Comunidade propõe ícone da misericórdia, uma “representação completamente nova”
António Marujo, jornalista do religionline.blogspot.pt em serviço especial para a Ecclesia
Borgonha, França, 15 ago 2015 (Ecclesia) – Quando os irmãos de Taizé se levantam, assinalando o final da oração da noite de sexta-feira, há uma pequena corrida de dezenas de jovens para ocupar os lugares deixados vagos.
Segue-se o momento da adoração da cruz e muitos querem ser os primeiros. Ficarão depois horas na igreja, em oração.
“Dans nos obscurités, allume le feu qui ne s’éteint jamais…”, cantam ainda quatro mil vozes. “Nas nossas obscuridades, acende um fogo que não se apague nunca.” O ritmo é pausado, a melodia repete-se. Os cânticos meditativos “permitem a todos participar e manter-se juntos na espera de Deus”, lê-se num pequeno texto da comunidade sobre a oração comum.
Se a oração é o centro da vida da aldeia – três vezes por dia, os jovens que estão em Taizé são convocados pela torre sineira, a 100 metros da Igreja da Reconciliação –, a oração de sexta-feira à noite é um dos momentos centrais em Taizé.
A pequena comunidade da Borgonha (França), que reúne monges católicos e de diferentes origens protestantes, organiza a vida na aldeia num ritmo semanal, como se cada Domingo fosse a celebração da Páscoa.
Entre sexta e domingo, reza-se actualizando o mistério central da fé cristã: a morte e a ressurreição de Jesus.
O rito da adoração da cruz é feito com o ícone da cruz, da tradição ortodoxa, pousado no chão, com os jovens prostrados sobre ele. Durante duas, três horas, sucedem-se os cânticos, com a igreja ainda cheia de jovens.
Sábado à noite, a oração celebra a luz pascal. Milhares de pequenas velas acendem-se para festejar a ressurreição de Jesus.
No domingo, a celebração da eucaristia, segundo o rito católico latino, mas com algumas fórmulas adaptadas ao espírito ecuménico de Taizé, conclui este ciclo.
Hoje à noite, em Taizé, ao carácter festivo que a festa da luz já tem, juntar-se-á um outro: este será o primeiro momento para celebrar os 100 anos do nascimento do irmão Roger e os 75 anos da sua chegada à aldeia.
Amanhã, com a participação de uma centena de responsáveis de igrejas cristãs e também de líderes muçulmanos, judeus, budistas e hindus, assinalam-se ainda os dez anos da morte do irmão Roger – precisamente a 16 de Agosto de 2005.
Para esse momento de memória e celebração, os irmãos da comunidade calculam que possam estar presentes umas sete mil pessoas na oração, que começa às 16h00 (15h00 em Lisboa).
Por essa razão, hoje à noite e amanhã à tarde, os tempos de oração decorrem ao ar livre, pois nem a vasta nave da Igreja da Reconciliação permite incluir tanta gente.
Para os tempos de reflexão e oração nos próximos meses, e durante 2016, a comunidade propõe três palavras centrais no pensamento e nos escritos do irmão Roger: alegria, simplicidade e misericórdia.
Por essa razão, um ícone da misericórdia foi colocado no altar da Igreja da Reconciliação e proposto como fonte de oração.
O ícone da misericórdia, uma representação completamente nova, mostra Jesus Cristo no centro, colocado de pé. Ao seu redor, uma faixa desdobra-se em seis cenas, que representam a parábola do bom samaritano: o ataque dos salteadores, o sacerdote e o levita que passam sem cuidar da vítima, o samaritano que chega e apoia o homem, levando-o depois para a estalagem. A última cena mostra a vítima, o bom samaritano e o estalajadeiro que partilham uma refeição.
Nas imagens da parábola, a vítima está representada com a mesma cor branca de Jesus e em algumas cenas a semelhança com momentos da paixão de Cristo é evidente.
A última cena, da refeição, remete para o ícone da Trindade, mostrando a harmonia restabelecida.
Num texto de apresentação do ícone, explica-se: “Se uma piedade que esquece o próximo, como a do levita e a do sacerdote que passam ao lado da vítima, é apenas uma forma de idolatria, o amor, a obra de caridade do bom Samaritano, é o que restaura a humanidade à imagem de Deus.”
(o autor escreve segundo a anterior norma ortográfica)