Darwin e o Génesis: regresso ao passado?

Papa promove debate em Castel Gandolfo O anunciado encontro de Bento XVI com os seus antigos estudantes de Teologia em Castel Gandolfo, para discutir questões relativas à evolução darwinista e à Criação tem gerado um crescente interesse, com várias teorias a serem atiradas ao público. Darwin e a Igreja têm encontro marcado entre 1 e 3 de Setembro, num colóquio à porta fechada. Os antigos alunos de doutoramento de Joseph Ratzinger reúnem-se, mais uma vez, em volta do seu mestre e personalidades como o presidente da Oesterreichichen Akademie der Wissenschaften, Herbert Mang, o jesuíta Paul Elbrichk, professor de filosofia em Munique, ou o filósofo Robert Spaemann. Um dos mais destacados participantes é o Cardeal Christoph Schoenborn, voz activa no debate em curso há vários meses sobre o assunto. O Arcebispo de Viena criticou duramente, no ano passado, “o evolucionismo no sentido do neo-darwinismo – um processo não planeado, sem guia e de selecção natural” num artigo escrito para o New York Times. Mais recentemente, em entrevista à Rádio Vaticano, o Cardeal austríaco disse que “se tudo for fortuito, a vida não tem sentido”, precisando que “nem todas as explicações da evolução, do devir do mundo, da vida ou do homem são compatíveis com a fé”. A Teoria da Evolução foi evocada várias vezes pelo Papa, desde o início do seu Pontificado. Na própria Missa de início de Ministério, a 24 de Abril de 2005, Bento XVI afirmou na homilia que “nós não somos o produto casual e sem sentido da evolução”, explicando que cada um “é o fruto de um pensamento de Deus”. Mais recentemente, a 6 de Abril de 2006, num encontro com os jovens da Diocese de Roma, o Papa explicou que “a grande opção do Cristianismo é a opção pela racionalidade e pela prioridade da razão”, “que nos mostra como por trás de tudo haja uma grande Inteligência, na qual podemos confiar”. Nesse discurso rejeitou uma outra opção possível, pela qual “se defende a prioridade do irracional, segundo o qual tudo o que acontece na nossa terra e na nossa vida seria apenas ocasional, marginal, um produto irracional a razão seria um produto da irracionalidade”. Na Vigília Pascal, a 15 de Abril, o Papa falou da ressurreição de Cristo utilizando “por uma vez a linguagem da teoria da evolução” como “a maior «mutação», em absoluto o salto mais decisivo para uma dimensão totalmente nova”. Regresso ao passado? Esta semana, o jornal britânico “The Guardian” assegurava que o Papa iria “adoptar” a teoria do “desenho inteligente”, muito popular em várias Igrejas Evangélicas e com uma importância crescente nos EUA. Desde logo, ouviram-se críticas a insinuar que esta teoria não é mais do que um disfarce para o Criacionismo e um substituto para a leitura literal do Génesis, segundo o qual Deus criou o mundo em 7 dias. A verdade é que a Igreja Católica, com o avanço da exegese bíblica, tem hoje uma leitura da Bíblia muito diferente da que oferecem algumas Igrejas Cristãs, não vendo nos dois relatos da Criação no Génesis (apenas um deles faz referência aos famosos 7 dias) uma explicação científica para a origem do universo. Segundo a fé cristã, a Criação é o acto pelo qual Deus, do nada, deu e mantém a existência de tudo quanto existe; esse início foi coincidente com o início do tempo. Quanto ao aparecimento sucessivo dos diversos seres vivos cada vez mais complexos, a Igreja está hoje aberta a uma explicação baseada numa evolução comandada por leis naturais estabelecidas pelo Criador desde o início. Em Janeiro deste ano, o jornal do Vaticano, “L’Osservatore Romano”, apresentava um artigo de Fiorenzo Facchini, em que se explicava que a posição da Igreja Católica aponta que a emergência do ser humano supõe um acto de Deus e que a vertente espiritual do homem não pode ser vista como um mero produto do processo da evolução natural. “O projecto divino da criação pode ser levado a cabo através de causas secundárias no curso natural dos acontecimentos, sem que seja necessário pensar em intervenções miraculosas que apontem numa ou noutra direcção”, lia-se no artigo do L’Osservatore Romano. “Se o modelo de Darwin parecer inadequado, deve procurar-se outro”, acrescentava. Como referia o Cardeal Schoenborn, “a realidade é mais ampla do que as causas materiais: devemos distinguir, portanto, entre a teoria científica da evolução e a ideologia do evolucionismo, que quer explicar tudo com causas materiais”. Isto e muito mais estará em cima da mesa a partir de amanhã, em Castel Gandolfo. O Papa, por isso, não pensará “adoptar” teorias, admitindo-se, contudo, que os teólogos discutam que explicações são mais coerentes com a doutrina católica.

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