O padre e investigador português, Nuno Vieira, em entrevista à Agência ECCLESIA revela que durante o período de exílio de D. António Ferreira Gomes, na diocese de Valência (Espanha), “ninguém percebia como se podia exilar um bispo, só se fosse por prepotência do poder político”.
O padre e investigador português, Nuno Vieira, em entrevista à Agência ECCLESIA revela que durante o período de exílio de D. António Ferreira Gomes, na diocese de Valência (Espanha), “ninguém percebia como se podia exilar um bispo, só se fosse por prepotência do poder político”.
AE – O clero de Valência tinha conhecimento que D. António F. Gomes era um bispo exilado?
NV – Tinha conhecimento e comentavam. Os comentários, por norma, eram acolhedores. Ninguém percebia como se podia exilar um bispo, só se fosse por prepotência do poder político. Havia um profundo respeito por D. António Ferreira Gomes e, inclusivamente, chegou a ordenar um sacerdote. O bispo português sempre foi muito educado e carinhoso para com as pessoas.
AE – Nas cerca de 180 visitas pastorais que realizou na diocese e naquilo que escreveu dá para perceber que D. António Ferreira Gomes deu uma atenção especial aos mais desfavorecidos.
NV – Era o momento pós-guerra e havia muita miséria. D. Marcelino Olaechea chegou a fundar 200 congregações religiosas que se dedicavam a apoiar os mais pobres e necessitados. Foi quando começou a instrução primária e havia um índice de analfabetismo tremendo. Encontravam-se casos dramáticos.
AE – Sendo D. António Ferreira Gomes um bispo intelectual e que falava para as elites, em Espanha mudou o seu estilo de linguagem?
NV – Era um homem mais simples porque tinha uma realidade diferente. Tinha um povo marcado e dividido. É conveniente não esquecer que na guerra espanhola houve confrontos entre pais e filhos. Famílias inteiras divididas. Uns no «bando» republicano e outros no «bando» nacional. Realizaram-se autênticos massacres e a Igreja contribuiu na restauração da paz social. Esta serviu-se continuamente do apelo ao perdão e ao esquecimento.
AE – O bispo do Porto soube compreender a realidade onde estava inserido e ajudou a apaziguar os ódios.
NV – Isso foi notório. Era a grande missão da Igreja, basta ver as cartas pastorais e as homilias dos bispos. Fazia, com frequência, um apelo à fraternidade e à unidade.
AE – Não era perigoso falar de pobreza naquela época? Ser-se conotado com os partidos políticos da esquerda?
NV – Quando D. António Ferreira Gomes esteve nas terras levantinas, já não era muito perigoso porque havia bispos que tinham essa sensibilidade social.
AE – Alguns bispos estavam na iminência de serem desterrados. O caso do bispo de Bilbau, D. António Añoveros, é disso um exemplo.
NV – Naqueles anos ainda não, mas poucos anos depois sim. Pretenderam expulsá-lo do país repetindo na íntegra o método de Salazar, por atrever-se a publicar, em 1973, uma homilia hostil ao governo com a ordem expressa de ser lida pelos sacerdotes em todas as igrejas da sua diocese. No entanto, Franco voltou atrás. Apesar da linha ideológica que tinha, Franco era um homem profundamente religioso e respeitador da Igreja.
AE – O silêncio de Franco em relação ao exílio de D. António Ferreira Gomes pode ser entendido com aprovação ao acto de Salazar?
NV – Não. O silêncio de Franco significa mais o respeito que ele tinha para com os bispos.
(Última parte da entrevista, pode lê-la na integra em http://www.ecclesia.pt/vaticano2/50anos.php)
LFS