Padre Miguel Lopes Neto, Diocese do Algarve, membro RedAlfamed e Universidade de Huelva

No IX Congresso Mundial da Pastoral do Turismo, em Roma, no contexto do Jubileu de 2025, voltou a ouvir‑se com clareza: o turismo é porta da evangelização. Não por proselitismo, mas pela via humilde da beleza, da arte e do encontro. Quando a Igreja acolhe quem chega, quando a cidade se deixa visitar com respeito, algo do Evangelho torna‑se visível: a dignidade de cada pessoa, a bondade da criação, a promessa de uma fraternidade possível.
Falou‑se de “turismo convivial”, essa forma de viajar que cria laços — entre peregrinos e comunidades, entre quem chega e quem recebe. Não se trata de consumir lugares, mas de os habitar por instantes, reconhecendo histórias e rostos. Uma visita a um templo torna‑se catequese quando a arte é lida como sinal, a liturgia abre-se em várias línguas e o acolhimento dá nome e rosto a cada visitante. A evangelização passa pela beleza, mas cumpre‑se no encontro: é aí que o coração se abre e a Palavra encontra casa.
Também o descanso tem teologia. Não é fuga, é contemplação e bênção da realidade. Tempo oferecido para ordenar a vida, reconciliar a alma, reencontrar a missão. Um turismo cristão sabe desacelerar para ver melhor, escutar mais, agradecer. E, assim, o “tempo livre” deixa de ser parêntesis para se tornar escola de liberdade interior e de responsabilidade.
Evangelização é inseparável de promoção humana. A Doutrina Social da Igreja recorda‑nos as coordenadas: dignidade, bem comum, solidariedade, subsidiariedade e cuidado da casa comum. No terreno, isto pede gestos concretos: informação clara de horários e serviços, celebrações em várias línguas, sinalética inclusiva, formação de equipas de acolhimento, plataformas digitais que orientem o peregrino. Pede ainda sustentabilidade real: proteger o património, valorizar economias locais, reduzir impactos ambientais. Onde a hospitalidade é séria, a cidade ganha e a Igreja torna‑se vizinha.
O turismo é, por natureza, diálogo entre culturas. Nos lugares bíblicos do Médio Oriente, em Roma no atravessar da Porta Santa, ou numa pequena paróquia costeira em agosto, o que acontece é encontro: histórias que se cruzam, preconceitos que caem, curiosidades que se transformam em respeito. A tecnologia pode ajudar — da informação multilingue à organização de fluxos —, mas nunca substitui o abraço, a escuta, a bênção. A regra é simples: a ferramenta serve o humano, o humano serve a paz.
Portugal tem aqui um caminho promissor. A vitalidade da Pastoral do Turismo — reconhecida em Roma — mostra que sabemos unir património, fé e serviço. As próximas jornadas nacionais, a 13 e 14 de fevereiro de 2026, no Santuário de Cristo Rei, serão oportunidade para traduzir em práticas aquilo que já intuímos: mapear itinerários espirituais, integrar migrantes e visitantes nas celebrações, formar voluntários, qualificar a mediação cultural, abrir redes com escolas, universidades e agentes do setor. Se o “turismo convivial” ganha corpo entre nós, ganham as comunidades, ganha o país.
No fundo, a pergunta é decisiva: que turismo queremos? Um turbilhão de fotos que nada tocam ou uma estirada de encontros que transformam por dentro? A evangelização, a promoção humana e o diálogo não são três estradas paralelas — são a mesma via quando viajamos com olhos de fé e coração hospitaleiro. A cada porta aberta, a cada palavra dita na língua de quem chega, a cada cuidado com a casa comum, o Evangelho faz‑se caminho. E esse caminho, quando é de todos, torna‑se paz.
