Dia de Portugal: Historiadora Rita Almeida Carvalho acredita que adesão a forças radicais é «ato de protesto»

Programa ECCLESIA dedica emissão do 10 de Junho à análise da realidade e identidade portuguesas, 50 anos depois do 25 de Abril

Lisboa, 10 jun 2024 (Ecclesia) – Rita Almeida Carvalho, historiadora e investigadora, considera que o crescimento da adesão a forças políticas de direita radical não é uma reação “contra a democracia”, mas sim “contra o modo” como está a funcionar.

“Sei que agora os partidos de direita mais radical tiveram uma adesão que nós não esperávamos, mas eu tendo a acreditar, talvez porque sou otimista, que essa adesão tem muito mais a ver com um gesto de protesto, um ato de protesto, do que propriamente uma adesão incondicional ao discurso nacionalista, quase primário, de partidos como o Chega”, afirmou, em entrevista ao Programa ECCLESIA, que é transmitido hoje na RTP 2, a partir das 13h15.

Rita Almeida Carvalho e Timóteo Cavaco, presidente da Direção da Aliança Evangélica Portuguesa, abordaram a realidade e a identidade nacionais, 50 anos depois do 25 de Abril.

A investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa defende que o voto em partidos de extrema-direita se justifica pelos cidadãos “identificarem facilmente situações de corrupção, de nepotismo, favorecimentos, veem que a justiça não funciona ou que tarda em funcionar, e tudo isso são motivos para as pessoas estarem zangadas”.

“Depois também há a questão da participação de uma proximidade da política aos cidadãos que tem que ser levada em consideração, porque as pessoas têm que se sentir mais próximas dos decisores políticos e não tão afastadas como tem sido e como têm sentido até aos nossos dias”, defendeu.

Questionada sobre se identifica pontos semelhantes entre o regime do Estado Novo e algumas reações do presente, Rita Almeida Carvalho diz que “há alguns paralelos”.

“[Mas] eu acho que a memória do Estado Novo, da ditadura, está viva e isso notou-se muito nestas últimas comemorações do cinquentenário e do 25 de abril, com uma participação inusitada, ninguém pensava que houvesse uma adesão tão grande”, assinalou.

Segundo a investigadora esta expressão de participação na celebração do dia da Liberdade “tem um significado”.

“As pessoas estão a comemorar a conquista da liberdade, mas de facto há movimentos políticos que reclamam algum do legado da ditadura”, reconheceu, trazendo à tona o aparecimento de discursos em relação ao estatuto da mulher.

“Começamos a ouvir dizer que o lugar da mulher é em casa, eu acho que isto também advém de uma certa ignorância, porque as pessoas normalmente não sabem que as mulheres não podiam seguir a carreira da magistratura, não podiam ser diplomatas, não podiam casar sem autorização superior, se fossem enfermeiras”, referiu.

A chegada da liberdade a Portugal também representou uma mudança do ponto de vista religioso.

“Eu penso que hoje temos um país e uma sociedade em que a pluralidade religiosa é um facto. No entanto, nós chegámos um pouco tarde enquanto país a esta realidade, a este campeonato”, salienta Timóteo Cavaco, presidente da Direção da Aliança Evangélica Portuguesa.

O responsável fala que a 1ªRepública “não foi o espaço de abertura que muitos pensavam que seria” e que o Estado Novo “não valorizou o papel das minorias religiosas”.

“Tardiamente, já no processo democrático é que nós temos um Estado em que, não só na Constituição, mas como designadamente na Lei da Liberdade Religiosa de 2001, é reconhecida, de facto, que todas as comunidades podem ter presença e participação na sociedade portuguesa”, recordou.

Sobre a celebração do Dia de Portugal e as memórias que a ele são associados, Rita Almeida Carvalho observa que “o 10 de junho hoje está muito ligado com a diáspora portuguesa” e às comunidades de língua portuguesa.

“Eu acho que o 10 de junho, para a maioria das pessoas, ainda tem esta conotação ligada com os descobrimentos e com a expansão portuguesa”, destaca, salientando que este é um legado que ainda está presente” na juventude atual.

“Programas como o Erasmus é fundamental para, de alguma forma, desconstruir essa ideia de Portugal colonialista”, afirmou Rita Almeida Carvalho, que acrescenta que a educação, a cultura, a capacidade de tolerar o outro, de ter um olhar distante relativamente ao passado se adquire com “estudo”, “trabalho” e “reflexão”.

HM/LJ/PR

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Agência ECCLESIA

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