«Ad Limina»: Eu fui

Paulo Rocha, Agência Ecclesia

Os bispos de Portugal participaram, durante a última, semana na visita ‘Ad Limina’. Quatro dias de reuniões de trabalho que não tinham o propósito de prestar contas nem o desígnio de elaborar um caderno de encargos a entregar, no fim de muitos quilómetros percorridos, a cada bispo, para que fosse cumprido na sua diocese. E se dúvidas existissem sobre o regime em que decorrem as reuniões e as dinâmicas de participação dos bispos nas estruturas centrais da Igreja Católica, o último encontro, o encontro com o Papa Francisco, confirmou a mudança de paradigma, como indicou o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornelas, uns minutos depois de ter descido do Palácio Apostólico.

Não é preciso recuar muitos anos para ter memória de que estes encontros com o Papa eram revestidos de alguma formalidade: um elemento da Conferência Episcopal presente, o seu presidente, lia uma saudação ao Papa, que depois lia um discurso preparado para a ocasião. Como aliás continua a acontecer com muitas audiências concedidas pelo Papa.

Francisco tem considerado as visitas ‘Ad Limina’ dos bispos de todas as partes do mundo como audiências privadas, sem discursos formais, antes como oportunidade de diálogo, qual família que se encontra. E foi isso que aconteceu desta vez, com os bispos de Portugal: os discursos foram deixados de lado, desde logo pelo presidente da CEP, e durante quase duas horas, aconteceu escuta, diálogo, participação. E a convocatória para a missão.

Uma narrativa algo longa para passar o que os bispos de Portugal afirmaram, após esta visita ‘Ad Limina’: assinalou uma mudança de paradigma, uma nova forma de ser Igreja, a sinodalidade a acontecer. De facto, mais do que prestar contas, os bispos participaram numa experiência de trabalho conjunto; mais do que ficar agarrados a relatórios, trocaram ideias e preocupações sobre a missão da Igreja, na atualidade; mais do que procurar conclusões e decisões, sentiram-se parte de um caminho que é percorrido por tantos, por milhões. E um Papa, como cada batizado, é um entre muitos.

O que resulta daqui? Sementes, fermentos, nascentes, premissas… Os frutos chegarão depois e os resultados também.

Em causa, uma experiência que é impossível descrever sem nela ter participado, mas que interessa a um público muito abrangente, na comunidade portuguesa. Não apenas o público católico, mas as cidadãs e os cidadãos que se importam com a construção de uma sociedade melhor para todos, onde a dimensão religiosa, pela instituição Igreja Católica e pelo compromisso social que faz emergir em tandos concidadãos, é indiscutível, a par de muitas outras…

É por isto que um evento, uma experiência como o encontro dos responsáveis por todas as dioceses de Portugal com os organismos da Santa Sé e com o Papa tem de ser mostrada, deve tornar-se visível no contexto de cada comunidade crente, de cada família de cada pessoa. E isso é uma função da comunicação social: informar sobre o que interessa ao público, sem exclusivos mediáticas ou ondas que determinam cada vez mais o comportamento coletivo e o perfil das sociedades que constituímos.

No processo de comunicação, hoje não é preciso esperar pelo noticiário da noite para saber tudo o que aconteceu durante o dia. As dinâmicas de comunicação são cada vez mais abrangentes e, numa rede sem fronteiras, rapidamente chegam as imagens e as mensagens que fazem a história do dia. O que não dispensa a mediação do jornalismo que, por profissionalismo, tem de ser a garantia da apresentação de factos, e, por deontologia, a possibilidade de passar a história do acontecido sem filtros pessoais ou institucionais que a deturpem. Mas já não está sozinho…

Por outro lado, não são apenas os títulos nacionais, da imprensa rádio ou televisão, que fazem a comunicação. A possibilidade de produzir e emitir conteúdos abeira-se cada vez mais de todos os dispositivos e faz de cada pessoa, caso o queira, um meio de comunicação. Claro que são processos que atuam em bolha e reclamam a capacidade de habitar territórios desconhecidos, generalistas… Mas são processos que estão aí, que também são comunicação.

O desaparecimento dos jornalistas de momentos marcantes para a história de um dia ou de um século fragiliza o jornalismo. Seja qual for o tema! Assim acontece com uma qualquer conferência de imprensa onde tudo é “fabricado” dentro de portas ou com a divulgação de qualquer novidade exclusivamente a partir de quem a tem de “vender”.

Um contexto amplo onde atuam os diferentes atores da sociedade, num jogo de tensões de desfecho quase sempre imprevisível. E raramente capaz de gerar consensos entre partes, as institucionais e as comunicativas. Mas o jornalismo nunca se pode demitir de uma função essencial: observar. Só depois pode informar e ainda mais posteriormente interpretar. Quando a interpretação preceder a observação, a participação, facilmente se transforma em preconceito.

No global festival de música, que agora vai passar pelo parque Tejo, em Lisboa, a divulgação foi acontecendo, desde a primeira edição, também com a força mobilizadora da declaração pública “Eu vou”, estampada em tantas camisolas . Uma campanha que me leva a pensar na nobre profissão de informar e na responsável possibilidade de apreciar ou julgar: é bem diferente, e mais autêntica, quando sustentada pela possibilidade de afirmar “Eu fui”.

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