Homilia de D. José Policarpo na Solenidade da Dedicação da Sé Patriarcal

A Catedral e a visibilidade da Igreja

1. Na nova evangelização, é tão importante a visibilidade da Igreja como a força do seu mistério. É a sua realidade visível, na sua estrutura, na expressão comunitária, na presença dos cristãos no seio da comunidade humana, que comunicam e anunciam o amor salvífico de Jesus Cristo. Se a realidade visível da Igreja não transmitir a força invisível do Espírito de Cristo, torna-se estéril, equivalente a qualquer associação humana. Mas a realidade visível da Igreja é o caminho normal para comunicar e transmitir o invisível de Deus. A Igreja continua no tempo, a seu modo, o mistério do Verbo encarnado, em que o Verbo divino se exprime e actua na visibilidade da humanidade de Cristo (1).

Esta harmonia do visível e do invisível, da realidade humana e da acção da graça, é o segredo da nova evangelização. Porque está no mundo, com a densidade das realidades históricas, a Igreja comunica o dinamismo do Reino dos Céus. Esta visibilidade da Igreja exprime-se na sua estrutura organizativa, na densidade da sua liturgia, no amor dos pobres, na presença dos cristãos no seio das diversas realidades humanas, onde semeiam a semente do Reino de Deus e são presença do amor-caridade, isto é, do amor com que Deus continua a amar o mundo, em Jesus Cristo.

2. A Catedral é expressão importante da visibilidade da Igreja e, por isso, é chamada a ser foco irradiante da graça de Jesus Cristo. Esta visibilidade da Catedral é mais do que a imponência do monumento. Igreja-Mãe de uma diocese, porção do Povo de Deus confiada aos cuidados pastorais de um Bispo, congregada pelo Evangelho, fortalecida na Eucaristia, reunida na comunhão da caridade, enviada ao mundo a anunciar, essa Igreja particular pode perceber, na sua Catedral, o segredo do seu ser e da sua missão. A visibilidade da Catedral é a visibilidade do ministério apostólico: a densidade da Palavra, sempre anunciada de novo para iluminar o presente, o dinamismo das comunidades cristãs que, reconhecendo no Bispo o seu pastor, sacramento de Cristo Bom-Pastor, aprendem a celebrar a Páscoa, descobrindo na Eucaristia a surpresa da redenção, a exigência da caridade, a urgência de partir em missão, tornando-se cada um, no meio do mundo, presença visível do invisível de Deus. Na Catedral pode ler-se toda a realidade da Igreja, a sua humanidade e a fecundidade invisível da acção do Espírito Santo.

3. Na Catedral a realidade invisível transcende a sua visibilidade. Já era esse o mistério do Templo de Jerusalém, tão bem expresso na oração do Rei Salomão. O templo visível suscita a fé e a esperança, toda a densidade da Aliança: “Os vossos olhos estejam abertos, dia e noite, sobre esta casa, sobre este lugar, do qual dissestes, aí estará o Meu nome” (1Re 8,29). O templo é, assim, a expressão visível da fé de Israel: Deus ama o seu povo e habita no meio dele.

4. No cristianismo, a verdadeira dimensão da Catedral é a Igreja, Povo dos que caminham com Cristo para a Jerusalém Celeste. Só a Igreja é, hoje, o verdadeiro templo, onde Deus habita no meio do seu Povo. A Catedral é o símbolo e o anúncio desse verdadeiro templo do Senhor, cuja solidez está alicerçada em Cristo, a pedra angular. E Pedro é claro na sua Carta: “Aproximai-vos do Senhor, que é a pedra viva, rejeitada pelos homens, mas escolhida e preciosa aos olhos de Deus” (1Pet. 2,4). Deus tinha-o anunciado através dos profetas: “Vou pôr em Sião uma pedra angular, escolhida e preciosa, e quem nela puser a sua confiança, não será confundido” (1Pet. 2,6).

A Catedral, na sua visibilidade, anuncia a solidez e a firmeza da Igreja. Nela descobrimos que estamos seguros nas nossas lutas, sólidos no nosso caminho de santidade, protegidos nas nossas fraquezas e tentações, porque nós fazemos parte da Catedral. “E vós mesmos, como pedras vivas, entrai na construção deste templo espiritual” (1Pet. 2,5). Alicerçada em Cristo, a santidade dos cristãos garante a solidez da Igreja, visível e humana, na fidelidade à sua vocação e missão.

Este templo espiritual abraça o mundo. A solidez desta Catedral são os doze Apóstolos do Cordeiro. Não há Catedral sem Bispo, nem Bispo sem Catedral. É assim na sua visibilidade histórica, será assim na Jerusalém Celeste. Como diz o Apocalipse, “a muralha da Cidade tinha na base doze reforços salientes e neles doze nomes: os dos doze Apóstolos do Cordeiro” (Apc. 21,14).

O problema da Samaritana era saber qual era o verdadeiro templo: o de Jerusalém ou o da Samaria? Jesus abre-lhe o coração para o novo Templo, Ele e a sua Igreja, construído com pedras que são Cristo, os doze Apóstolos, e todos os discípulos de Cristo. Nesse novo templo, Deus adora-Se em espírito e verdade (Jo. 4,23).

A Catedral só tem razão de ser, se for o templo visível onde cabe o templo invisível, que é toda a Igreja diocesana. Nela descobrimos a Igreja, nossa Mãe; solidificamos a firmeza da nossa fé; alargamos o horizonte da nossa comunhão; descobrimos a unidade como a cúpula da catedral; somos enviados com novo ardor, para testemunhar no meio do mundo, de uma maneira sempre nova, o amor de Jesus Cristo. Descobrimos que sempre, em qualquer momento da nossa vida cristã, nós estamos reunidos nessa grande Catedral que é a Igreja, a ouvir o ensinamento dos Apóstolos, e a amar todos os homens, nossos irmãos, com o infinito amor de Deus, em Jesus Cristo.

Sé Patriarcal, 25 de Outubro de 2010

JOSÉ, Cardeal-Patriarca

NOTA:

1 cf. Lumen Gentium, nº 8

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