Vaticano: «Pontificado convalescente» do Papa vai ser «muito criativo», afirma Austen Ivereigh

Jornalista defende que a «capacidade mental» de Francisco rejeita a possibilidade de renúncia, explica a «conversão pastoral» em curso e aponta a sinodalidade «para o futuro e é para toda a Igreja»

Foto: Vatican Media, Papa Francisco na Praça de São Pedro, no Jubileu dos Doentes

Lisboa, 11 abr 2025 (Ecclesia) – O jornalista e biógrafo do Papa Austen Ivereigh afirmou em declarações à Agência ECCLESIA que, … considerando o “pontificado convalescente” de Francisco “muito criativo”.

“Vai ser uma missão papal de outro estilo, um pontificado, não sei como chamá-lo, convalescente, muito limitado fisicamente, mas pode ser muito rico. Eu acho que vai ser muito rico e muito criativo”, disse em entrevista à Agência ECCLESIA.

Para Austen Ivereigh, a intervenção do Papa durante o tempo do confinamento, que encontrou “maneiras criativas de chegar às pessoas”, pode ser indicadora dos próximos tempos deste pontificado, agora assumindo o significado da palavra “paciência” na tradição cristã.

Foto: Nuno Gonçalves

“Neste mundo atual, onde há muita impaciência, que é uma forma de violência, o testemunho do Papa, convalescente, pode ser muito interessante e muito potente”, indicou.

O biógrafo do Papa valoriza a “capacidade mental” de Francisco, que lhe permitiu continuar a governar a Igreja Católica desde o início da hospitalização, não colocando a questão da renúncia.

“Eu acho que, por exemplo, se a saúde se deteriorasse até o ponto de ele ter de ir constantemente para o hospital, nesse caso, ele contemplaria o facto” [a renúncia, ndr], afirmou.

Austen Ivereigh recordou o comentário do Papa Francisco a uma carta de Paulo VI, onde admite a possibilidade de renúncia “para o bem da Igreja”, referindo que, para Bergoglio, o bem maior “não é a continuação do seu pontificado”, mas “o bem da Igreja”.

“Ele, como Papa, deve ter a liberdade de discernir esse momento. E a liberdade de discernir, para ele, é fundamental. E estou seguro que, neste momento, ele tem discernido, tem visto que tem uma missão para fazer. Mas, no futuro, quem sabe…”

Austen Ivereigh está em Portugal para a apresentação do seu livro “Em primeiro lugar pertencer a Deus”, onde publica as reflexões dos Exercícios Espirituais com o Papa Francisco, valorizando a atenção a cada pessoa, rejeitando a “ideologia, a rigidez, o clericalismo” e optando pelo discernimento.

“A capacidade do discernimento é fundamental para os jesuítas, é fundamental para o pontificado”, afirmou.

Para o jornalista, o “contraste entre uma Igreja mundana e encerrada em si mesma” e “uma Igreja aberta ao Espírito Santo”, atenta às periferias, que não vive “para o bem da instituição mas para o bem do povo”, é “uma chave para entender a reforma do pontificado”.

“A conversão pastoral é passar do abstrato, da norma, para manter a importância da norma e, ao mesmo tempo, ir à situação concreta das pessoas”, aponta.

Ivereigh lembra que Francisco é “o primeiro Papa de nova era global” e de uma “Igreja multipolar”, onde “não há um centro, mas vários centros”.

“Já não é uma Igreja Europeia com missões, é uma Igreja multipolar. E a grande questão é: como é que a Igreja pode manter e aprofundar a sua comunhão, vivendo com diferenças culturais muito grandes, entre estas áreas do mundo?”, questionou.

“A resposta tem que ser a sinodalidade! Só convidando a todas as partes da Igreja a contribuir para um discernimento em comum, discernimento apostólico em comum, diriam os jesuítas. E dessa maneira chegamos a entender, chegamos a discernir o que é genuinamente, digamos, universal”.

O jornalista valorizou o método da “conversação no espírito”, que definiu os trabalhos sinodais, fundamental para “processos de escuta e consulta”, sustentando que é o “grande dom da sinodalidade”.

“Se a Igreja, a longo prazo, for capaz de fazer uma conversão sinodal, verdadeiramente está em posição para servir o mundo, que já não é capaz de ter este tipo de conversação”, defendeu.

“A sinodalidade é da Igreja, não é deste Papa”

Austen Ivereigh defende que o processo de receção e avaliação das conclusões do sínodo sobre a sinodade, lançado durante o tempo em que o Papa estava internado, e a convocação de uma Assembleia Eclesial para o ano de 2028 “é uma forma de dizer que a sinodalidade é da Igreja, não é deste Papa”.

“Este Papa tem iniciado o processo, mas o documento final foi aprovado pelos bispos de todo o mundo. É da Igreja”, sublinhou em declarações à Agência ECCLESIA.

O biógrafo do Papa defende que “não se pode utilizar a situação atual de fragilidade do Papa como uma desculpa para não implementar o que o Espírito Santo tem dito à Igreja.

“Para mim, este processo de acompanhamento é uma forma de dizer: se morre o Papa, haverá outro Papa que vai continuar a implementação da sinodalidade, como Paulo VI implementou o Concílio depois da morte de João XXIII”, referiu.

“A sinodalidade é para o futuro e é para toda a Igreja”, defendeu Austen Ivereigh.

O jornalista britânico referiu-se também à realização de um conclave para a eleição do próximo Papa, que vai ter 73 países representados na Capela Sistina, mais 27 do que no conclave que elegeu Francisco, em 2013, valorizando os encontros entre todos os cardeais, que acontecem nos 10 dias anteriores à realização da eleição, onde “não falam de nomes”, mas do “papel da Igreja neste momento de crise mundial” e do “tipo de Papa” que é necessário.

OC/PR

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