«O Túmulo de Jesus»

Alegada «decoberta» da sepultura de Cristo retoma polémicas (muito) antigas sobre a relação com Madalena e a ressurreição Depois da grande “revelação” sobre a vida de Jesus, trazida por Dan Brown no seu “Código da Vinci”, é agora a vez dos realizadores James Cameron e Simcha Jacobovici apresentarem um documentário com novas “revelações”: Jesus não ressuscitou, mas está sepultado em Jerusalém, com a família, incluindo o filho que teve com Maria Madalena. A produção aproveita a onda mediática produzida pelo sucesso de Dan Brown – embora as novas teorias entrem em contradição com várias das suas teses. O documentário produzido pelo realizador de Titanic, James Cameron e realizado pelo judeu canadiano Simcha Jacobovici, estreia esta semana no Discovery Channel. “O Túmulo Perdido de Jesus” parte da análises de dez ossários encontrados em 1980, no Bairro de Talpiot, em Jerusalém, e que presentemente estão entregues à Autoridade de Antiguidades de Israel e guardados num armazém em Bet Shemesh. Os arqueólogos que estudaram as peças chegaram à conclusão, em 2003, de que o sarcófago data do século I d.C. No entanto, conteúdo, caligrafia e revestimento da inscrição tornam a sua autenticidade duvidosa. Além disso, salientam que os nomes nas inscrições eram muito comuns na altura. “A afirmação de que o túmulo (de Jesus) foi encontrado não está apoiada em nenhuma prova e é somente uma manobra publicitária”, afirma o professor Amos Kloner, da Universidade Bar-Ilan e arqueólogo oficial do Distrito de Jerusalém, que fiscalizou as escavações do mesmo local em 1980. “É muito pouco provável que Jesus e seus parentes tivessem um túmulo familiar “, explicou Kloner. “Eles eram uma família da Galileia sem vínculos em Jerusalém. O túmulo de Talpiot pertenceu a uma família de classe média do primeiro século de nossa era”, defende. “É uma óptima história para um filme, mas é impossível. É um disparate»”, disse ao jornal Jerusalem Post. Madalena, outra vez O exegeta português Joaquim Carreira das Neves lamenta que, de forma subconsciente, teorias como o casamento entre Jesus e a Madalena estejam a ser tomadas como um dado adquirido por muitas pessoas, “inclusive católicos”. A relação entre Jesus e Maria Madalena tem sido um assunto debatido quando se lança a questão sobre se Jesus era solteiro. Alguns dos escritos Gnósticos têm sido usados para sustentar a tese de que Maria Madalena seria a esposa de Jesus. Além do mais, alguns alegam que Jesus pretendia que ela fosse a chefe da sua Igreja. A evidência para estas alegações supostamente reside nalgumas passagens dos escritos Gnósticos que demonstram uma proximidade entre Jesus e Maria Madalena e alguma hostilidade em relação a ela por parte de São Pedro e Santo André. Mas essas passagens não declaram, de facto, que Maria Madalena e Jesus eram casados, nem que Ele pretenderia que ela fosse a cabeça da sua Igreja. No Novo Testamento, Maria Madalena é uma discípula proeminente de Cristo. Ela é uma das mulheres descritas como acompanhando Jesus na sua missão terrena depois de Ele ter expulso dela sete demónios. (Mc.16:9, Lc.8:1-3). Os quatro Evangelhos referem-se a Maria Madalena como estando presente no Calvário quando Jesus foi crucificado e presente no seu túmulo estando entre as primeiras a testemunhar a ressurreição. No Evangelho de S. João, ela é referida como a primeira pessoa a encontrar-se com o ressuscitado. A ressurreição Joaquim Carreira das Neves lembra que, a este respeito, não há “provas históricas, mas provas humanas”, a primeira das quais, em perspectiva cronológica, descrita na primeira Carta aos Coríntios, em que São Paulo apresenta a ressurreição de Jesus como o acto fundador do Cristianismo. O Pe. Carreira das Neves sublinha que, para os católicos, este é um dado de fé fundamental. A narrativa de Paulo, contudo, não apresenta provas históricas da ressurreição: quem é que viu Jesus a ressuscitar? Em que dia e hora? Em que forma? Apenas apresenta o facto em si, através de provas de testemunho de fé existencial. “Todas as narrativas da ressurreição são narrativas catequéticas, apresentam o dado da fé: pessoas que não acreditavam e que começaram a acreditar”, refere Joaquim Carreira das Neves. Na Carta aos Coríntios, por exemplo, não há sequer referência à modalidade da sepultura de Jesus. O túmulo vazio de que falam as narrativas evangélicas “é um sinal”, refere o especialista em Sagrada Escritura. Os Evangelhos Sinópticos descrevem a ida das mulheres ao túmulo, na manhã de Domingo, algo que o Pe. Carreira das Neves considera “normal”, dado que seria uma grande desonra que o corpo se corrompesse antes de ser perfumado. “O que não era normal é que as mulheres andassem com ele desde a Galileia até Jerusalém”, conclui, lembrando que os rabinos e os filósofos gregos da altura não se faziam acompanhar por mulheres.

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