D. Francisco Senra Coelho reafirma que «centro da preocupação é a vítima» e destaca medidas que estão a ser implementadas
Évora, 16 mar 2023 (Ecclesia) – O arcebispo de Évora disse que a Igreja e os seus responsáveis têm “uma dívida de humanização” com as vítimas de abusos sexuais, referindo-se também a eventuais indemnizações, e destacou as medidas que estão a ser implementadas.
“O centro da nossa preocupação é a vítima. Ao ser o centro, entendemos que aquele sofrimento vivido é irreparável, de certo modo. São danos que atingem a profundidade da pessoa. Quando digo que é irreparável, digo que temos uma dívida de humanização à vítima, aos direitos da criança, aos direitos da pessoa humana”, precisou D. Francisco Senra Coelho, em entrevista à Agência ECCLESIA.
Segundo o responsável católico, a questão da indemnização é “um tema que é contornável ou contornado muitas vezes”, por ter “um sentido técnico, específico”, na dimensão jurídica, na qual “a responsabilidade é pessoal”.
“Aquele que foi o agressor deve pagar a indemnização. Imaginemos que não pode pagar: penso que deve ser a Igreja, se for um eclesiástico ou um funcionário seu. Também se pode concluir que a instituição teve responsabilidade, ou seja, foi colocada uma pessoa que já se sabia que tinha o problema, que foi uma reincidência com o conhecimento do bispo, há uma circunstância que podia ter sido evitável, não houve formação, houve uma imaturidade conhecida”, precisou.
O arcebispo de Évora salientou que “há uma outra dimensão”, “metafórica”, que leva a ajudar a pessoa “mesmo que não se tenha de indemnizar”.
“A Igreja assumiu toda a sua dimensão de compromisso com a vítima”, procurando apoiar “a todos os níveis: psicológico, psiquiátrico, acompanhamento espiritual, a dimensão moral da pessoa”.
Todos os bispos estão disponíveis para receber pessoalmente e conversar com as vítimas, e ao mesmo sentimos a necessidade de apoiar e ajudar as pessoas que percebem que fizeram sofrer muito os outros: os agressores têm de ter o seu acompanhamento próprio. Porventura não tivemos sempre uma linguagem feliz na comunicação, mas estes conteúdos estão assumidos há muito tempo, desde o princípio”.
A Arquidiocese de Évora está a trabalhar num “compromisso” para definir “procedimentos de acolhimento, de formação, de acompanhamento, de prevenção” e a comissão para a proteção de menores já foi remodelada, seguindo as recentes indicações da Conferência Episcopal, de forma a ser constituída apenas por leigos, especialistas em várias áreas.
Juntamente com as dioceses do Sul, Algarve e Beja, além de Setúbal, D. Francisco Senra Coelho manifestou a intenção de que esse manual de procedimentos seja “compartilhado”, além de promover estudos conjuntos, para “analisar os níveis de clericalismo, de abusos de poder”.
O responsável lembrou que há “um seminário em comum”, pelo que podem “refletir sobre a formação dos futuros padres”, em conjunto com o Instituto Superior de Teologia de Évora, percebendo “até que ponto é necessário rever o currículo”, a nível da formação filosófica, teológica, e antropológica, acompanhamento e formação permanente dos sacerdotes, a formação do diaconado permanente e a formação teológica dos leigos.
A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja (CI) em Portugal apresentou um relatório no qual validou 512 testemunhos, apontando a um número de 4815 vítimas, entre 1950 e 2022, e entregou aos responsáveis católicos de Portugal uma lista com nomes de alegados abusadores, no dia 3 de março.
Em Évora, a CI identificou dois alegados abusadores, um dos quais falecido, tendo procedido a um afastamento cautelar.
O Vaticano disponibiliza desde 2020 um “vade-mécum” para ajudar os bispos e responsáveis de institutos religiosos no tratamento de denúncias de abusos sexuais de menores.
CB/OC