Francisco alertou para «a supremacia do dinheiro sobre os seres humanos» e quem sacrifica «a vida de seus irmãos»
Cidade do Vaticano, 08 out 2020 (Ecclesia) – O Papa Francisco recebeu hoje a equipa do Comité de Peritos do Conselho da Europa (Moneyval) para avaliação das medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo e destacou um trabalho “intimamente ligada à proteção da vida” e a um sistema que “não oprime os mais fracos e necessitados”.
“Em muitos lugares, a supremacia do dinheiro sobre os seres humanos foi aceite e, às vezes, no esforço de acumular riqueza, há pouca preocupação com a origem dela, as atividades mais ou menos legítimas que podem ter produzido e os mecanismos de exploração que podem estar por trás”, disse o Papa na audiência desta manhã.
Segundo Francisco também pode acontecer que os recursos financeiros “sejam usados para espalhar o terror, para sustentar os mais fortes, os mais poderosos” e aqueles que estão dispostos a “sacrificar a vida de seus irmãos e irmãs sem nenhum escrúpulo, tudo em uma tentativa de manter seu poder”.
“Podem ocorrer situações em que, ao tocar no dinheiro, sujamos as mãos com sangue, sangue de nossos irmãos”, alertou no discurso enviado à Agência ECCLESIA, onde sublinhou que considera “necessário” refletir “de novo sobre a relação com o dinheiro”, como escreveu na Exortação Apostólica ‘Evangelii Gaudium’.
O Papa recebeu em audiência a equipa do Comité de Peritos do Conselho da Europa que avaliou as medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo; A quinta ronda de avaliação, acordada em 2019, faz parte das obrigações a que estão sujeitas todas as jurisdições pertencentes ao Moneyval, organismo especializado do Conselho da Europa.
“As medidas que estão a avaliar têm como objetivo promover um ‘financiamento limpo’, em que os ‘mercadores’ sejam impedidos de especular naquele ‘templo’ sagrado que, de acordo com o plano de amor do Criador, é a humanidade”
Francisco realçou que este trabalho está “intimamente ligada à proteção da vida, à coexistência pacífica da raça humana na terra” e a “um sistema financeiro que não oprime os mais fracos e necessitados”, e está “particularmente perto” do seu “coração”.
“As políticas de combate ao branqueamento de capitais e ao terrorismo constituem um meio de monitorizar os movimentos de dinheiro e de intervir nos casos de deteção de atividades irregulares ou mesmo criminosas”, salientou.
Segundo Francisco, parece que “a adoração do antigo bezerro de ouro voltou com uma aparência nova e implacável” na “idolatria do dinheiro e na ditadura de uma economia impessoal” onde falta um propósito verdadeiramente humano e alertou que “quando a economia perde a face humana” não se é “servido pelo dinheiro”, mas as pessoas tornam-se “servos do dinheiro”.
“Esta é uma forma de idolatria contra a qual somos chamados a reagir restabelecendo a ordem racional das coisas, que apela para o bem comum”, acrescentou.
Francisco explicou que o Vaticano introduziu recentemente no seu sistema jurídico medidas para “garantir a transparência na gestão do dinheiro, prevenir a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo”.
O Papa destacou que a 19 de agosto, uma portaria do presidente do Governatorato “exigia que organizações voluntárias e pessoas jurídicas do Estado da Cidade do Vaticano relatassem atividades suspeitas à Autoridade de Informação Financeira (AIF)” e no dia 1 de junho foi lançado o Motu Proprio para uma “gestão mais eficaz dos recursos e para a promoção da transparência, do controlo e da concorrência nos processos de adjudicação de contratos públicos”.
OC/CB/PR
A 3 de julho, a Autoridade de Informação Financeira (AIF) do Vaticano divulgou o relatório anual relativo a 2019, o primeiro após a mudança na sua presidência, após um ano marcado pela polémica ligada à venda de um imóvel em Londres; O documento regista 64 operações suspeitas, um aumento de oito casos face a 2018, mas em linha com a diminuição quantitativa, face a anos anteriores (150 em 2017; 207 em 2016; 544 em 2015).
Das sinalizações, resultaram quatro medidas preventivas, incluindo o congelamento de uma conta bancária, e 15 relatórios dirigidos ao promotor de Justiça do Vaticano. Outro dado destacado no relatório, enviado aos jornalistas, é a diminuição das operações transfronteiriças em dinheiro, em número e montante. A 23 de janeiro deste ano, o Estado da Cidade do Vaticano foi novamente admitido no Grupo Egmont, organização global das autoridades financeiras nacionais, após a suspensão da AIF em novembro de 2019. Em dezembro de 2010, Bento XVI instituiu a Autoridade para a Informação Financeira para garantir maior transparência nas finanças da Santa Sé e do Vaticano e combater o crime económico, criando um quadro jurídico que entrou em vigor a 1 de abril de 2011. |