Mensagem de Natal do Bispo do Algarve

Natal solidário, fraterno e aberto à vida

Brotam espontaneamente na maioria das pessoas, nesta quadra natalícia, mesmo entre as não cristãs ou que não professam qualquer religião, sentimentos e atitudes que reflectem o sentido cristão do Natal.

O espírito que caracteriza esta quadra faz emergir os sentimentos mais nobres do ser humano, em relação ao seu semelhante, mobilizadores de iniciativas e gestos altruístas, que exprimem a dimensão solidária e fraterna, que deveria caracterizar habitualmente as relações humanas e a vida em sociedade.

Foi com agrado que acompanhámos também este ano, a participação das comunidades cristãs algarvias, através dos seus movimentos, particularmente o CNE e os Vicentinos, em campanhas de recolha de produtos alimentares, destinados a apoiar os mais carenciados do Algarve.

Para além da disponibilidade do grande número de voluntários de diversas proveniências, destacamos, de modo particular, a adesão e a generosidade de quantos, nesse fim-de-semana, contribuíram para essa recolha. Uma gota de água, é verdade, na resposta à imensidade das necessidades básicas que atingem a humanidade, mas – segundo a Madre Teresa de Calcutá – o oceano seria menor se lhe faltasse essa gota.

A celebração do Natal cristão permite-nos redescobrir, anualmente, a fonte que motiva e dá sentido a este movimento solidário e fraterno: a realização do projecto salvador de Deus que, em seu filho Jesus, quis ser o Emanuel, o “Deus-connosco”, o Deus para nós e em nós. Deus assumiu, em Cristo Jesus, a nossa humanidade. Com Ele tornámo-nos filhos do mesmo Pai; n’Ele tornámo-nos irmãos e sentimo-nos impelidos a fazer do amor fraterno o sinal da nossa identidade e da nossa missão: “nisto todos saberão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35).

Bento XVI, na sua última encíclica, afirma que a verdadeira causa do subdesenvolvimento reside na falta de fraternidade entre os homens e entre os povos. A globalização torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos.

A razão pode levar-nos a estabelecer princípios defensores da igualdade entre os homens, inspiradores de uma convivência cívica entre todos, mas não consegue fundar a fraternidade, cuja origem se situa na vocação transcendente de Deus Pai, que nos amou primeiro, ensinando-nos por meio do Filho o que é a caridade fraterna (cf CV 19).

Ao olharmos para o mundo que nos rodeia, apercebemo-nos quão longo é ainda o caminho que temos de percorrer, para correspondermos à lição que a celebração do Natal nos proporciona.

É importante promover acções, a nível local, que envolvam o maior número de pessoas na resposta ao aumento de necessidades básicas, muitas delas consequência da crise que atravessamos. Mas é ainda mais importante e urgente a acção daqueles que têm o dever e a responsabilidade de encontrar respostas institucionais que eliminem as causas estruturais geradoras das inúmeras carências básicas da humanidade (cf CV 27).

A celebração do Natal é também celebração da família e acolhimento da vida. Foi no seio duma Família de Nazaré que o Menino-Deus assumiu a nossa humanidade: uma Família que viveu de modo anónimo numa terra pequena e desconhecida; provada pela pobreza, pela perseguição e pelo exílio; que viveu totalmente para Deus e para o seu filho. Família que continua a ser referência das famílias cristãs, na fidelidade aos seus compromissos, no amparo perante as tribulações da vida, na generosa abertura às necessidades dos outros.

Hoje assistimos à desvalorização da família institucionalizada com a pretendida equivalência à instituição familiar de relações afectivas não apoiadas na complementaridade dos sexos.

A não discriminação ou marginalização de pessoas, não pode impedir-nos de afirmar e defender que a realidade e a natureza da família radicam na essência mais profunda do ser humano, sendo o seu fundamento antropológico, e não o resultado de meras circunstâncias sócio-temporais.

A verdade da vida humana assenta na complementaridade do homem e da mulher. É esta complementaridade dos sexos, expressa de um modo eminente no dom total e perene do amor entre um homem e uma mulher, por princípio aberto à geração de novas vidas, que constitui a base antropológica da família (cf Nota Cons. Permanente-CEP, Em favor do verdadeiro casamento).

Neste tempo de Natal sentimos o apelo a defender e a reafirmar o direito da família, enquanto instituição fundada no casamento entre um homem e uma mulher, a ver reconhecida a sua identidade única e inconfundível com outras formas de convivência humana. O Natal é também tempo de crescer no acolhimento e na abertura à vida humana.

A abertura à vida está no centro do verdadeiro desenvolvimento, como refere Bento XVI. Quando uma sociedade começa a negar e a suprimir a vida, acaba por deixar de encontrar as motivações e energias necessárias para trabalhar ao serviço do verdadeiro bem do homem.

Se se perde a sensibilidade pessoal e social ao acolhimento duma nova vida, definham também outras formas de acolhimento úteis à vida social. O acolhimento da vida revigora as energias morais e torna-nos capazes de ajuda recíproca (cf CV 28).

A todos vós, meus caros diocesanos e a quantos, não residindo habitualmente no Algarve, aqui passam esta quadra natalícia, desejo um SANTO NATAL, com o convite a que concretizemos em nós e à nossa volta a lição que, mais uma vez, escutamos com a celebração do nascimento de Cristo.

O “Deus-connosco” continua a indicar-nos o caminho da construção duma comunidade humana solidária, fraterna e aberta à vida.

Encontremos espaço para Ele em nós, nos nossos projectos e no mundo em que vivemos.

D. Manuel Neto Quintas, Bispo do Algarve

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top