Artesãos explorados em feiras de artesanato

São cada vez mais criativos e mais inovadores. E também cada vez mais reconhecidos. Mas nem por isso vêem esse reconhecimento expresso na possibilidade de fazerem da criatividade de artesãos uma carreira profissional. Viver do artesanato é um sonho de concretização quase impossível, a que acede um leque muito restrito de criadores. E as tentativas de entrar no mercado pela via das feiras mais atractivas é também uma missão quase impossível, porque os grandes eventos são já muito explorados por empresas que cobram elevados custos pela presença dos artesãos. O barcelense Manuel Macedo, que acaba de arrecadar o primeiro prémio do II Concurso de novos criadores de Arte Sacra, inserida na edição de 2008 do Salão de Artigos Religiosos, é um exemplo paradigmático de como a criatividade anda longe de ser suficiente para sustentar uma carreira profissional. «É praticamente impossível viver do artesanato. Só mesmo aqueles que têm muito nome e muita fama conseguem vender as suas criações no mercado. Eu já tenho uns anos neste mundo e passei uma boa parte do meu tempo de artesão a baloiçar», afirma Macedo. O artesão barcelense deixa implícito que só a «boa reforma» que aufere enquanto funcionário público lhe possibilita dedicar- se a tempo inteiro a uma arte a que se entrega pelo prazer de inovar. «Mas viver disto não dá», sublinha Manuel Macedo, denunciando as dificuldades que enfrentam os artesãos que pretendem utilizar os circuitos de comercialização colocados à sua disposição. Falta de apoio condenou artesãos Se os concursos de artesanato podem ajudar a chegar ao mercado, as feiras são a via mais eficaz de chegar ao consumidor final. Mas o problema é que este canal de comercialização está cada vez mais explorado. «As feiras estão muito comercializadas e levam-nos muito dinheiro pela participação», comenta o artesão de Barcelos, deixando claro que «as melhores feiras de artesanato do país, como as de Lisboa ou do Algarve, têm por trás empresas a explorar os artesãos e que levam muito dinheiro a quem quer participar». Com os custos de participação a atingir valores «muito elevados» que acabam por «não compensar» a deslocação às grandes feiras, o grosso das vendas das criações de Manuel Macedo acaba por fazer- se na própria casa. O criador natural de Santa Maria de Galegos deixa claro que, apesar de tudo, o mundo ao artesanato já conheceu dias bem piores. «Aqui em Barcelos, neste momento está-se a trabalhar bem e temos aqui gente com muita capacidade. Mas há 20 ou 30 anos atrás, surgiram artesãos novos, com muita qualidade, alguns melhores do que os criadores que participaram neste concurso e que podiam ter sido aproveitados. Mas não houve interesse da parte da Câmara de então em aproveitar esses artesãos», comenta o autor da peça que retrata de uma forma muito inovadora um cenário de confraternização entre Jesus e os seus Discípulos. Intitulada “Jesus com os seus amigos”, a criação de Manuel Macedo, que arrecadou o primeiro prémio da segunda edição do Concurso de novos criadores de Arte Sacra, revela-nos uma confraternização totalmente diferente das versões clássicas. Jesus Cristo surge numa amena brincadeira com os seus Discípulos, que são apresentados desde a perspectiva da profissão de cada um. «O meu propósito foi fazer uma coisa diferente. E como gosto muito de estar sempre a inovar e como nunca tinha visto uma representação de Jesus Cristo a brincar com os seus Apóstolos, surgiu-me a ideia de os representar nas suas profissões», explica. Salão de arte religiosa vai ficar em Barcelos A terceira edição do concurso de novos criadores de arte sacra registou a participação de catorze artesãos concorrentes. Os artesãos aceitaram submeter as suas obras à apreciação dos visitantes que se deslocaram ao segundo salão de artigos religiosos, que decorreu no posto de Turismo de Barcelos. A votação do público acabou por eleger a criação do artesão Manuel Macedo como a vencedora do concurso promovido pela Turel/TCR – Desenvolvimento e Promoção do Turismo Religioso, em parceria com a Câmara Municipal de Barcelos. O evento patrocinado pela Caixa Geral de Depósitos teve na representação de “O calvário”, de António Silva, a segunda criação premiada, sendo que o terceiro lugar foi atribuído à escultura do artesão Adriano Feio. A segunda realização, em Barcelos, da iniciativa que visa contribuir para uma inovação crescente da arte sacra e para a promoção da obras de novos artistas de inspiração religiosa marcou a escolha daquela cidade como palco de todas as futuras edições. Uma decisão que o responsável da Turel, Manuel Falcão, sustentou no êxito registado nas duas últimas realizações. «A opção por Barcelos para palco das últimas edições revelaram-se duas apostas ganhas, que permitiram juntar no salão de artigos religiosos muitas obras de arte e muitas sensibilidades artísticas», sublinhou Manuel Falcão, esclarecendo que as criações expostas têm agora a possibilidade de entrar nos circuitos comerciais, através das casas de estampas que, podem também elas ser «enriquecidas com artigos mais actuais e mais inovadores». Classificado de muito importante pela vereadora do Turismo da Câmara Municipal de Barcelos, o concurso de criadores de arte sacra é tido como um evento «de grande impacto regional» e com efeitos que se repercutem além fronteiras. Nele participam «vários empresários estrangeiros», frisa a vereadora Joana Garrido, acrescentando que um dos grandes objectivos da realização reside em «vincar a ideia de que Barcelos também é um grande criador de artigos religiosos». Dar palco aos artesãos de grande qualidade é ainda uma das finalidades do evento, que teve na Caixa Geral de Depósitos o patrocinador de «iniciativas que inovam uma arte de tradição secular», conforme sublinhou o representante do banco público, Manuel Malheiro.

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