Património histórico-cultural da Igreja não é estático, mas dinâmico Na vida da Igreja e na sua acção pastoral, como sabemos, a grande prioridade é anunciar o Evangelho através do qual se dá a conhecer a pessoa de Jesus Cristo. Como sabemos também, conhecer não é somente ter uma ideia ou algumas informações acerca das mais variadas temáticas religiosas. Conhecer implica essa intimidade e conformação da vida com a vida de que nos fala o Evangelho. Essa é a grande prioridade. Desde sempre a Igreja encontrou, na sua acção pastoral, grandes pontos de referência para fazer passar a mensagem evangélica. O estudo teológico profundo, a vivência litúrgica, a pastoral catequética, a pastoral social e caritativa, entre outros são sinal de que um enorme conjunto de questões se entrecruzam e apoiam entre si. Nesta experiência pastoral que, numa unidade, a Igreja vai vivendo, tem um especial lugar a problemática dos Bens Culturais da Igreja. Desde sempre foi uma questão extremamente valorizada pela Igreja. De acordo com os contextos históricos, de acordo com as diferentes culturas, a acção da Igreja foi a de valorizar estes aspectos que tocam a questão fundamental e a tal grande prioridade. No anúncio do Evangelho, porque o Verbo de Deus encarnou, está o olhar, a audição, o tacto. Isto é, estão os nossos sentidos e a nossa experiência humana. A razão fundamental para a arte religiosa, neste caso cristã, é o ponto de partida: a encarnação de Deus na história. Não se trata apenas de perceber, se bem que se trata de um tema importante no estudo dos Bens Culturais da Igreja, como é que a Igreja foi adaptando e convivendo com outras realidades culturais. Temos sempre de partir da noção de que a história viveu e vive tempos concretos, comunidades de fé concretas, com olhares diversos e experiência únicas e irrepetíveis. No âmbito dos bens culturais, a grande riqueza está aqui. Mais do que uma mera análise formal e material das questões e aspectos que integram esta questão, em que se podem tecer muitas considerações: a valorização dos bens, o seu valor material específico, o cuidado tido ao longo dos anos na sua conservação e promoção cultural, estamos diante de uma questão vasta e que levanta várias problemáticas. Entre elas está a questão da valorização, como experiência de fé, dos próprios bens culturais da Igreja. Sendo «culturais», eles manifestam, como se referiu anteriormente, uma experiência humana enraizada dentro de determinado espaço, em determinado contexto, num tempo concreto ou mais vasto. No entanto a experiência da Igreja alarga-se no tempo e, assim, os bens culturais passados e presentes, revelam-se num hoje e num tempo futuro, como bens fundamentais para mostrar a experiência da fé, não apenas numa perspectiva histórica, mas também numa perspectiva actual que suscita a compreensão dos mistérios da fé dados a conhecer, através da experiência litúrgica, catequética, moral e, por fim, teológica. Neste sentido, podemos dizer que a questão dos bens culturais da Igreja, aparece como transversal na vida eclesial e ao mesmo tempo como complementar das várias questões. A arte cristã, nas suas características de arte para a vivência litúrgica, reflecte-se numa arte celebrativa e catequética. Esta compreensão implica, então, ir mais ao fundo da questão. Se nos detemos nessa tal análise meramente formal e material, que não deixa de ser importante, não compreendemos o alcance do valor a vários níveis que os bens culturais implicam. Procurar a razão das coisas, a sua utilização, a sua utilidade, as variadas expressões iconográficas, as variadas expressões arquitectónicas e todo um outro vasto conjunto de elementos, permitem uma análise mais rica e actual. Um aprofundamento e uma valorização pastoral destes aspectos está, de facto, num olhar mais profundo e complementar. Numa breve e rápida análise esquemática dos bens culturais da Igreja, podemos dividi-los em bens materiais, em que se inserem os bens móveis: pintura, escultura, alfaias, etc; e bens imóveis: edifícios, monumentos. Numa outra perspectiva, mas igualmente importante, estão uma segunda valência que são os bens imateriais. Neste caso temos presentes as festas, tradições, expressões religiosas que usando bens materiais pretendem exprimir a vivência de um povo com determinadas características e aspectos culturais e sociais e que revelam essa tal experiência de fé ao longo dos tempos. Neste caso, a inventariação, como sabemos, não se prende só com a questão dos bens materiais mas também com os imateriais. Em todo este vasto mundo, em toda esta questão, há que ter noção de que muitas coisas, a nível pastoral, se podem fazer, utilizando os bens culturais eclesiais: a sua boa utilização litúrgica, a catequese sobre a Igreja partindo do edifício eclesial, a catequese sobre a experiência litúrgica partindo dos objectos e alfaias utilizados, a catequese feita a partir das expressões iconográficas tão presentes nas nossas igrejas. O contacto material e humano com todas estas questões remetem para uma realidade mais vasta e abrangente. O aprofundamento da fé passa, sem dúvida, por esse contacto com a experiência da beleza e pela assimilação da sua mensagem. O património histórico-cultural da Igreja não é estático mas dinâmico. Sendo dinâmico, age revelando a sua extraordinária potencialidade pastoral. Pe. António Pedro Boto de Oliveira, Sector dos Bens Culturais da Igreja do Patriarcado de Lisboa