Agricultura: Custos de produção «têm de baixar» para se sentir diferença nos preços – Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas

Domingos dos Santos, agricultor há 38 anos, lamenta falta de entendimento entre Governo e produtores e explica que «iva zero» apenas devolve aos consumidores receita de impostos previamente recebida

Foto: Agência ECCLESIA/HM

Lisboa, 29 mar 2023 (Ecclesia) – Domingos dos Santos, agricultor e presidente da Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas (FNOP), afirmou que, sem uma redução de custos nos “fatores de produção”, será difícil os consumidores sentirem uma baixa nos preços.

“Vai ser difícil ultrapassar esta situação enquanto a montante não houver uma redução de custos, nos fatores de produção. E nos próximos tempos é pouco provável que isso aconteça”, explica à Agência ECCLESIA o agricultor, com 38 anos de experiência.

A medida apresentada esta semana pelo Governo, que reduz o iva para 0% em produtos de um cabaz de básico, é uma medida que “devolve uma parte das receitas dos impostos à sociedade”, esclarece.

“Se eu pagar menos 6, 13 ou 23% sobre um produto é sempre bom. Tem sido uma exigência da produção, porque tem havido aumento de receitas fiscais por causa da inflação – um iva sobre um valor, é diferente do iva sobre um valor do produto mais a inflação. As receitas fiscais têm aumentado. Faz todo o sentido que o Estado devolva uma parte dessa receita de impostos à sociedade, caso contrário, estrangula as pessoas”, explica.

Domingos Santos recorda que durante a pandemia, numa altura em que havia “constrangimentos na circulação de pessoas, transportes” e “interrupção nas cadeias de produção”, não houve falta de alimentos e, recorda, “não se registaram grandes impactos nos preços”.

O setor conseguiu absorver o aumento de custos que acontecem com os constrangimentos. No entanto, quando a pandemia começa a diminuir, quando tudo começa a arrancar, havia muitas cadeias de produção destruídas, não no setor primário mas noutros setores, na energia, na fabricação de adubos, que em 2021 subiram muito. No consumidor não se refletiu, só teve consequências no consumidor quando se chegou ao limite de todas as capacidades e começa a sentir-se o aumento de preços”.

O responsável lamenta a falta de “valorização dos produtos nacionais” e explica que se o desinvestimento continuar, os produtos estão mais caros porque deixaram de ser produzidos e passam a ser importados.

“É uma situação inevitável, custa dizer isto porque somos também consumidores, mas se isto não acontecer numa melhoria de valorização de produtos nacionais, o que vai acontecer é muitos produtores deixarem de produzir. Não estamos satisfeitos com esta situação, em crise ninguém está bem, e acho que estamos todos as perder”, constata.

Foto: Agência ECCLESIA/HM

Nelson Malaquias, responsável de uma empresa familiar de exploração agrícola, explica à Agência ECCLESIA que o custo de produção “dobrou”.

“O custo de produção dobrou o seu preço: os adubos, os combustíveis e é um desafio para os produtores continuarem a produzir. O trabalho da agricultura não é valorizado, mas somos a base da alimentação das pessoas”, reconhece.

Da experiência na empresa familiar, afirma que metade da sua produção destina-se ao norte da Europa, caso contrário a “resiliência” teria de ser ainda maior.

“Temos de lutar contra a maré e ser resilientes, mas o mercado é volátil, como em tudo depende da oferta e da procura. Não nos podemos queixar porque 50% da nossa produção é para a exportação para o norte da Europa, temos mercado e vamos continuando a resistir, caso contrário seria muito difícil”, explica.

Domingos Santos lamenta a falta de uma “produção organizada” que possa ter dimensão no equilíbrio de negociações e acusa a falta de entendimento entre a tutela e os agricultores.

“É fundamental haver renovação geracional. Olhamos para os dados estatísticos e a média dos agricultores está acima dos 60 anos. O que queremos do nosso futuro? E quem tutela o ministério não ouve quem está no terreno e não acolhe a experiência que pode dar um contributo para as políticas públicas; não é no gabinete que se sabe tudo, mas na troca de experiencias e conhecimentos”, propõe.

O presidente da FNOP indica a importância do primeiro setor que, não tendo “grande peso no PIB”, tem de ser “forte”.

O tema vai estar em destaque na próxima emissão do Programa ’70×7′, este domingo, pelas 17h30, na RTP2.

HM/LS

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