Padres para quê?

Arcebispo de Braga antecipa Simpósio do Clero, em Fátima Há interrogações que podem ter diferentes interpretações conforme a pessoa que as formula. Temos aqui um exemplo característico: Para os indiferentes ou não crentes a resposta torna- se evidente no sentido de inutilidade ou não razão de existência. Reconhece-se um determinado estatuto e imediatamente, talvez dum modo inconsciente, é-lhe atribuído um epíteto de algo ultrapassado que poderá ter tido importância mas que hoje deve ser marginalizado, desconsiderado ou “destruído”. Para os cristãos a pergunta evidencia vontade de conhecer os conteúdos da vocação sacerdotal para lhe dar a importância que merecem na Igreja e, talvez, na sociedade. Quero colocar o leitor nesta categoria de pessoa e gostaria de responder com duas afirmações: 1 – O padre é imprescindível uma vez que a salvação oferecida por Cristo será sempre por mediadores escolhidos pelo próprio Deus. Trata- se duma vocação – dom de Deus – e, como tal, terá de ser interpretada. A esta vocação, a garantir uma permanente actualidade, está a alegria de serem humanos a mostrarem a validade deste dom como algo muito concreto que Deus quer continuar a oferecer à humanidade. O dom acolhe-se e não se questiona. Nem sempre se compreende o que encerra. Só lentamente, num projecto de caminho, se verifica a maravilha e beleza de ter sido escolhido. 2 – Inquestionável a razão de ser, é imperioso caminhar na fidelidade aos compromissos assumidos para que o padre reconheça a validade da sua vida e o manifeste a quantos com ele realizam a experiência de fé neste Deus amor. Daí que, em primeiro lugar, a verdadeira razão da vida do sacerdote esteja no modo como ele encara a sua identidade e missão. Só a alegria de acolher o dom para o oferecer, torna a vida sacerdotal uma permanente resposta para o próprio e uma vontade de acolher a sua missão em favor daqueles a quem, em nome de Cristo, se entrega. Dito duma maneira mais simples e mais eloquente: só o sacerdote é capaz de “mostrar” para que vive. Mais ninguém consegue afirmar para que serve o padre numa sociedade indiferente e materialista. 3 – Destas duas afirmações ouso extrair duas interpelações de extrema urgência e constante responsabilidade. 3.1 – Ser sinal duma intimidade com o transcendente. Assim como um sinaleiro aponta caminhos quando os conhece, o sacerdote sublinha a perenidade do Amor de Deus quando manifesta competência nesta arte de caminhar, apontando, talvez no silêncio, um percurso para esta resposta à intranquilidade do mundo moderno. Sem vaidade ou orgulho, temos o que falta a quem peregrina connosco. Na saciedade dos discursos, vale o testemunho duma vida alicerçada em Deus e que O manifesta em tudo quanto faz. 3.2 – Perito na divindade, experimenta-a como comunhão e acredita que o mundo se salva na unidade. Daí que a sua vida, podendo ser meramente contemplativa, se destina a edificar uma comunidade onde a igualdade de filhos de Deus progride na diversidade de funções. Ele é animador duma comunidade, destruindo as indiferenças ou inimizades e unindo os corações da família de Deus a quem compete a missão, não do senhorio do mundo, mas do serviço numa articulação de carismas. Anima a comunidade quando serve e serve quando suscita responsabilidades na promoção e formação duma Igreja Povo de Deus. Padre para quê? Manifestar Deus na vida e na palavra e edificar a Igreja como comunidade de responsáveis. Reconheço que, nesta síntese, pode estar um discurso enigmático. Acredito, porém, que o sacerdote terá de descodificar a mensagem que a sua vida encerra. No meio da humanidade, homem entre os homens, indica que há alternativas de felicidade permanente e sabe que o caminho da Cruz – abraçada nas dores pessoais e nos dramas dos seus contemporâneos – termina, permanentemente, na felicidade duma Ressurreição como vida autêntica e verdadeira. Se alguns não compreenderão, muitos questionar-se-ão e sentirão em disponibilizar-se para esta aventura de entrega à humanidade fazendo com que se encontre e adira ao projecto de Cristo. D. Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz de Braga

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