Dois olhares para o acontecimento que marcou o país: Alfreda Fonseca, da geração da revolução de há 50 anos, e Carlos Figueira, que nasceu 20 anos depois
Lisboa, 22 abr 2024 (Ecclesia) – Alfreda Fonseca, professora, e Carlos Figueira, da ‘Economia de Francisco – Portugal’, têm quase 40 anos de diferença e partilham diferentes olhares sobre a Revolução de Abril de 1974.
Há 50 anos, Alfreda Fonseca atingia a maioridade e lembra a Revolução dos Cravos como “um momento muito importante” na sua vida e na vida do país.
“Finalmente, podia-se dizer o que se quisesse, podia-se reunir à vontade com os amigos, podia-se pensar que a Guerra Colonial ia acabar e eu acho que isso era uma das questões fundamentais”, afirma.
A professora destaca que a juventude era “muito sensível” à questão da guerra, uma vez que era um ponto que “atravessava a sociedade portuguesa”, “não dependia de classes sociais” e sim da “vontade política e da incapacidade que o regime anterior teve em descolonizar”.
“O programa do Movimento das Forças Armadas implicava que houvesse democracia, houvesse desenvolvimento, houvesse os 3Ds, a descolonização. E isso parece-me que era o ponto comum das diferentes tendências, das tendências mais conservadoras ou menos conservadoras, mais progressistas, menos progressistas. Isso era um ponto importante que toda a gente achava que devia ser resolvido. Claro que depois achavam de maneiras diferentes”, recorda.
Por outro lado, Carlos Figueira já nasceu em liberdade, 20 anos depois da Revolução de Abril, que ditou o fim da ditadura, conhecendo o marco da história de Portugal através dos livros, dos filmes, documentários e dos testemunhos familiares.
De facto, eu tive familiares que tiveram de emigrar porque não queriam ir para a guerra. Eu lembro-me de um dos meus avós contar que com 14 anos teve que emigrar para evitar ir para a guerra, e, portanto, isso são coisas que, e se calhar até nos dias de hoje, em que temos aqui um contexto internacional geopolítico bastante tenso, temos visto nos últimos tempos o que tem acontecido, também nos faz compreender melhor o que as pessoas viviam naquela altura”
Alfreda Fonseca recorda o compromisso de muitos católicos e a mobilização que aconteceu em torno da condenação da permanência da guerra colonial.
“Houve católicos que estiveram na génese daquilo que foi uma consciência coletiva de que os Direitos Humanos são para se respeitar. E entre os Direitos Humanos há o direito a poder falar livremente, a poder contestar a guerra, a poder lutar pela paz e isso vinha na senda daquilo que tinha sido o Concílio Vaticano II, daquilo que tinha sido a instauração do Dia Mundial da Paz, por Paulo VI, sempre com as mensagens de paz, as vigílias que se fizeram de minorias católicas, é um facto, mas que tiveram o seu papel de despertar os outros católicos”, afirma.
A professora revela que passou a infância e a adolescência nos escuteiros e que foi através desta experiência, “com a noção de serviço” e de movimento da Igreja, que foi fazendo a descoberta de fé, de atenção ao país, e de perceber que o grande problema é que “a injustiça e a pobreza” eram “gritantes”.
“Quando era muito pequenina, lembro-me que os caseiros da minha bisavó tinham uma casa cujo chão era de terra. Só os quartos eram assoalhadas”, recorda.
Sobre as novas forma de ditadura, Carlos Figueira considera que “conhecer o passado” e a história “é fundamental para o futuro e para o presente”.
“Acho que é informativo e permite-nos, se calhar, não cometer erros que já cometemos no passado. E acho que é fundamental, até atendendo a tudo o que se vive neste momento no mundo, a polarização que se vive, o crescimento de alguns populismos. E, olhando no mundo, ainda existem ditaduras, em algumas partes do mundo”, realça.
Segundo o jovem, “há diferentes ditaduras no mundo hoje. Há diferentes formas de oprimir, de retirar liberdades” e isso varia um “pouco por todo o mundo”.
“A Economia de Francisco é um movimento global e, portanto, temos pessoas de várias realidades. E, de facto, há pessoas em diversas partes do mundo onde, se calhar, também a paz não é uma realidade. E nós sabemos isso hoje, até na Europa. E o conflito agora também do Médio Oriente. Temos a guerra na Ucrânia e a paz, cada vez mais, está a ser posta à prova”, sublinha.
A conversa com Alfreda Fonseca e Carlos Figueira, no âmbito do 25 de Abril, foi esta segunda-feira transmitida no Programa ECCLESIA, na RTP2.
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