Bento XVI em Angola

A visita de Bento XVI a Angola terá “um óbvio aproveitamento político”. “Caberá à Igreja ter cuidado na forma como vai conduzir esta questão, mas nos contextos africanos, estes aproveitamentos são sempre muito bem feitos”, expressa o Pe. Tony Neves. O Papa anunciou no passado Domingo uma visita em Março aos Camarões e a Angola. O Núncio Apostólico em Angola, D. Angelo Becio, pediu que não seja feita uma leitura política da viagem que exprime como “apostólica”. No entanto esta ligação “é inevitável” explica à AgÊncia ECCLESIA o Pe. Tony Neves, sacerdote espiritano que conhece e acompanha de perto a realidade angolana. Depois de uma vitória “estrondosa do MPLA nas eleições legislativas, o presidente José Eduardo dos Santos vai querer sancionar a sua posição de presidente com as eleições presidenciais no próximo ano”. A visita do Papa está agendada para 20 a 23 de Março e as eleições presidenciais serão em Agosto ou Setembro. “Haverá um aproveitamento político óbvio por parte de José Eduardo dos Santos e da sua equipa”. Futuro do cristianismo Mas mais que o “aproveitamento político” esta visita é “um prémio para a missão da Igreja e um estímulo para continuar este caminho”. A Igreja africana é reconhecida por todos e “Angola tem muitos mártires, muitas pessoas que foram assassinadas durante a guerra e também por isso deu testemunho até ao fim”. A Igreja trabalhou muito pela pacificação, durante a guerra esteve do lado dos pobres e dos excluídos e das vítimas da guerra e está muito empenhada na reconstrução, explica o sacerdote. Escolher Angola é também ir ao encontro de um país que tem uma elevada percentagem de católicos. Em 2008 o Pe. Tony Neves esteve por duas vezes em Angola. Acompanha e conhece de muito perto a realidade do país. “As igrejas estão cheias de jovens e a abarrotar de crianças. Há um trabalho muito forte de evangelização destas novas gerações”. Este é um sinal de futuro, explica, ao contrário do que se assiste na Europa ou na Austrália, “onde as igrejas são comunidades envelhecidas porque as cidades não têm um número significativo de crianças e jovens, mas também porque estas faixas estão distantes de uma caminhada em igreja”. Em Angola tanto jovens como crianças estão “muito inseridos dos dinamismos eclesiais e continuam a acreditar que a Igreja ajuda a construir a paz, rasga caminhos de futuro e a cimentar valores”. A deslocação de Bento XVI a Angola mostra “que estas igrejas são mais futuro do que as da América ou da Europa”. A última visita de um Papa a Angola aconteceu em 1992, com João Paulo II. O Pe. Tony Neves encontrava-se também no país africano e recorda “um período de paz muito passageiro”. Há 16 anos atrás, “a viagem do Papa foi muito importante para confirmar os cristãos na sua fé e nas suas convicções”. “Faz agora todo o sentido nova confirmação com outro Papa que tem uma maneira diferente de estar com as pessoas, tem um outro olhar sobre o mundo e esta visita será um reforço”. Duas Luandas Ainda sem conhecer o programa da visita de três dias, “atendendo à idade do Papa e às opções em anteriores visitas”, o Pe. Tony Neves acredita que a deslocação se centrará em Luanda. O sacerdote espiritano antevê uma grande celebração capital, encontros com os bispos, sacerdotes, missionários e políticos. “os grandes recados serão a partir de Luanda”. Eventualmente ele poderá deslocar-se ao Huambo e ao Lubango, duas arquidioceses próximas que são sedes metropolitanas e “cidades mártires onde a questão católica é forte. Talvez Bento XVI queira ter um gesto particular com este povo”. O Pe. Tony Neves, se pudesse sugerir o itinerário de visita, apontava os musseques, bairros de lata, como “locais obrigatórios”. Luanda tem “actualmente dois rostos antagónicos”, explica, Luanda colonial e a nova Luanda. “É claramente a Luanda dos ricos”. As estatísticas apontam a capital angolana como a segunda cidade mais cara do mundo e “isso é perceptível nos interesses das multinacionais, bancos, petróleo e diamantes”. Mas existem “quatro milhões de pessoas que vive nos musseques, em casa paupérrimas, sem saneamento básico, com electricidade vinda de fios sem se saber de onde e onde as pessoas vivem com um dólar por dia numa cidade onde tudo é caríssimo”. Os surtos de cólera e de malária frequentes somam-se à onda de “criminalidade e violência normais num contexto de injustiça e de extrema pobreza”. O Pe. Tony assegura que Bento XVI terá de ter “uma presença junto dos pobres e terá de dar palavras de esperança tanto para governantes como para a Igreja, para que a atenção aos excluídos, que são a maioria absoluta de Luanda, seja tomada a sério”.

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