Sacerdote jesuíta destaca desafio de lutar pela dignificação dos povos indígenas nesta região
Lisboa, 16 ago 2018 (Ecclesia) – O padre jesuíta Bruno Franguelli, atualmente a trabalhar no Peru, diz que ser missionário na Amazónia implica “aceitar viver uma vida simples, anónimo e escondido”.
Em entrevista ao portal informativo Ponto SJ, da Companhia de Jesus, o sacerdote brasileiro realça desafios como o choque “cultural” e a luta pela dignificação dos povos indígenas, num território permanentemente cobiçado pela riqueza dos seus recursos naturais.
“A situação na Amazónia é muito complexa. Parece que ainda hoje se repetem as histórias do início da colonização das Américas”, aponta o jovem padre, aludindo a situações como a exploração dos povos indígenas, por parte das multinacionais estrangeiras.
Atualmente, são várias as “empresas mineiras” que se valem da “ingenuidade” de comunidades e famílias para conseguirem os seus intentos, ocupando indevidamente as terras das pessoas e explorando os seus territórios para a extração de metais preciosos e outros bens.
De acordo com o padre Bruno Franguelli, “tribos inteiras são obrigadas a migrar em busca de sobrevivência”.
“É preciso preparar os povos da Amazónia para resistirem e trabalharem para que os interesses de multinacionais, muitas vezes favorecidos pelos nossos países, não se sobreponham aos destes nossos irmãos, que durante séculos têm sofrido por apenas defenderem quem são e o que lhes pertence”, frisa o sacerdote.
Vir para este contexto, como missionário, implica antes de mais “uma boa preparação psicológica e uma motivação consistente que se enraíze gradualmente na missão”.
O padre jesuíta salienta ainda como “indispensável que o missionário deseje aprender a língua nativa local para compreender desde dentro a cultura, o seu modo de pensar e os seus costumes”.
Sobre o trabalho de evangelização, este missionário destaca um ambiente marcado pela “disseminação de seitas evangélicas” e ainda muito vincado pela “superstição”, que favorece situações de “exploração” mas também de conflito.
“A forte superstição que existe entre os indígenas traz consequências gravíssimas na qual se acusam uns aos outros de bruxaria e famílias inteiras tornam-se vulneráveis diante das discórdias e guerras internas”, explica o mesmo responsável.
O padre Bruno Franguelli está no Peru desde 2013, e é atualmente vice-reitor do Santuário Nacional de São José de Anchieta.
No âmbito do seu trabalho apostólico, foi também designado para a missão do colégio de alunos internos ‘Fé e Alegria’ de Yamakayentsa, onde serviu como professor de religião, e também como catequista, “mais de 200 adolescentes e jovens indígenas”.
Um trabalho feito em conjunto com o padre espanhol Carlos Riudavets, recentemente assassinado.
“Quando lá cheguei, naturalmente tudo era uma grande novidade. O facto de morar dentro da Amazónia é muito atrativo num primeiro momento, mas depois, o dia a dia torna-se muito exigente, num quotidiano escondido e com poucos recursos. Neste sentido, eu admirava a persistência do padre Carlos”, conta o sacerdote brasileiro, que lamenta a tragédia que ensombrou a pequena comunidade jesuíta ali presente.
“Todos os dias, na pequena capela ao lado da nossa casa, celebrávamos a Eucaristia. Ali, num pequeno altar ornado segundo a cultura indígena, o padre Carlos erguia o cálice onde se derramava o sangue de Cristo. Mas nenhum de nós poderia imaginar, que depois de alguns anos, o seu próprio sangue seria derramado naquele mesmo lugar”, realça Bruno Franguelli.
O jovem sacerdote jesuíta recorda a memória de um homem simples, reto, firme em suas decisões e muito concentrado na sua missão”.
“Era diretor do colégio, mas era muito mais que isso. A ele recorriam os alunos quando estavam doentes ou precisavam de algum conselho. Não media esforços para se levantar até de madrugada para preparar algum remédio para um aluno doente. Além disso, era um homem pacífico, respeitado e querido por todos”, lembra o padre Bruno Franguelli.
O padre Carlos Montes Riudavets, de 73 anos, era missionário jesuíta no Peru desde 1969 e encontrava-se a viver na Amazónia há quase 40 anos.
De acordo com a Companhia de Jesus, o sacerdote foi encontrado morto no dia 10 de agosto, em “circunstâncias violentas”, um caso que está agora a ser investigado pelas autoridades.
JCP