Centenário da morte de Francisco José de Sousa Gomes (1860-1911)

Nascido em Braga, a 18 de dezembro de 1860, Francisco Sousa Gomes chegou a Coimbra, em 1877, onde se matricula nas Faculdades de Matemática e de Filosofia. Depois de feito o doutoramento em Filosofia (1882) é eleito sócio da Academia Real de Ciências (1886) e presidente da Confraria da Rainha Santa (1893). A sua fama ultrapassa fronteiras e, em 1895, é eleito sócio da Sociedade Química de Paris.

Dado o prestígio de que gozava, Francisco José de Sousa Gomes era chamado com relativa frequência para proferir conferências, tanto em congressos como em reuniões mais restritas, quer sobre temas de caráter estritamente científico quer sobre temas sociais ou religiosos.

De algumas dessas conferências ficaram apenas extratos sucintos nos jornais; outras foram publicadas na íntegra, como aquela que fez no Seminário Conciliar de Braga, em julho de 1904, sobre «O Dogma da Imaculada Conceição e os milagres de Lourdes (França)», ou a que proferiu na inauguração do Círculo Católico Operário de Viseu, em 1901, e também outra que proclamou no Círculo Católico Operário do Porto, na sede do jornal «A Palavra», em julho de 1907.

Sousa Gomes abordou os temas sociais em conferências proferidas sobretudo nos Círculos Católicos. Reflexo desse ensinamento encontra-se também na orientação que imprimiu à revista «Estudos Sociais», embora o seu nome aí raras vezes apareça. De notar que, ao referir-se aos problemas sociais, a linguagem usada, dado o público a que se dirigia era, o mais possível, ao seu alcance e de caráter acentuadamente didático.

Uma atenção permanente às massas trabalhadoras para estas não deixassem perder os valores religiosos era uma das grandes preocupações de Sousa Gomes, convencido de que, em última análise, não é a Economia, mas a Religião que dá o sentido último à vida. Daí a atenção que prestava aos círculos católicos operários e o cuidado em formar e amparar não só os próprios filhos, mas também jovens estudantes que iam para Coimbra estudar. “A sua presença discreta no Centro Académico de Democracia Cristã (CADC) e na revista «Estudos Sociais» vai buscar a razão de ser às suas profundas convicções religiosas” – (Cf. «Figuras notáveis da Igreja de Coimbra»; Manuel de Almeida Trindade e Gabriel de Sousa).

O programa católico de resposta à «questão social» é caracterizado – diz Sousa Gomes – por um grande ecletismo: «O catolicismo sabe bem que o homem não vive só de pão, mas sabe igualmente que lhe é indispensável o pão. Para ele o problema social não é um simples problema moral, como alguns espiritualistas utópicos pensam; nem uma questão meramente económica, como julgam os socialistas. Ele sabe que a igualdade absoluta é irrealizável neste mundo; mas sabe também que se pode alcançar uma igualdade relativa, que se podem atenuar as desigualdades atuais e nisso trabalha com todas as forças» (Conferência no Círculo Católico Operário de Viseu sobre «A Questão Social»).

Com frequência advogou Sousa Gomes a ideia de que era preciso que os católicos se instruíssem em matéria religiosa; que não é possível ter convicções pessoais e profundas sem cultura religiosa. Para isso é preciso ler; mas também que haja quem escreva e o faça numa linguagem compreensível para o comum dos leitores.

Apesar de não ser um especialista em assuntos religiosos, nomeadamente exegese bíblica, o bracarense que se tornou cidadão da Lusa Atenas adquiriu, pela leitura, suficiente bagagem para poder abalançar-se a tratar de alguns desses temas. Fê-lo ao abordar o dogma da Imaculada Conceição, quando se perfaziam 50 anos sobre a definição do dogma pelo Papa Pio IX. Fê-lo também nas duas conferências proferidas no Círculo Católico de Lisboa e publicadas, com o título «Os Evangelhos e a Pessoa de Jesus Cristo», na coleção «Sciência e Religião», que se editava na Póvoa de Varzim.

Falecido a 8 de julho de 1911, Sousa Gomes teve sempre em grande apreço o santuário de Lourdes (França) e lá foi, várias vezes, em peregrinação, levando consigo os próprios filhos. Recorrendo a outros livros do mesmo género editados por algumas dioceses francesas, chegou mesmo a elaborar um «Manual do Peregrino Português», vindo a público em 1910, para a qual alguns bispos portugueses escreveram palavras de justo encómio.

D. Manuel Vieira de Matos, ao tempo bispo da Guarda, refere-se a Sousa Gomes nestes termos: «O profundo conhecimento que o autor tem de Lourdes, das suas maravilhas, e a fé inabalável que o anima e que publicamente professa com um desassombro que muito o honra, tornam-no competentíssimo para escrever uma obra destas».

Homem de grande integridade moral que supõe não apenas convicções pessoais bem alicerçadas como também coerência de atitudes, Sousa Gomes deu exemplos da firmeza das suas convicções não apenas por palavras, mas pelo teor da sua vida.

«É preciso ser-se católico, mas é preciso sê-lo a valer. Ser católico só para ir à igreja sem consulta prévia quando nos levam ao batismo e aos responsos da sepultura; para ir à igreja por um mero ato de condescendência social quando nos vamos casar, por cumprimento de deveres de civilidade quando se canta um «Te Deum» oficial ou se enterra algum amigo nosso; por curiosidade de bom-tom quando vamos à missa da moda ou a alguma festa que meta boa música e sermão com muitas flores de retórica – não basta! Esse é catolicismo à flor da pele que não serve para nada, e que até me é menos simpático do que a irreligiosidade declarada mas cortês» (Conferência no Círculo Católico Operário do Porto, em julho de 1907).

LFS

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