Vaticano/Ucrânia: 100 dias de preocupação, de Fátima a Moscovo

Papa tem multiplicado intervenções e celebrações mundiais pela paz

Foto: Lusa/EPA

Cidade do Vaticano, 03 jun 2022 (Ecclesia) – Os 100 dias de guerra na Ucrânia, que se completam hoje, foram acompanhados pelo Papa Francisco com um conjunto de intervenções e celebrações mundiais pela paz, de Fátima a Moscovo.

Na última quarta-feira, o Papa manifestou no Vaticano a sua “grande preocupação” com o bloqueio à exportação dos cereais da Ucrânia, dos quais “depende a vida de milhões de pessoas, especialmente nos países mais pobres”.

“Por favor, que não se usem os cereais, base da alimentação, como arma de guerra”, pediu, no final da audiência pública semanal que decorreu na Praça de São Pedro.

Um dia antes, Francisco promoveu uma celebração mundial, a partir de Roma, evocando as vítimas da guerra, com referência especial à Ucrânia, num Rosário pela paz que o ligou a vários santuários internacionais, incluindo Fátima.

“Esta noite, no final do mês especialmente consagrado a Ti, aqui estamos novamente diante de Ti, Rainha da Paz, para te implorar: concede o grande dom da paz, que termine em breve a guerra que, há décadas, se alastra em várias partes do mundo e agora também invadiu o continente europeu”, disse Francisco.

O Papa foi acompanhado na Basílica de Santa Maria Maior por vários representantes da comunidade ucraniana em Roma, numa iniciativa saudada pelo arcebispo-mor de Kiev, D. Sviatoslav Shevchuk.

“Agradeço ao Santo Padre, do fundo do meu coração, pela sua empatia com o povo ucraniano, que está a sofrer uma agressão injusta. Obrigado pela oração constante”, indicou o chefe da Igreja Greco-Católica da Ucrânia.

Ainda esta semana, numa mensagem dirigida à Comissão Internacional Católica para as Migrações, Francisco alertou para a crise provocada pela guerra, com milhões de refugiados e deslocados.

“Agradeço-vos, em particular, pelo compromisso alargado de ajudar as Igrejas na resposta aos desafios ligados à deslocação em massa, provocada pelo conflito na Ucrânia. Trata-se do maior movimento de deslocados que aconteceu na Europa desde a II Guerra Mundial [1939-1945]”, escreveu.

A 24 de maio, o Papa enviou uma mensagem ao patriarca ortodoxo de Moscovo, assinalando a festa do onomástico de Cirilo, com orações pela defesa da vida humana.

“Nestes dias, rezo ao nosso Pai Celestial para que o Espírito Santo nos renove e nos fortaleça no ministério do Evangelho, especialmente nos nossos esforços para proteger o valor e a dignidade de cada vida humana”, refere o texto, divulgado pela página oficial da Igreja Ortodoxa na Rússia.

Já a 12 de maio, o Papa encontrou-se com duas esposas de dois comandantes ucranianos que se encontravam barricados na siderúrgica Azovstal, em Mariupol.

Foto: Lusa

A preocupação com a guerra marcou a peregrinação internacional do 13 de maio, em Fátima, sob a presidência do arcebispo D. Edgar Peña Parra, substituto da Secretaria de Estado do Vaticano, o qual denunciou a “violência atroz e bárbara da guerra”.

No início de maio, o Papa mostrou-se disponível para um encontro com o presidente russo em Moscovo, a fim de abordar a guerra na Ucrânia, afastando uma eventual visita a Kiev.

“Sinto que não de preciso ir [a Kiev]. Primeiro tenho de ir a Moscovo, primeiro tenho de encontrar-me com Putin. Sou padre, também, o que posso fazer? Eu faço o que posso. Se Putin abrir a porta”, refere Francisco, em entrevista ao jornal italiano ‘Corriere de la Sera’.

Moscovo viria a rejeitar esta possibilidade, com o Vaticano a reafirmar a vontade do Papa em deslocar-se a Moscovo.

Noutra entrevista, o Papa foi questionado sobre o facto de nunca ter condenado explicitamente Vladimir Putin ou a Rússia, explicando que “nunca nomeia um chefe de Estado e, muito menos, um país, que está acima do seu chefe de Estado”.

A entrevista ao jornal argentino ‘La Nación’ abordou a visita do Papa à Embaixada da Rússia junto da Santa Sé, a 25 de fevereiro, um dia depois do início do conflito.

“Fui sozinho, não quis que ninguém me acompanhasse. Foi uma responsabilidade pessoal, minha, uma decisão que tomei numa noite em branco, pensando na Ucrânia. É claro, para quem o quer ver, que estava a sinalizar o Governo que pode pôr fim à guerra no instante seguinte”, indicou.

Francisco disse que qualquer guerra é “anacrónica” e explica que o beijo à bandeira da Ucrânia, vinda da cidade da Bucha, no Vaticano, foi “um gesto de solidariedade com os mortos, as suas famílias e com o que sofrem a migração”.

Na Quinta-feira Santa, o Papa lançou o livro ‘Contra a guerra. A coragem de construir a paz’, que apresenta o diálogo como “arte política” e apela ao desarmamento como “escolha estratégica”.

“Diante das imagens angustiantes que vemos todos os dias, diante do choro de crianças e mulheres, só podemos gritar: “Parem!”. A guerra não é a solução, a guerra é uma loucura, a guerra é um monstro, a guerra é um cancro que se autoalimenta, engolindo tudo! Além disso, a guerra é um sacrilégio, que destrói o que há de mais precioso na nossa terra, a vida humana, a inocência dos pequenos, a beleza da criação”, escreveu.

Foto: Vatican Media

A 15 de abril, Sexta-feira Santa, o Papa rezou pela paz no mundo, apelando à reconciliação entre adversários, no final da Via-Sacra a que presidiu no Coliseu de Roma.

A celebração acabaria por ficar marcada pela polémica, por causa da guerra no Leste da Europa: na XIII Estação, que evoca a morte de Jesus, a meditação inicialmente preparada em conjunto por duas famílias, da Rússia e da Ucrânia, acabou por não ser lida.

“Perante a morte, o silêncio é mais eloquente do que as palavras. Façamos, por isso, um silêncio orante, e que cada um, no seu coração, reze pela paz no mundo”, disse o leitor que conduzia as reflexões, num convite aos participantes.

Na bênção ‘Urbi et Orbi’ [à cidade (de Roma) e ao mundo] do Domingo de Páscoa, Francisco evocou as “numerosas vítimas ucranianas, os milhões de refugiados e deslocados internos, as famílias divididas, os idosos abandonados, as vidas destroçadas e as cidades arrasadas”.

“Os nossos olhos estão incrédulos, nesta Páscoa de guerra. Demasiado sangue, vimos; demasiada violência. Também os nossos corações se encheram de medo e angústia, enquanto muitos dos nossos irmãos e irmãs tiveram de se fechar nos subterrâneos para se defender das bombas”, referiu.

Foto: Ricardo Perna/Família Cristã

A 25 de março, numa celebração que ligou o Vaticano ao Santuário de Fátima, onde esteve um enviado pessoal de Francisco, D. Konrad Krajewski, o Papa consagrou a Ucrânia e a Rússia ao Imaculado Coração de Maria, perante a “ameaça nuclear”.

OC

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Agência ECCLESIA

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