a reunir um grande consenso entre a juventude europeia. A cruz da Jornada e uma imagem de Nossa Senhora tem sido levadas por toda a Alemanha com muito ardor e entusiasmo, e até já foram introduzidas em discotecas. Deus não pode estar ausente dos lugares de diversão juvenil que precisam de ser purificados e dignificados. A pluralidade de comportamentos espirituais ou religiosos em nossos dias, obriga o pastor a conceder tempo e a escutar os que vivem outras crenças e valores. A evangelização passa por uma pastoral ao serviço da unidade dos cristãos e da atenção às minorias migrantes, que chegam até nós. O padre deve ser um homem de tolerância, não no sentido de que tudo é igual, mas porque não pode ficar indiferente aos fermentos religiosos e ideologias que permeiam um mundo tão complexo como o que vivemos. A maior atenção deve ser dada à actividade missionária na preparação do baptismo, confirmação e matrimónio. O padre tem a missão de decidir quem pode e deve receber os sacramentos e exigir a conveniente preparação. As facilidades concedidas para atender mais a fins sociais do que pastorais, descaracteriza a pastoral, perturba a consciência de muitos fiéis e não forma cristãos para uma sociedade secularizada que, perante o aborto, a eutanásia, a permissividade, deixa-se arrastar pela opinião corrente e não pelo evangelho. Linhagem que o Senhor abençoa No Evangelho de São Lucas, hoje proclamado, escreve o evangelista que «estavam fixos em Jesus os olhos de toda a Sinagoga». Na vida pública do Senhor, principalmente no início da pregação na Galileia, as multidões seguiam o Mestre como o Profeta esperado, e esqueciam-se até do alimento corporal, para O seguir, ouvir, ver e estar com Ele. Se muitos fixaram os olhos em Jesus com raiva e até montaram insídias para o prender, a atitude normal dos judeus, fora da Paixão, foi de amizade e de atracção do Mestre. Os chefes religiosos que estudavam a forma de prender Jesus, evitaram as multidões e foi de noite, hora das trevas e das forças do mal, que manietaram o Senhor e dispersaram os apóstolos. O povo judeu tinha uma alma contemplativa alimentada pela oração e Palavra de Deus. A carta apostólica do Papa «Mane nobiscum Domine», acentua que «Jesus no sacrário deve constituir como que um pólo de atracção para um número cada vez maior de almas enamoradas dele, capazes de permanecerem longamente a escutar a sua voz e, de certo modo, a sentir o palpitar do seu coração: «Saboreai e vede como o Senhor é bom» (Sl. 34, 9). Vamos à escola dos santos Na carta para esta quinta feira, diz o Papa: «Vamos à escola dos santos». A diocese do Funchal, neste Ano da Eucaristia, tem dois modelos, que nos ajudam a fixar os olhos no Senhor. Eles fazem parte da «linhagem que o Senhor abençoou», como acentua Isaías, eles contemplaram-no «trespassado» como se exprime o autor do Apocalipse. Esses dois contemplativos são o Beato Carlos de Áustria e o Padre Leão Dehon que será beatificado a 24 de Abril. Diversos na contemplação, ambos estão unidos na direcção do que foi trespassado. Exemplo do Beato Carlos de Áustria O beato Carlos não deixou escritos de teologia, mas foi teólogo no sentido dos Padres da Igreja, – quem sabe orar é teólogo. Foi no sacrário e na frequência quotidiana da Santa Missa, que este militar, já na guerra com os seus soldados, como na modéstia da sua casa na Madeira, colocou o centro da sua piedade. Tendo chegado ao Funchal, após longa e penosa via- gem marítima, interrogado pelo Cónego Homem de Gouveia, en-viado pelo Bispo diocesano, para que pedisse o que mais necessitava, ele respondeu: a permissão para ter um oratório com a Sagrada Eucaristia e possibilidade da celebração da Santa Missa. Quando assistia à missa dominical na Sé, houve sacerdotes e leigos que participavam na eucaristia para olharem para ele e se edificarem com a forma como assistia aos Santos Mistérios. Nos últimos dias da sua trágica vida pediu ao seu capelão que trouxesse o sacrário para o seu quarto de enfermo de forma a poder orar e unir a sua paixão à do Redentor. No dia da sua morte comungou duas vezes. Exemplo do Padre Dehon O Padre Dehon, por seu lado, foi um grande teólogo tanto no conhecimento das verdades da fé como na contemplação do Coração de Jesus Cristo e na reparação pelas faltas dos homens. Ele soube unir a teologia sentada, ou seja a do ensino e escritos, à teologia ajoelhada, a da contemplação do Coração de Jesus, aberto pela lança do soldado e presente no Sacramento da Eucaristia. Para o Padre Dehon o Coração de Jesus equivale a Jesus Cristo, mas sublinhando o amor de Deus em Cristo, no evangelho, na Igreja. A reparação, significa um estado permanente de serviço a Deus e aos irmãos que se traduz em empenhamento concreto pela Igreja. Desta forma o Padre Dehon une devoção e acção, sem renunciar à interioridade. O culto ao Coração de Jesus devia penetrar na vida social dos povos e renovar a vida cristã. Contemplar o Coração de Cristo trespassado pela lança, é olhar para o Senhor no seu mistério mais profundo de entrega pela salvação da humanidade e de um amor sem limites pois no sacramento da Eucaristia santifica os homens e glorifica a Deus, fim de toda a actividade da Igreja. Interpelação directa aos jovens ordenandos «Não tenhais medo dos que podem matar o corpo mas não podem matar a alma» (Mt. 10, 28). Como nos anos anteriores temos dois jovens estudantes do quinto ano de teologia, o João Carlos e o Johnny que vão receber o ministério de acólito. No próximo mês de Julho, querendo Deus, ordenaremos de presbíteros três diáconos diocesanos, o Helder, o Ignácio e o Giselo e um dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus. Caros jovens ordenandos, vós também sereis colocados ao serviço da Eucaristia. «Diante dos nossos olhos, diz o Papa, na Carta apostólica «Fica connosco Senhor», temos o exemplo dos santos, que encontraram na Eucaristia o alimento para o seu caminho de perfeição (nº 31). Exemplo do sacerdote Karl Leisner Para além das figuras eminentes do Imperador Carlos e do Padre Dehon, quero recordar-vos, caros ordenandos, uma das cenas mais belas da história da Igreja contemporânea registada nos horrores do campo de concentração nazista de Dachau, no sul da Alemanha. Muitos cristãos se comoveram com a beatificação realizada por João Paulo II no campo Olímpico de Berlim, a 23 de Junho de 1996. Dois mártires, vítimas dos horrores dos campos de concentração, foram beatificados, um deles o mais jovem de 30 anos, era Karl Leisner, da Diocese de Münster. O jovem Karl, atleta, músico, devoto da Eucaristia e de Nossa Senhora, empenhado na pastoral juvenil, entrou no Seminário dizendo com humildade: «Senhor estou aqui, enviai-me». Neste tempo a Alemanha estava ameaçada pelo Nacional Socialismo de Hitler e os jovens nazistas escarneciam e agrediam publicamente os católicos e tomavam nota dos que defendiam publicamente a sua fé. O bispo de Münster, von Gallen, ergueu-se contra a ditadura de Hitler e a sua coragem fortaleceu o jovem Carlos que se preparava para receber o diaconado. Leisner foi preso e condenado a trabalhos forçados vindo a adoecer com tuberculose. Liberto da prisão recebe o diaconado a 29 de Março de 1939. Entretanto a Gestapo leva-o de novo para uma prisão em Friburgo e depois para o campo de concentração de Sachsenhausen e finalmente para o de Dachau onde permaneceu cinco anos. Aqui padeceu fome, frio e privações, falta de assistência médica e a tuberculose aumentou. Os campos de concentração favoreceram o encontro da alma cristã europeia. Leigos, padres, bispos, de todo o continente encontravam-se, oravam em conjunto e às escondidas, embora vigiados pela Gestapo, celebravam a eucaristia. Carlos Leisner queria ser ordenado padre mesmo no campo de concentração. Neste encontravam-se muitos padres mas faltava um bispo. Por fim chegou prisioneiro o bispo francês de Clermont, Michel Pignet. O inferno de Dachau começou a transformar-se num paraíso. Sempre às escondidas preparou-se tudo para a ordenação sacerdotal. Chegaram as licenças dos bispos de Münster e Munique. Uma menina de 15 anos, conseguia entrar no campo para visitar prisioneiros e introduziu paramentos, óleo do Santo Crisma, livros, mitra, anel para o bispo. Após a guerra ela foi condecorada pelo governo. Os prisioneiros prepararam tudo para a ordenação. Um monge beneditino fez o báculo para o bispo. A 17 de Dezembro de 1944, às escondidas, Carlos Leisner era ordenado sacerdote. Só no dia 26 de Dezembro, festa do primeiro mártir Santo Estêvão, o Padre Karl Leisner conseguiu celebrar a sua primeira e única missa, no campo de concentração. A tuberculose aumentou e a vigilância dos nazistas também. Pressentiu que morreria em breve e ofereceu a Deus o seu sacerdócio e a sua vida pela juventude. Com a chegada dos americanos a Dachau o Padre Karl foi liberto e levado para um sanatório onde morreu a 12 de Agosto de 1945. A vida do jovem diácono tinha uma meta, celebrar a eucaristia. Deus permitiu que celebrasse uma só vez, como Cristo na Cruz, e que depois entregasse a sua vida em expiação pelo ódio, violência e guerra. Mártires são semente de cristãos Os mártires são semente de cristãos, escreveu Tertuliano. As actas do martírio dos primeiros séculos tem páginas em branco para nelas se escrever as maravilhas que o amor de Deus derramou no coração dos seus filhos e que a exemplo do Bom Pastor dão a vida pelos seus irmãos. No campo da morte, Karl Leisner escreveu palavras de vida: «Vivemos sempre para Cristo e devemos estar preparados para morrer por ele»; «ofereço a minha vida em holocausto». Caros jovens ordenandos: amai a Eucaristia, preparai-vos digna e humildemente para a recepção dos ministérios e do sacerdócio. Que Deus vos dê a graça de celebrar durante longos anos a Eucaristia para glória de Deus e salvação do seu povo. Celebrai-a sempre como se fosse a primeira, a única e a última. Caros sacerdotes e ordenandos: introduzi Maria, a mãe sacerdotal na vossa vida, na vossa casa, no vosso ministério como fez o jovem mártir desde a sua tenra idade. Termino com o Santo Padre: «Neste ano de graça, a Igreja sustentada por Maria, encontre novo impulso para a sua missão e reconheça cada vez mais na Eucaristia a fonte e o apogeu de toda a sua vida. n D. Teodoro de Faria, Bispo do Funchal

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