2012: Portugal perto do «não retorno»

Lisboa, 29 dez 2011 (Ecclesia) – O próximo ano pode ser marcado em Portugal pela chegada ao “ponto de não retorno”, afirmou José Dias da Silva, especialista em Doutrina Social da Igreja, admitindo que a situação se tornaria “incontrolável”.

“Se nunca foi fácil fazer futurologia, muito menos o é para os próximos tempos, pois todos os cenários são possíveis. Há aspetos que temos garantidos: mais fome, mais famílias ‘falidas’, mais desempregados, numa palavra, mais sofrimento”, refere, em texto publicado no semanário Agência ECCLESIA, perspetivando 2012.

O membro da Comissão Diocesana Justiça e Paz assinala que as manifestações pacíficas “irão acontecer e multiplicar-se”, mas aponta para um “cenário mais negro”, que depende de algumas condições para se concretizar.

“À primeira chamaria o ‘índice de sacrifício’ e nada melhor que dar um exemplo para o tornar inteligível. Suponhamos que há um corte de 10% nos salários. Isto significa que quem ganha 800 euros sofre um corte de 80 euros; quem ganha 4000, terá uma redução de 400 euros. É evidente para todos que os 80 euros fazem muito mais falta”, explica.

Para José Dias da Silva, “este desequilíbrio pode adquirir um peso tal que mobilize mesmo os mais indecisos”.

O especialista, que integrou a Comissão Nacional Justiça e Paz no último triénio, aponta uma segunda condição, que apresenta como o “mínimo vital”, isto é, “o mínimo necessário para que cada pessoa possa viver com dignidade”.

“Sem ele as pessoas são capazes de tudo, como nos mostram os balseiros, os boat people ou os magrebinos. É tal o seu desespero que se lançam numa aventura suicida pois sabem que correm enormes riscos de morrer, mas preferem morrer a lutar por uma vida digna do que morrer em casa de braços cruzados, minados pela angústia e a desesperança”, exemplifica.

Um terceiro fator apontado no texto é a “governação adequada”, destacando que “os cidadãos têm de ser convencidos de que as medidas tomadas respeitam, razoavelmente, o critério da justiça e da equidade”.

“Os governantes não podem dar razões objetivas que justifiquem slogans como ‘são sempre os mesmos a pagar a crise’. Não podem cair na imoralidade de olhar só os números e esquecer as pessoas que estão por detrás: a obsessão dos défices tem de ser substituída pela obsessão das pessoas”, assinala José Dias da Silva.

Assinalando que os “tumultos sociais” não são “um meio eficaz” para resolver problemas, este responsável escreve, no entanto, que “é muito difícil imaginar o que poderá fazer um povo de brandos costumes”.

“Temos de nos confrontar com esta pergunta-chave: são os tempos que são maus ou somos nós que não estamos à altura dos acontecimentos?”, conclui.

OC

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Agência ECCLESIA

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