Ucrânia: «Gostava de ver o Papa Francisco em Kiev» – José Milhazes

Jornalista que viveu 40 anos em Moscovo teme guerra nuclear e lamenta que ato de consagração que hoje vai acontecer «não chegue à Rússia»

Foto: Lusa/EPA

Lisboa, 25 mar 2022 (Ecclesia) – O jornalista José Milhazes afirmou hoje a vontade de que “um milagre se realizasse” com uma eventual ida do Papa Francisco à capital da Ucrânia, em Kiev.

“Gostava muito de ver o Papa ir a Kiev. Podem dizer-me que estou louco, mas qualquer forma de fazer parar esta guerra deve ser experimentada. Devemos tentar tudo, pedindo a Nossa Senhora – mesmo não sendo crentes – e a Deus que dê juízo ao presidente russo. É em situações de desespero que normalmente a humanidade acorda e pede ajuda celestial. Eu junto a minha voz aos que esta sexta-feira vão rezar pela paz na Ucrânia e na Rússia”, afirmou o jornalista à Agência ECCLESIA.

Apesar de afirmar o quanto gostaria de “ver esse milagre”, o jornalista que viveu durante 40 anos em Moscovo, na capital russa, é cético quanto a esse acontecimento, perante as atuais circunstâncias e contexto.

“O sofrimento humano é tão grande que é preciso por fim rapidamente a este conflito. Duvido que o Papa Francisco vá à Rússia, a não ser que o regime de Putin acabe, haja mudanças na cúpula da Igreja ortodoxa, se estabeleça um diálogo saudável entre as duas igrejas”, reconhece.

O Papa vai consagrar hoje a Rússia e Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria, em ligação a Fátima, durante uma celebração penitencial a que vai presidir no Vaticano, a partir das 17h00 (16h00 em Lisboa).

O mesmo ato vai ser realizado na Cova da Iria, pelo cardeal Konrad Krajewski, esmoler pontifício, como enviado de Francisco, com a recitação do Rosário na Capelinha das Aparições, incluindo mistérios em russo e ucraniano, a partir das 16h00.

José Milhazes explica que dificilmente este ato chegará à Rússia, “tal como foi escondido, em 1984”, mas indica que não se trata de um ato de “conversão” e sim de “iluminação dos seus dirigentes, para que parem com a carnificina”.

“Na altura o alcance foi reduzido mas deixou sementes. Haverá pessoas que vão prestar atenção a esta mensagem. Mas temo que seja censurada e a maioria dos russos, ortodoxos, continue a olhar para os cristãos católicos como inimigos, adversários”, explica.

O jornalista fala numa “matança” a acontecer na Ucrânia, que é preciso que termine.

“Numa situação trágica como esta, esta iniciativa, mais uma do papa Francisco, é relevante porque os ucranianos saberão que os seus irmãos católicos estão do seu lado”, valoriza, indicando o “número significativo de católicos e católicos de rito oriental, também ortodoxos da Igreja ucraniana autocéfala e um número significativo de ortodoxos ucranianos da Igreja Ortodoxa do Patriarcado de Moscovo”.

José Milhazes acredita que um encontro entre o Papa Francisco e o patriarca ortodoxo de Moscovo, Cirilo, só seria possível se “este levasse uma mensagem de paz”.

“Neste momento, enquanto a paz não for reestabelecida na Ucrânia, um encontro entre o Papa e Cirilo só podia acontecer se este trouxesse uma mensagem de paz para falar com o Papa, encontrarem-se e tentar conseguir paz. Neste momento não vejo essa possibilidade”, reconhece.

O jornalista critica a posição do responsável pelo patriarcado de Moscovo que indica ter “abandonado o seu rebanho, justificando a guerra contra a decadência do ocidente”, mas esquecendo as vítimas entre os fiéis “que deveria proteger”.

“A Igreja ortodoxa russa tem medo do poder laico e obedece-lhe. Não vai levantar a sua voz contra esta guerra. O diálogo é muito difícil e não estou a ver qual a saída. Pode ter consequências enormes e não sei qual poderá ser a receita para sair. É um homem, um pequeno grupo de pessoas que se sentem no direito de ditar as suas regras. E essas pessoas têm armas nucleares na mão”, lamenta.

“Se houver guerra nuclear, não fica ninguém. Os que apregoam que se pode realizar uma guerra nuclear limitada, percam as ilusões. Começar uma guerra é fácil, acabar com ela é difícil. A guerra nuclear pode ser muito rápida e a radioatividade não reconhece raças, povos ou crenças. Ela mata em quantidades tais que nós poderemos por fim à nossa civilização. Esta é uma grande interrogação. Não quero acreditar que se chegue a esta loucura, como não queria acreditar que Putin ia invadir a Ucrânia”, finaliza.

PR/LS

 

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