Tempo forte em que Deus fala através da sua Palavra

Nota Pastoral do Bispo do Funchal para a Quaresma de 2007 1 – “Deus concorre em tudo para o bem daqueles que o amam” (Rom. 8, 28), cada cristão é chamado à santidade, segundo o mandamento do Senhor – “Sede perfeitos, como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt. 5, 48). A Quaresma é o tempo forte em que Deus fala através da sua Palavra, da santa liturgia, dos exercícios de piedade e também dos santos, que viveram numa grande proximidade com o Senhor. O progresso espiritual do cristão tende para uma união sempre mais íntima com Cristo, mas Ele concede graças especiais ou sinais extraordinários somente a alguns, para “manifestar o dom gratuito feito a todos” (CIC, nº 2014). O caminho da perfeição passa sempre pela cruz, pela renúncia e combate espiritual que conduzem a uma vida na paz e na alegria das bem-aventuranças, fruto da ressurreição do Senhor. Durante o tempo quaresmal, no segundo Domingo, que celebra a glória de Jesus transfigurado no monte santo do Tabor, teremos a profunda alegria de abrir o processo de beatificação e canonização de uma religiosa hospitaleira do Sagrado Coração de Jesus, nascida nesta Diocese na paróquia de Santo António, a Irmã Maria do Monte, de baptismo Elisa de Jesus Pereira. A cerimónia terá lugar na tarde do dia 4 de Março, na Capela das religiosas hospitaleiras, em São Gonçalo. O Espírito Santo está a despertar a consciência do povo de Deus para a santidade heróica de outros nossos conterrâneos que, tendo nascido nesta Diocese, exerceram a sua missão apostólica no mundo foram chamados à união mística com Cristo, no mistério da Santíssima Trindade. No futuro, querendo Deus, poderão ser apresentados como modelos dos que ouviram o Pai proclamar do Seu Filho Jesus: “Escutai-O”, e seguiram o Senhor até ao calvário e à Páscoa gloriosa. 2. A Quaresma é tempo de preparação para o Baptismo dos catecúmenos, tempo de reconciliação para os penitentes, e para todos os cristãos, tempo de conversão, usando os meios que Jesus nos deixou – o jejum, a oração e a esmola. O Senhor exorta-nos a realizar estes actos com grande humildade, em segredo, para não provocar o exibicionismo mas o progresso na vida espiritual. Somos convidados a dar mais tempo à oração e meditação da palavra de Deus. O Senhor quer falar ao nosso coração, mas para ouvi-lO precisamos de silêncio, de tempo de retiro, de deserto, para atendermos ao essencial, “obedecer antes a Deus que aos homens”. O resultado do Referendo, a que foi sujeito o povo português, mostrou como alguns cristãos de crentes têm o nome, uma tradição, uma fé vaga, mas não obedecem a um dos mandamentos da lei de Deus que obriga para sempre e para todos – Não Matarás. Nos resultados finais, a nossa Diocese mostrou dignidade e responsabilidade ao dar uma vitória tão expressiva ao Não, embora não podendo inverter os resultados gerais. O episcopado português alerta-nos a ajudar de tal modo a maternidade e a família, de forma a tornar a lei inútil. 3. «Hão-de olhar para Aquele que trespassaram» (Jo.19, 37), foi o tema escolhido pelo Papa Bento XVI para a sua Mensagem da Quaresma de 2007. Na Cruz encontramos o amor oblativo (ágape) de quem só procura o amor dos outros. Contemplando Cristo suspenso do madeiro, somos atraídos pelo seu amor gratuito que espera ser correspondido e nos leva “a combater qualquer forma de desprezo da vida e de exploração das pessoas e aliviar os dramas da solidão e do abandono de tantas pessoas”. Durante a Quaresma contemplamos o Senhor antes de tudo na sua Palavra, na liturgia, nos sacramentos, de modo especial o da reconciliação, mas também nos actos de piedade popular como a Via Sacra e a Procissão dos Ramos. Este ano, após várias tentativas, vamos recomeçar a Procissão dos Passos na cidade do Funchal, no terceiro domingo da Quaresma, como era tradicional, procissão que atraía inúmeros fiéis, penitentes e devotos da Paixão do Senhor. A Igreja de São João Evangelista, conhecida por Igreja do Colégio, continuará com a tradição de organizar esta procissão confiada à Confraria do Senhor dos Passos. Foi o evangelista São João que, no quarto evangelho apresenta Cristo na Cruz com o lado trespassado pela lança a atrair os homens para a paz, a misericórdia e o perdão de Jesus Cristo. 4. A Quaresma é tempo de amar os irmãos. O jejum e abstinência devem ser colocados numa linha de solidariedade activa e efectiva. A espiritualidade da Quaresma é apresentada pela Igreja como um caminho para a Páscoa e mistério Pascal de Cristo e exprime-se no exercício das obras de caridade, no perdão, na oração, no jejum, principalmente no jejum do pecado. A ascese quaresmal é um exercício adequado para redescobrir o caminho para ser discípulo de Jesus Cristo, porque o Senhor não se conhece senão participando na sua vida, não de fora, mas por dentro. “quem quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mt. 16, 24). A ascese cristã consiste numa total disponibilidade interior ao Deus vivo que não nos pede tanto a oferta de coisas, mas antes de tudo a nossa própria pessoa e um coração contrito. Para muitos cristãos, o que hoje perturba o recolhimento quaresmal não é tanto o privar-se de certos alimentos, doces e tabaco, quanto as imagens, as palavras, os espectáculos e tantas coisas que a sociedade de consumo oferece, mas que dificultam a conversão a Deus. O jejum e abstinência em quarta-feira de Cinzas e sexta-feira Santa, assim como a abstinência nas sextas-feiras, continuam a vigorar na disciplina e espiritualidade da Quaresma. Orar é participar na oração de Cristo; o jejum e a esmola são formas de caridade porque a Quaresma é o tempo forte de actos de amor para com os irmãos, tanto os que estão perto como ao longe. Não há verdadeira conversão a Deus sem conversão ao amor fraterno (1 Jo. 4, 20). A renúncia a que o cristão é chamado na Quaresma, tanto através do jejum, como da esmola, é uma exigência da fé que se torna activa no amor pelos irmãos, é um sinal de justiça e caridade. Este ano, o fruto da renúncia Quaresmal será dividido em duas partes: uma para ajudar a reparação da capela da casa de retiros no Santuário da Paz e a outra para a Caritas de Moçambique, principalmente para os pobres das zonas devastadas pelas águas, e alagamento do rio Zambeze, que danificaram casas e campos agrícolas. «A liturgia deste tempo, escreve Bento XVI, convida a reflectir e a orar, valorizando ao mesmo tempo a penitência e as obras de caridade pelos nossos irmãos». Funchal, 25 de Fevereiro de 2007 † Teodoro de Faria, Bispo do Funchal

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