Solidariedade universal e comunitária no uso dos bens

Homilia do Bispo de Viseu no Dia Mundial da Paz

A Liturgia do 1.º dia do ano invoca Santa Maria Mãe de Deus como a protecção materna para os 365 dias que todos esperamos que sejam dias felizes, fazendo estes votos para todos. Para isso, pedimos a Deus a bênção divina e paterna, juntamente com os Seus favores, num olhar favorável que faça com que todos os bens tenham, como síntese e referência, a Paz.

Por esta referência especial, a Igreja foi chamando ao primeiro dia do ano “Dia Mundial da Paz”, sendo este o 43.º, paz que nasce num coração de filho que, como nos diz S. Paulo na 2ª leitura, nos leva a reconhecer a grandeza do dom da filiação como o grande dom do cristão. Somos filhos de Deus. Todos juntos, somos Família de Deus. Este dom que nos engrandece e é garantia de uma Vida Feliz dá-nos acesso a todos os outros bens divinos e, pelo E. Santo, torna-nos herdeiros por graça de Deus. É esta mesma paz que nos ajuda a escutar e a perceber os sinais da presença de Deus no mundo e na nossa própria vida, como Maria que escuta, observa e guarda tudo no coração. Só um coração atento que observa, ama e escuta pode viver e perceber a paz e ser sinal e instrumento de paz para os outros.

Como propôs João Paulo II, há anos atrás, de um coração novo nasce a paz e um coração em paz torna-se construtor de paz no seio da própria criação.

É nesta sintonia com a paz na criação que Bento XVI nos apresenta o tema para este 43º Dia Mundial da Paz. Diz-nos, de uma forma muito clara, que se quisermos cultivar a paz, deveremos preservar a criação.

Pode parecer-nos um tema muito técnico, destinado a pequenos grupos, por vezes assumido um tanto ideologicamente e acessível apenas aos especialistas de ecologia e ambiente. Porém, do seu entendimento justo e sábio e da sua prática prudente e concreta, depende muito o bem comum e o bem-estar das pessoas, o equilíbrio económico e social e a preservação do ambiente, deixando uma herança saudável e feliz a quem vier depois de nós. Do entendimento da relação com a criação e do seu bom uso, depende a paz, depende o correcto desenvolvimento humano integral e depende o relacionamento justo e solidário entre todos os povos.

Pede-se, de facto, uma solidariedade universal e comunitária no uso dos bens que Deus criou para todos, assente numa economia social. O desenvolvimento não pode ser somente a favor de alguns, normalmente de quem se aproveita, de forma oportunista, interesseira e egoísta, privilegiando o lucro e esquecendo a justiça, a solidariedade – os outros.

São enumeradas muitas pequenas coisas como essenciais e que, se não se fazem e se não se preservam, põem em causa o equilíbrio futuro da humanidade. Entre estas pequenas coisas está a poupança da água e da energia, seja a proveniente do petróleo seja a eléctrica, assim como a separação do lixo e a sua orientação para os lugares indicados. São pequenas coisas que, por vezes, nos são ensinadas pelas próprias crianças; precisamos todos de uma nova mentalidade e cultura que nos façam ser agentes de uma nova educação e prática.

Esta forma cristã, ecológica, responsável e solidária de proteger a natureza pede, de todos nós, um programa de vida sóbria que é, também, uma espiritualidade. Respeitando a natureza, estamos a respeitar e a amar o Criador, estamos a agir de forma responsável e solidária e estamos a ajudar os Países mais pobres, contribuindo para ultrapassarmos um enorme défice relacional entre os mais ricos e os mais pobres.

Pede-nos o Papa que tenhamos em conta que nós, homens e mulheres, somos todos Família da mesma criação e que o homem e a mulher, tendo uma função superior, esta é a de exercermos um governo responsável dessa criação, preservando-a e governando-a. Cada um de nós deve servir a criação que Deus destinou a todos e, ao fazê-lo, estamos a ser irmãos e solidários de todos os outros homens, pois estamos a dizer e a mostrar que o País de qualquer outro é também o meu País.

Tenhamos claro este pensamento: cada pessoa é herdeira dos dons da criação que deve transmitir às gerações futuras. Para isto, deve instaurar-se uma economia social, com políticas sociais mais eficazes, a chegarem verdadeiramente e com rapidez a quem mais precisa. Não é justo que vivendo uma crise tão grave, tão prolongada e com tantas consequências no desemprego, uns não tenham dinheiro para viver e outros tenham dinheiro para esbanjar. Uns não possam viver dignamente e outros não se sintam afectados nas suas extravagâncias. Uns não consigam pagar as suas dívidas e outros acumulem privilégios… Uns não tenham emprego e outros sejam titulares de empregos fictícios a justificarem múltiplas benesses imerecidas.

Em Copenhaga e em tantas outras Cimeiras entre os mais ricos do universo tem faltado a coragem da solidariedade e do sentido dos outros. Tem sobejado egoísmo, corrida ao lucro e até ao armamento, pois um mundo injusto e desigual precisa de estar em permanente guerra preventiva e ofensiva com medo do terrorismo.

Precisamos de construir uma cultura e uma mentalidade de paz e de fraternidade. Todo o homem é meu irmão e todo o País dos meus irmãos é o meu País também. Este deve ser o pensamento a exigir alteração de cultura, de mentalidade e de comportamentos para termos uma vida mais sóbria e mais simples, mais próxima e mais amiga, mais fraterna e mais justa. O estilo de vida que daí nascerá, será também – e sem dúvidas – mais saudável, mais feliz e com mais paz.

É o que, de todo o coração desejo, a vós e a todos os homens e mulheres, nossos irmãos em Jesus que nasceu para nós. Que o Senhor nos abençoe e nos proteja; nos seja favorável e nos conceda a Paz! Feliz 2010!

Santa Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe e Rainha da Paz, rogai por nós! AMEN!…

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Agência ECCLESIA

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