Fraca participação cristã permanece como enigma a resolver

A ausência de uma prática cristã estável, acentuada por problemas como o êxodo populacional, a quebra da taxa de natalidade e o envelhecimento das comunidades constitui há anos um enigma difícil de resolver para a Igreja Católica em Beja, a quem falta meios humanos para estar mais próxima das pessoas.

Em entrevista à ECCLESIA, o vigário-geral da Diocese, padre António Domingos Pereira, sublinha que “com o número reduzido de padres, a sua média etária que ronda os 60 anos e as distâncias que cada um tem de percorrer, não é fácil fazer uma pastoral muito ativa e presente”.

Atualmente, a força evangelizadora que está ao serviço daquela que é a segunda maior diocese do país, com 12 189 km2, ascende a pouco mais do que uma centena de padres, religiosos e diáconos permanentes.
Limitado no número e no tempo, o clero apenas consegue “responder àquilo que é o tradicional, como as missas e os sacramentos”, salienta aquele responsável.

Um dos casos mais “extremos” desta realidade está à vista no concelho de Mértola, onde nove paróquias, algumas bastante distantes umas das outras, estão neste momento entregues a apenas um sacerdote.
“O seu colega adoeceu, está a tratar-se no Norte e ele ficou sozinho com todas aquelas comunidades”, explica o vigário-geral, adiantando ainda que “uma das paróquias obriga a uma deslocação de 76 quilómetros”.

Algumas localidades, sobretudo no Interior ou mais próximas da fronteira com Espanha, estão tão isoladas do coração da diocese que se tornaram quase “indiferentes” ao anúncio do Evangelho.

Indeferentismo

Enviado para a freguesia da Amareleja, bem perto do rio Alqueva, há cerca de sete meses, o padre Erbério Salença confessa-se “assustado com o ritmo com que as pessoas respondem à Igreja, muito diferente daquele que conheceu na sua terra natal, em Moçambique” ou que encontrou em outros pontos de Portugal, como Lisboa.
“Aqui as pessoas têm o conhecimento de Deus, mas reina um pouco o indiferentismo. Há que chamá-las de novo à casa do Pai”, aponta o sacerdote, que conta com o apoio de algumas irmãs Servas de Nossa Senhora de Fátima.

Situada no extremo norte do Concelho de Moura, aquela localidade integra as Paróquias da Amareleja, da Póvoa de São Miguel e de Nossa Senhora da Estrela.

Tal como acontece um pouco por toda a região alentejana, a maior parte da população que ali vive é constituída por “pessoas idosas, com mais de 50 anos, em muitos casos aposentados que voltaram dos grandes centros para construírem aqui as suas casas”, em busca de tranquilidade para o que resta da vida.

A paróquia da Estrela é “quase um bairro” fluvial, composto por apenas 80 pessoas que escolheram ficar ali mesmo depois da subida das águas, provocada pela construção da Barragem do Alqueva.

 “Há dias em que tenho 10 pessoas na missa”, admite o padre Erbério Salença, para quem são necessários “mais missionários” para espalharem a mensagem de Deus.

Por outro lado, acrescenta, é preciso “tentar chegar aos pais através dos filhos”, aproveitando os jovens que ainda não saíram para outras paragens, em busca de um futuro melhor.

No entanto, de acordo com o vigário-geral de Beja, “penetrar na esfera dos jovens” também “não tem sido fácil” e “os grupos de jovens paroquiais são muito reduzidos”.

A própria ação social da Igreja, quando se esperava que pudesse suscitar uma adesão mais forte a Deus, sobretudo nestes tempos de crise, tem sido insuficiente para enraizar mais pessoas na fé.

“Talvez falte à Igreja a força necessária para fazer ver às populações que a sua ação fraterna nasce do amor da própria comunidade cristã”, considera o padre António Domingos Pereira.

A Diocese de Beja tem concentrado a maior parte do seu trabalho sociocaritativo nas regiões do Interior, sobretudo nos meios rurais, onde o êxodo populacional e o isolamento é mais intenso e as oportunidades de emprego estão limitadas a trabalhos sazonais, ligados à cortiça ou às sementeiras.

Cativar os homens

Uma situação que contrasta com a vida mais estável do litoral, onde as unidades industriais ligadas ao mar, como aquela que está instalada junto ao Porto de Sines, ainda funcionam como polos de emprego para grande parte da população.

O padre Pedro Guimarães, que veio para o Concelho de Santiago do Cacém em 2007, conhece bem as duas realidades, já que acompanha diariamente um grande aglomerado urbano, com perto de oito mil habitantes, e um conjunto de pequenas aldeias, como São Bartolomeu da Serra e Santa Cruz, que juntas não chegam às mil pessoas.

Em termos sociais, a solução para os problemas tem passado pela aposta no “trabalho em rede com a Cáritas diocesana e conferências vicentinas”, confidencia o sacerdote, para quem “quanto mais a Igreja estiver presente, melhores hipóteses terá de dinamizar as comunidades e ser voz ativa para a mudança”.
Quanto à prática dominical, ela acompanha a tendência geral, por isso o grande desafio para o jovem sacerdote tem sido “criar nas pessoas um sentimento de pertença a uma identidade comum, que é a paróquia”.
Muitas vezes, esse sentimento de pertença é posto em causa devido a preconceitos culturais fortemente enraizados.

 “Há paróquias em que os homens não vão à Igreja porque a pressão social é tão grande que eles não se sentem capazes de ir e quem for vai ser algo de gozo durante a semana”, acrescenta o padre Pedro Guimarães.
Neste contexto, “abraçar as famílias e chegar aos homens, para que eles consigam fazer parte da comunidade, tem sido uma grande luta”, conclui.

Apesar de a maior parte da população ser batizada e se declarar católica (cerca de 184 mil pessoas), a prática dominical na região não ultrapassa os 6,1 por cento.

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top