Vivências «dolorosas» na Semana Santa

Braga celebra uma tradição secular Desde os primeiros séculos cristãos, a Igreja celebra o mistério da salvação, nas suas três fases (Paixão, Morte e Ressurreição), no decorrer de três dias, que constituem o ponto culminante do ano litúrgico. Muitas comunidades, de norte a sul do país, têm formas «específicas» de viver a Semana Santa. Algumas destas celebrações são «dolorosas» mas atraem os cristãos locais e muitos visitantes. Em Braga, a Comissão Organizadora da Semana Santa aposta também, este ano, no incremento cultural – concertos durante a Quaresma em várias igrejas da cidade – que tem o objectivo de envolver a cidade nas solenidades. As celebrações incluem novidades também na rua, onde habitualmente se reúnem milhares de locais e forasteiros, muitos deles espanhóis, para assistirem às tradicionais procissões do Senhor dos Passos, da Burrinha, do Ecce Homo e do Enterro do Senhor. A comissão organizadora da tradicional “Procissão da Burrinha”, composta pelos párocos de São Vítor – José Carlos Azevedo e António Sérgio Torres -, representantes da Junta de Freguesia local e outros cidadãos bracarenses, apresenta, este ano, algumas novidades. Para além dos figurantes e andores, têm presença marcada as bandas de Cabreiros e Calvos, um pelotão de honra dos Bombeiros Voluntários de Braga, o Orfeão bracarense, para além da Orquestra dos Arautos do Evangelho e do Grupo de Cantares Mulheres do Minho, que vão enriquecer a passagem da procissão com temas de música sacra, no Largo da Senhora-a-Branca e em frente à Basílica dos Congregados. A “Procissão da Burrinha”, que se realiza no dia 23 de Março, sai da igreja paroquial de São Vítor e percorre as ruas do centro histórico da cidade. “Vós sereis o meu povo” é a passagem da Sagrada Escritura que dá o mote à procissão, integrada nas Solenidades da Semana Santa de Braga. Na apresentação do programa da procissão destacou-se a qualidade dos quadros do cortejo. Este ano, repetem-se os cerca de 700 figurantes, que se apresentam caracterizados a rigor, com um guarda roupa que pertence, na sua esmagadora maioria, à comissão organizadora da procissão. Refira-se que, no cartaz promocional do evento, os organizadores destacam a “Nossa Senhora da Fugida” (ou “Nossa Senhora do Egipto”), com o Menino ao colo, figuras representadas de forma peculiar. O Largo da Senhora-a-Branca e Rua de São Vítor já estão ornamentados com motivos alusivos ao período quaresmal, destacando-se os quadros em lona, alusivos à fuga de José para o Egipto ou da “Fugida”, com a Nossa Senhora e o Menino, que tentam escapar à morte (escultura da Senhora do Egipto ou da “Fugida” , como dizem os antigos documentos), feitos a partir da obra do artista bracarense Cândido Caldas. Se hoje tem o nome de cortejo bíblico, outrora era considerada a «procissão da Burrinha», nome pela qual “os populares ainda designam este evento”. Procissões que se caracterizam pela pompa e singularidade. Destacam-se a da Penitência, que percorre os «passos» do Calvário, fazendo-se em cada um deles uma breve alocução; a do Senhor Ecce Homo, com os farricocos envolvidos nos hábitos negros de penitentes, empunhando archotes e fogaréus; a Procissão do Enterro, que percorre a Catedral com o Santíssimo Sacramento encerrado no féretro; e finalmente a «sumptuosa» Procissão do Enterro do Senhor. Folheto apresenta passos do cortejo Os organizadores da “Procissão da Burrinha” forneceram à população alguns milhares de folhetos explicativos, para que se possa acompanhar e compreender da melhor forma todos os quadros do cortejo bíblico. O primeiro quadro representa Abraão, o primeiro crente, que, confiando na promessa de Deus, caminha para a desconhecida terra que Ele lhe indicou. A segunda passagem apresenta Jacob e os seus doze filhos, que deram origem às doze tribos de Israel. O terceiro painel simboliza a recepção que José do Egipto faz à família de Jacob, depois de ter sido vendido como escravo pelos próprios irmãos. A escravidão do povo israelita é representada na quarta etapa da procissão, e numa quinta, surge Moisés e as dez pragas do Egipto. Na sexta “estação” surge a miraculosa travessia do Mar Vermelho e, de seguida, representa-se a serpente de bronze. O oitavo painel recorda a celebração judaica da Páscoa e, o nono, a Arca da Aliança, símbolo da presença divina no meio do Povo. Os reis David e Salomão são representados no 10.o painel e, de seguida, surge, o profeta Isaías. A cena número doze apresenta as rainhas Judite e Ester. Depois surge a cena da Anunciação do ano Gabriel e algumas cenas bíblicas do Natal. Na 15.ª representação surge o nascimento de Jesus e, depois, apresenta-se a “Matança dos Inocentes”. A 17.ª etapa representa a fuga da Sagrada Família para o Egipto, com a exposição da imagem da Senhora do Egipto ou da “Fugida”. Neste quadro sobressai um conjunto de pessoas com ramos de flores amarelas, que recorda a Lenda dos Tremoços. Conta a tradição que a Sagrada Família atravessou, durante a fuga, um campo de tremoços, onde diversas pessoas dormiam. Milagrosamente, os tremoços não fizeram barulho e os fugitivos puderam prosseguir a sua viagem. O 18º quadro representa o seu regresso a Nazaré e, depois, o crescimento de Jesus. O vigésimo quadro, realizado pelas crianças da catequese, valoriza o Ano da Eucaristia, proposto por João Paulo II. Não seja apenas um «cartaz turístico» da cidade O cón. António Macedo pede a colaboração dos padres da Zona Pastoral da Cidade para evitar que as solenidades da Semana Santa, em Braga, se tornem «mais um cartaz turístico». O coordenador das Procissões da Semana Santa espera também que haja já este ano uma maior participação das crianças como figurados ou “anjinhos”, o que implica a colaboração dos pais. São quatro as procissões que se realizam em Braga durante a Semana Santa: a do Senhor dos Passos, organizada pela Irmandade de Santa Cruz; o cortejo bíblico “Vós sereis o meu povo”, uma iniciativa da paróquia de São Victor; a do “Ecce Homo”, sob a responsabilidade da Irmandade da Misericórdia; e a do Enterro do Senhor, promovida pelo Cabido da Sé e por aquelas duas Irmandades. «Tem-se trabalhado para fazer das solenidades [da Semana Santa em Braga] um espaço de anúncio de Jesus Cristo, de reflexão e de conversão. Mesmo assim, é evidente o perigo de se tornarem mais um cartaz turístico» da cidade, alerta o cónego António Macedo numa carta circular entregue aos padres que trabalham nas nove paróquias da Zona Pastoral da Cidade do arciprestado de Braga. «Não podemos esquecer a descristianização envolvente e a mobilidade turística e outras circunstâncias a elas ligadas. Sem julgar nem condenar estas realidades, e convivendo com elas, precisamos de valorizar espiritual e esteticamente as manifestações exteriores de fé, nas vias-sacras, procissões, espectáculos culturais, decorações de rua e outras», afirma também o Cónego Macedo na mesma carta. Incentivo à pastoral vocacional A Semana Santa em Braga começou com um apelo do Arcebispo Primaz para que na Arquidiocese se faça “um exame de consciência” do empenho na concretização do programa pastoral centrado nas vocações. Facilitando este exame, D. Jorge Ortiga fez cinco sugestões às comunidades paroquiais para que haja, quanto antes, «uma primavera vocacional». Tal acontecerá, segundo o Arcebispo de Braga, se houver uma tomada de consciência da situação actual e se a Igreja for capaz de «interpretar uma acção educativa dos adolescentes e jovens mais positiva e eficiente». D. Jorge Ortiga alertou que «a condenação e as denúncias dos males que caracterizam a cultura hodierna», além de não conduzirem «a soluções adequadas», podem até «tornar-se propaganda que afasta e desmotiva por falta de horizontes e referências mais atractivas». Também preocupante é notar-se que «quando aparecem sintomas e dados objectivos de vida com sentido, princípios e normas de conduta, os espaços que lhe concedem não são significativos e a vocação cristã, em todas as suas expressões, aparece como um dado errado, um elemento estranho de que convém eliminar qualquer referência à existência humana». Semana Santa na Póvoa de Varzim No Domingo de Ramos, dia 20 de Março, inaugurou-se, no Museu Municipal da Póvoa do Varzim, uma exposição sobre a Semana Santa. Nesta cidade, as celebrações da Semana Santa, que este ano acontece entre 20 e 27 de Março, são organizadas pela Confraria do Santíssimo Sacramento, instituída na capela da Madre de Deus no ano de 1622, com a colaboração da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim, Agrupamento do Corpo Nacional de Escutas (Matriz), Capela Marta e Museu Municipal. Na Quinta-feira Santa, a celebração da Ceia do Senhor (missa vespertina, sermão do mandato, cerimónia do lava-pés e procissão eucarística) tem início às 17h00. À noite realiza-se a tradicional visita às igrejas e capelas da cidade da Póvoa de Varzim, que nestes dias se encontram ornamentadas. Na Sexta-feira Santa, a celebração da Paixão do Senhor (via-sacra, liturgia da Palavra, adoração da Santa Cruz e Comunhão eucarística) começa às 15h00. À noite, meia hora antes do início da procissão com a «participação das autoridades civis e militares», é proferido o Sermão do Enterro, este ano a cargo do padre José da Costa Araújo. No Sábado Santo, a Vigília Pascal e Missa da Ressurreição tem início às 22h00 e inclui a bênção do lume, liturgia da Palavra, canto do Glória, liturgia baptismal, bênção da água e renovação das promessas do Baptismo, bem como a liturgia eucarística. No Domingo de Páscoa, a primeira missa é celebrada às 08h30, sendo celebradas mais duas neste dia na Matriz da Póvoa de Varzim: às 11h30 e às 19h30, esta no final da Visita Pascal que tem início às 14h30 e termina com um «cortejo festivo» desde a Praça do Almada até àquele templo. Característica do Domingo de Páscoa na Póvoa de Varzim é também a Procissão da Ressurreição, que sai às 10h00.

Partilhar:
Scroll to Top