Eutanásia: Sem ‘critérios bem definidos’ poderemos entrar em ‘terreno pantanoso’

Especialista holandês Theo A. Boer participou num colóquio sobre esta temática na Universidade Católica Portuguesa em Lisboa

Lisboa, 23 abr 2018 (Ecclesia) – O professor Theo A. Boer, que integrou a Comissão de Supervisão da Lei sobre a Eutanásia na Holanda, destacou hoje na Universidade Católica Portuguesa em Lisboa a importância do debate sobre esta questão obedecer a ‘critérios bem definidos’, e de se olhar para esta pratica não como ‘solução’ mas como ‘último recurso’.

Em declarações à Agência Ecclesia, aquele responsável alertou para a ‘ambiguidade’ que tem marcado a aplicação da lei no seu país, onde o número de pessoas a pedirem a ‘morte assistida’ tem ‘aumentado significativamente’, sobretudo a partir de 2005, e por razões muito mais diversas do que estava estabelecido.

Sem uma legislação bem cuidado, a aplicação da eutanásia pode tornar-se um ‘terreno pantanoso’, frisou.

O especialista holandês, que reviu mais de 4 mil casos de pessoas que solicitaram a eutanásia, e dos médicos que a colocaram em prática, foi um dos participantes no colóquio “A Eutanásia e a Cultura do Cuidado”, promovido esta segunda-feira pela UCP.

O especialista em Ética nos Cuidados de Saúde, pela Universidade Kampen, levou ao debate uma conferência intitulada “Eutanásia e o paradoxo da morte assistida” e explanou a forma como a questão tem sido abordada no seu país.

‘Chegou-se a um ponto em que a eutanásia é vista como solução para todos os problemas’, salientou.

Recorde-se que a Holanda foi o primeiro país europeu a legalizar e regulamentar a prática da eutanásia, em 2002.

De cerca de 2 mil casos no início do século XXI, o número de pedidos de eutanásia naquele país passou para cerca de 7 a 8 mil casos em pouco mais de 10 anos.

Para além de situações de doença terminal, como o cancro ou o vírus HIV, a eutanásia começou a ser utilizada, de acordo com Theo A. Boer, para situações de pessoas com ‘distúrbios psiquiátricos, demência, doenças cardiovasculares’, e mesmo pacientes com doenças associadas a situações de ‘solidão’.

Pessoas que poderiam ter vivido entre ‘mais dois a sete anos’ escolheram terminar a vida antes disso.

Outro ponto marcante da sua análise relacionou a legalização da eutanásia com os seus efeitos em termos da taxa de suicídios na Holanda.

Através dos dados recolhidos, o professor holandês mostrou que apesar da legalização da eutanásia, o número de suicídios ‘não decresceu’, antes ‘aumentou’ em certo período de tempo.

Tendo todas estas circunstâncias em mente, aquele especialista disse à Agência Ecclesia que ‘recomendaria a Portugal não legalizar a eutanásia, e apostar isso sim na implementação de cuidados paliativos mais adequados e acessíveis a todos’.

Atualmente a legislação holandesa considera como crime tirar a vida a alguém a pedido da própria pessoa, mas isenta de qualquer sanção um procedimento médico que cumpra as exigências da chamada “Lei sobre a cessação da vida a pedido e o suicídio assistido”.

Entre os requisitos estão que o procedimento tenha sido pedido expressamente ao médico pelo paciente, de forma reiterada e convicta; que o paciente esteja consciente, que sofra de uma doença incurável e em estado terminal, que essa doença seja causa de um sofrimento prolongado e insuportável, sem qualquer hipótese de melhoria.

A prática da eutanásia na Holanda implica o acordo de dois médicos, pode ser pedida por pessoas a partir dos 12 anos, mediante o consentimento dos pais e o cumprimento dos requisitos acima referidos, sendo que a lei é restrita a cidadãos holandeses.

O colóquio “A Eutanásia e a Cultura do Cuidado”, promovido pela Universidade Católica Portuguesa, em colaboração com a Agência ECCLESIA, a Rádio Renascença e a iniciativa «Toda a Vida Tem Dignidade», surge numa altura em que a legalização da Eutanásia está em debate na sociedade portuguesa.

Na Assembleia da República foram já foi entregue uma proposta legislativa dedicada a esta questão, do Bloco de Esquerda, que pretende ver o diploma discutido até julho.

No auditório Cardeal Medeiros, a UCP – Lisboa trouxe à reflexão vários especialistas em Direito e em Saúde, para a abordagem a mais dois painéis: ‘Eutanásia e Estado de Direito’ e ‘A medicina na resposta à dor’.

Realce para a participação de Jorge Pereira da Silva (diretor da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da UCP); de Conceição Cunha (professora da Escola do Porto da Faculdade de Direito da UCP) e de Tiago Duarte (PLMJ).

Também de Miguel Oliveira e Silva (médico e professor catedrático FMUL), de Manuel Mendes Silva (Conselho de Ética da Ordem dos Médicos) e de Germano de Sousa (antigo Bastonário da Ordem dos Médicos).

E de várias figuras da sociedade portuguesa, como o cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, a líder do CDS-PP Assunção Cristas, e a antiga deputada Isilda Pegado, que integra o movimento ‘Toda a Vida tem Dignidade’, que também tem uma petição relacionada com a Eutanásia entregue no Parlamento português.

JCP

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Agência ECCLESIA

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