150 milhões de exemplares

A Bíblia de João Ferreira Annes d’Almeida é objecto de uma tese de doutoramento A Bíblia de João Ferreira Annes d’Almeida, a obra mais editada até hoje em língua portuguesa, foi objecto da tese de doutoramento de Frei Herculano Alves, franciscano capuchinho, lançada ontem (7 de Fevereiro) na Universidade Católica Portuguesa (UCP). Em declarações ao Programa ECCLESIA, Frei Herculano Alves, referiu que – através das edições consultadas – a obra tem “150 milhões de exemplares”. João Ferreira Annes d’Almeida foi o primeiro tradutor da Bíblia em português e, como esta foi escrita no Extremo Oriente, “apaixona”. Realizada no século XVII, a sua obra foi “escrita para os portugueses”. Para ele, os portugueses “eram aqueles que falavam a língua portuguesa” – realça o autor. Almeida, um calvinista português do séc. XVII, nasceu em Mangualde em 1628 e faleceu em Batávia em 1691. O labor da sua tradução para a língua portuguesa foi enorme; através das suas investigações, Frei Herculano salienta que “esta Bíblia teve imensos problemas em ser publicada” porque “o tradutor vivia numa ambiente hostil”. “Era padre protestante e português” – disse. Frei Herculano Alves, um franciscano capuchinho e Professor de Sagrada Escritura na Universidade Católica do Porto, optou pela vida e obra de um protestante para tema da sua tese por três motivos: “os Franciscanos Capuchinhos em Portugal, desde 1955, dedicam-se ao apostolado bíblico através da Difusora Bíblica e da revista Bíblica, em Cursos e Retiros e nas Semanas Bíblicas Nacionais; têm trabalhado ecumenicamente com a Sociedade Bíblica, que em Portugal sempre editou a Bíblia de Almeida; e porque a Bíblia de Almeida é «o primeiro projecto organizado para uma tradução da Bíblia em língua portuguesa».” 900 páginas de reflexão Ao longo de 900 páginas, densas em dados históricos, análise crítica e reflexão teológica, o autor desenvolve o seu estudo em 5 capítulos: I. Recensão Crítica das “Fontes” da Bíblia de João Ferreira d’Almeida (pp. 17-74); II. Notas para uma Biografia de João Ferreira d’Almeida (pp.75-170); III. Contexto Histórico, Cultural e Religioso da Bíblia de João Ferreira d’Almeida (pp. 171-256); IV. João Ferreira de Almeida, Tradutor da Bíblia (pp. 257-448); V. Fontes do Texto Português da Bíblia de Almeida (pp. 449-534). Depois de um Apêndice com as Datas Importantes da Vida e Obra de Almeida (519-526), de uma Conclusão Geral (pp. 527-534) e da Bibliografia Fundamental (535-552), a obra inclui ainda dois Apêndices importantes: Fontes Holandesas (pp. 555-672) e Catálogo das Obras Bíblicas de João Ferreira Annes d’Almeida (pp. 675-889). O autor contabiliza 1.796 edições e mais de 11 milhões de exemplares editados da obra bíblica de Almeida, concretizando assim o número das edições e dos respectivos exemplares de cada obra: Bíblia Completa, 8.69 e 43.524.547; Antigo Testamento, 130 e 1.193.000; Novo Testamento, 369 e 15.835.900; Evangelhos (Mt, Mc, Lc e Jo), 321 e 44.599.000; Evangelhos e Actos, 38 e 2.380.194; Cartas de Paulo, 27 e 2.700.000; Cartas Católicas e Apocalipse, 24 e 585.000; Outras edições, 18 e 900.000. E acrescenta: «É certo que foram editados muitos mais exemplares, como propalam sobretudo as editoras brasileiras de Almeida. Estes foram aqueles a que tivemos acesso directo ou indirecto. […] Se tivéssemos em conta os números que as editoras referem na generalidade – sem nos apresentarem a que edição se referem – o número seria, pelo menos, de 2.000 edições e de 150.000.000 de exemplares impressos. E confesso que, pelos cálculos feitos, este número não deve ser nada exagerado» (pp.890-891). Para fazer este trabalho, Herculano Alves deslocou-se às principais Bibliotecas da Europa, do Brasil e dos Estados Unidos: Bibliotecas Nacionais de Lisboa, Madrid, Copenhaga, Haia e Paris; Biblioteca de Leiden, British Library, Bodleian de Oxford, Biblioteca da Universidade de Cambridge e Biblioteca de Salamanca; várias do Rio de Janeiro e S. Paulo, e as de Nova Iorque, Washington e Boston. Das suas investigações, Frei Herculano Alves conclui que “não sabemos o que este homem escreveu” e “como escreveu”. Todos os seus escritos “tinham de passar pelo crivo e supervisão dos holandeses” – afirmou ao ECCLESIA. Este trabalho deixou “admirados muitos protestantes” e “deixou-me apaixonado pela densidade”. O orientador da tese de doutoramento, Sánchez Caro, sublinhou que esta tradução foi “um acontecimento para a cultura portuguesa e para as igrejas de Portugal”. E concluiu: “um factor muito importante da memória cristã de Portugal”. Observações Diga-se, entretanto, que «faltam à tradução de Almeida o últimos versículos do capítulo 48 de Ezequiel, o Profeta Daniel e os Profetas Menores, para alem dos Dêutero-canónicos, que não são admitidos como inspirados pelos Reformadores» (p. 12-nota). Além disso, a sua tradução foi adulterada, desde os primeiros revisores até hoje. Daí a 11ª das Conclusões gerais do autor: «Observação necessária a uma Bíblia traduzida há mais de três séculos, e que continua a ser publicada aos milhões sobretudo no Brasil é o facto, normal, aliás, de ter sido de tal modo transformada, que o original de Almeida quase não se identifica com as edições actuais, todas elas atribuídas a ele. Além dos avatares normais de uma obra como esta, que sofreu necessárias revisões e correcções ao longo de todo este tempo, sabemos também que esta Bíblia, ainda durante a vida de Almeida, foi vítima de “maus-tratos”, por parte dos revisores holandeses. Depois de todas as revisões e correcções e, na falta de encontrar o seu manuscrito, ficamos sem saber onde encontrar o texto legítimo de Almeida, pois possuímos apenas o “Almeida corrigido” muitas vezes. Este facto inegável leva-nos a questionar, se não a legitimidade, pelo menos a oportunidade de continuar a editar um texto que tem uma história inigualável, mas que julgamos ter chegado ao fim. Explicamos: Se não sabemos, hoje, o que resta do texto legítimo de Almeida – depois de tantas revisões e adaptações – não será altura de as editoras que tradicionalmente o editam procurarem outro texto? Isto não desdiz nada da importância que teve a sua tradução e a sua pessoa» (pp. 532-533).

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