Papa encontrou-se com participantes do V Encontro Mundial dos Movimentos Populares, reforçando compromisso na luta pelo direito à «terra, casa e trabalho»

Cidade do Vaticano, 23 out 2025 (Ecclesia) – O Papa recebeu hoje, no Vaticano, os participantes do V Encontro Mundial dos Movimentos Populares, apontando como prioridade o compromisso da Igreja Católica na defesa dos pobres e dos migrantes.
“Há mais de dez anos, aqui no Vaticano, o Papa Francisco disse-vos que tinham vindo para hastear uma bandeira. O que estava escrito nela? ‘Terra, casa e trabalho’. Era uma coisa nova para a Igreja e era uma coisa boa! Fazendo eco aos pedidos de Francisco, hoje digo: terra, casa e trabalho são direitos sagrados, vale a pena lutar por eles, e quero que me ouçam dizer ‘Estou aqui, estou com vocês!’”, referiu Leão XIV, numa intervenção divulgada pela sala de imprensa da Santa Sé.
O Papa evocou os discursos do seu antecessor sobre os três “T” (terra, teto e trabalho) e ligou-os à escolha do seu nome para o pontificado, inspirado em Leão XIII, que em 1891 publicou a encíclica ‘Rerum novarum’ (1891), sobre as “coisas novas” da revolução industrial e a situação dos trabalhadores.
“Pedir terra, casa e trabalho para os excluídos é uma ‘coisa nova’? Visto dos centros do poder mundial, certamente que não; quem tem segurança financeira e uma casa confortável pode considerar estas solicitações de alguma forma ultrapassadas. As coisas verdadeiramente ‘novas’ parecem ser os veículos autónomos, objetos ou roupas da última moda, telemóveis topo de gama, criptomoedas e outras coisas deste género”, advertiu.
Leão XIV assinala que, desde a ‘Rerum Novarum’, o pensamento social cristão deixa claro que “as lutas diárias pela sobrevivência e pela justiça social eram de fundamental importância para a Igreja”.
Hoje, a exclusão é a nova face da injustiça social. A diferença entre uma pequena minoria – 1% da população – e a grande maioria aumentou de forma dramática”.

A intervenção, no Auditório Paulo VI, abordou a ligação entre migrações e segurança, destacando que “os Estados têm o direito e o dever de proteger as suas fronteiras, mas isso deve ser equilibrado pela obrigação moral de fornecer refúgio”.
“Com o abuso de migrantes vulneráveis, não assistimos ao exercício legítimo da soberania nacional, mas sim a crimes graves cometidos ou tolerados pelo Estado. Estão a ser adotadas medidas cada vez mais desumanas, até mesmo celebradas politicamente, para tratar esses ‘indesejáveis’ como se fossem lixo e não seres humanos”, denunciou.
Perante representantes de instituições empenhadas na luta pela justiça social, em vários países, Leão XIV falou ainda da “dependência do uso de analgésicos, cuja venda obviamente aumenta os lucros das próprias empresas produtoras”.
“Isso também levou à dependência de opioides, que está a devastar particularmente os Estados Unidos”, observou o primeiro pontífice norte-americano da história da Igreja.
O Papa falou também da sua experiência de mais de duas décadas como missionário e bispo no Peru, onde fez parte de “uma Igreja que acompanha as pessoas nas suas dores, nas suas alegrias, nas suas lutas e nas suas esperanças”.
“Este é um antídoto contra uma indiferença estrutural que se está a espalhar e que não leva a sério o drama dos povos despojados, roubados, saqueados e forçados à pobreza”, sustentou.
A crise climática é talvez o exemplo mais evidente. Vemos isso em todos os eventos meteorológicos extremos, sejam inundações, secas, tsunamis, terramotos: quem sofre mais? São sempre os mais pobres. Perdem o pouco que têm quando a água destrói as suas casas e muitas vezes são obrigados a abandoná-las sem terem uma alternativa adequada para retomar as suas vidas. O mesmo acontece quando, por exemplo, camponeses, agricultores e populações indígenas perdem as suas terras, a sua identidade cultural e a produção local sustentável devido à desertificação do seu território”.

Leão XIV chamou a atenção para a necessidade de enfrentar as causas estruturais da desigualdade, afirmando que “enquanto os problemas dos pobres não forem resolvidos de forma radical, rejeitando a autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e enfrentando as causas estruturais da desigualdade, não se encontrará qualquer solução para os problemas do mundo ou, melhor dizendo, para nenhum problema”, tal como tinha escrito na exortação apostólica ‘Dilexi Te’.
O Papa evocou a crise da exclusão social, a “cultura do descarte” denunciada por Francisco, e a contradição entre o acesso crescente às novas tecnologias e a persistência das necessidades básicas por satisfazer.
“A falta de terra, comida, habitação e trabalho digno coexiste com o acesso às novas tecnologias que se espalham por toda a parte através dos mercados globalizados”, indicou.
Em relação aos minerais estratégicos para tecnologias modernas, a intervenção aludiu à extração do coltan na República Democrática do Congo, associada à violência e ao trabalho infantil, e destacou os riscos geopolíticos relacionados à exploração do lítio, uma ameaça à soberania dos Estados mais pobres.
“A Igreja tem de estar com vocês: uma Igreja pobre para os pobres, uma Igreja que se projeta, uma Igreja que corre riscos, uma Igreja corajosa, profética e alegre”, assumiu.
O V Encontro Mundial dos Movimentos Populares decorrer de 21 a 24 de outubro, em Roma.
O programa da iniciativa inclui “um festival de experiências e projetos comunitários, oferecendo um espaço para partilhar iniciativas de comunidades que procuram construir um mundo mais justo, solidário e defensor da dignidade humana”.
OC