Comissão Independente, criada por iniciativa da Conferência Episcopal, promove colóquio em Lisboa
Lisboa, 10 mai 2022 (Ecclesia) – Pedro Strecht, coordenador da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja Católica em Portugal, disse hoje que é preciso encontrar possibilidades de “abertura e discussão do tema”, na Igreja e na sociedade.
“A bom tempo, quis a Conferência Episcopal Portuguesa [CEP] abrir os seus e os nossos olhos para este problema que é tanto da Igreja como ainda, muito mais, da própria sociedade civil, onde , por exemplo, no primeiro semestre de 2021, a Polícia Judiciária registou um número recorde de processos por abuso sexual de crianças, mais de 1300”, alertou o pedopsiquiatra, na abertura do colóquio sobre ‘Abuso sexual de crianças: Conhecer o passado, cuidar do futuro’, que decorre na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
O responsável sublinhou que a comissão quer levar a cabo um estudo que “torne claro o problema” no seio da Igreja Católica, para se promova o seu conhecimento e a razão destes casos, falando num “longo e difícil trabalho” que deve levar à “paz e à reconciliação”.
O encontro desta terça-feira foi apresentado como um “marco iniciático” de um processo que quer ajudar “conhecer o passado e abraçar o futuro”, dando a milhares de crianças e adolescentes que foram vítimas destes crimes “uma nova e renovada esperança quanto ao seu próprio sentido de vida”.
Pedro Strecht destacou a importância, para as vítimas, de uma integração psíquica “de tudo quanto sofreram e que nunca, nunca, o tempo apagará e nada nem ninguém conseguirá reparar em definitivo”.
O especialista aludiu a “crianças com vida suspensa”, marcadas por uma “dor aprisionada” e por sentimentos de “medo, vergonha e culpa”.
A intervenção inaugural do colóquio apresentou uma reflexão sobre o impacto de situações “de trauma” durante a infância e na adolescência, “a começar na fragilidade da autoimagem psíquica e corporal, prosseguindo nas dificuldades na relação com os outros”.
O coordenador da Comissão Independente criada por iniciativa da CEP destacou que hoje se pode contar com pais mais atentos e uma Justiça que “protege melhor os mais pequenos”, ainda que nem sempre “da forma mais rápida”.
“A realidade é mesmo outra, em 2022, nova e, sabemo-lo bem, assim vai ser cada vez mais, de forma rápida e diferente. Por isso, todos temos de evoluir, em conceitos individuais e sociais de bem-estar e felicidade”, acrescentou.
Ana Nunes de Almeida, socióloga e investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que integra a comissão, afirmou que “todos os testemunhos contam”.
Até à noite de segunda-feira, acrescentou, foram recolhidos 326 testemunhos, destacando a importância de “conhecer a realidade”, na sua complexidade, para evitar “julgamentos apressados”.
“Façamos desta causa uma causa civilizacional”, apelou.
«Trauma e impacto no desenvolvimento psicossocial»; «Abuso de menores: Conhecer para prevenir e intervir»; «Os Direitos da Criança: A Criança e o Direito» e «O trabalho da comissão independente» são temas em debate neste encontro.
O colóquio conta com preleções da psicóloga Isabel Soares; o padre Anselmo Borges; o jornalista João Francisco Gomes; Álvaro Laborinho Lúcio, antigo ministro da Justiça; e do presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa.
Isabel Soares assinalou, na sua conferência desta manhã, que o abuso provoca danos psicológicos comportamentais e fisicos “muito significativos” que tendem a perdurar ao longo da vida, num verdadeiro “trauma”.
A última intervenção está a cargo do padre jesuíta Hans Zollner (16h30-17h30), membro da Comissão Pontifícia para a Tutela de Menores (Santa Sé), que esteve em Portugal a orientar formação para dioceses católicas, em 2021.
LS/LFS/OC