Promotor de Justiça da Congregação para a Doutrina da Fé defende Bento XVI e fala de 3000 padres acusados em nove anos
O promotor de Justiça da Congregação para a Doutrina da Fé, do Vaticano, saiu em defesa de Bento XVI, afirmando que acusar o Papa de esconder factos sobre casos de pedofilia é “falso e calunioso”.
Em entrevista publicada pelo jornal “Avvenire”, da Conferência Episcopal Italiana, citada pelo Vaticano em comunicado de imprensa, Mons. Charles J. Scicluna precisa que “só em 2001 o delito de pedofilia voltou a ser da nossa exclusiva competência”.
Nesse ano, o então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal Joseph Ratzinger, enviou uma carta aos Bispos de todo o mundo sobre os “delitos graves” reservados a este dicastério da Cúria Romana.
Segundo Mons. Scicluna, “o Cardeal Ratzinger demonstrou sabedoria e firmeza na hora de tratar destes casos. Ele foi mais além, dando mostras de grande coragem e enfrentando algumas situações muito difíceis”.
“Portanto, acusá-lo de esconder factos é falso e calunioso”, atirou.
O responsável pelo ministério público do tribunal do antigo santo ofício diz que nos últimos nove anos houve “cerca de três mil casos de sacerdotes diocesanos e religiosas” acusados de delitos relacionados com pedofilia, cometidos nos últimos cinquenta anos, em particular nos EUA.
Mons. Charles Scicluna precisa que “cerca de 60% dos casos se referem a actos de ‘efebofilia’, ou seja, atracção física por adolescentes do mesmo sexo; 30% a relações heterossexuais e os restantes 10% à verdadeira pedofilia, ou seja, uma atracção sexual por rapazes impúberes”.
“É preciso reconhecer que o fenómeno não é tão extenso como se quer fazer acreditar”, indica.
Na maior parte dos casos, devido à idade dos acusados, não houve processo, mas medidas administrativas e disciplinares – como a obrigação de não celebrar Missa com fiéis e de não confessar ou de levar uma vida retirada e de oração.
O promotor de Justiça da Congregação para a Doutrina da Fé sublinha que não se trata de “absolvições”, embora não seja “uma condenação formal”.
“Se se obriga ao silêncio e à oração, algum motivo haverá”, sublinha.
Em 10% dos casos, “particularmente graves”, foi o próprio Papa a assumir “a dolorosa responsabilidade de autorizar um decreto de demissão do estado clerical”. Noutros casos, na mesma percentagem, foram os próprios clérigos acusados a pedir essa dispensa.
Mons. Charles Scicluna responde ainda à questão da prescrição destes casos, após 10 anos, que se começam a contar quando a vítima cumpre 18 anos de idade.
“A praxis indica que o período de 10 anos não é adequado a este tipo de casos e seria desejável um regresso ao sistema precedente da imprescritibilidade dos delitos mais graves”, admite o responsável pelo ministério público do tribunal da Doutrina da Fé.
A este respeito, no entanto, Mons. Scicluna sublinha que João Paulo II concedeu em 2002 a faculdade de derrogar a prescrição, caso a caso, a pedido de cada Bispo, algo que é “habitualmente concedido”.
Quanto ao “segredo instrutório”, este responsável explica que o mesmo serve para “proteger a boa fama de todas as pessoas envolvidas, acima de tudo as próprias vítimas”.
“A Igreja não gosta de justiça espectáculo, mas a normativa sobre os abusos sexuais nunca foi entendida como proibição de denúncia às autoridades civis”, prosseguiu.
A este respeito, aliás, Mons. Charles Scicluna precisa que as indicações do Vaticano são para que os Bispos “respeitem a lei” quando conhecem crimes cometidos pelos seus sacerdotes e os denunciem às autoridades judiciais.