Rita Valadas diz que 125 euros são «subsídio, não uma solução para resolver problemas» e pede políticas menos generalistas e mais próximas da realidade
Lisboa, 28 out 2022 (Ecclesia) – Rita Valadas, presidente da Cáritas Portuguesa, disse hoje que só “a proximidade e a inclusão” das pessoas na procura de soluções para ultrapassar os seus problemas, vai provocar uma alteração na qualidade de vida.
“Neste tempo de tanta dificuldade, que não vai melhorar tão cedo, este olhar de proximidade é muito importante porque é precioso dizer às pessoas que tantas vezes acham que não podem fazer nada, dentro das suas dificuldades, podem ter um gesto mínimo apoiado na proximidade para ajudar a chegar a outros recursos que existam, e isso pode fazer a diferença. Temos de ser capazes de considerar todas as dimensões, incluindo a dimensão da pessoa. No uso desta transversalidade de medidas, ignoramos o potencial que cada pessoa tem de agir sobre o sue destino. Não agimos com eles, mas por eles. E desperdiçamos recursos”, explica a responsável à Agência ECCLESIA.
O orçamento de Estado para 2023 foi aprovado na generalidade, na Assembleia da República, seguindo agora para a sua discussão na especialidade até ao dia 25 de novembro; o Presidente da República chamou hoje os conselheiros de Estado para debater a situação social do país.
Rita Valadas reconhece que o aumento do custo de vida era “esperado” mas não na proporção agora atingida.
“Em 2019 estávamos numa retoma que foi interrompida com a crise pandémica em 2020. A crise pandémica não terminou, com exceção de algumas zonas do país que dependiam diretamente do turismo, não houve retoma das situações”, indica.
As famílias que procuraram a Cáritas nesse contexto são ainda ajudadas pela instituição mas outros agregados familiares se juntaram aos pedidos de ajuda por causa do aumento do custo de vida e das taxas de juro.
A responsável explica que a crise social normalmente não começa ao mesmo tempo que a crise económica mas, especifica Rita Valadas, “neste caso a crise social está a começar ao mesmo tempo”: “As situações vão chegando, de forma menos agressiva, mas estão a chegar já, muito antes do que aquilo que estava esperado”.
As medidas políticas para combater a pobreza são, no entender da presidente da Cáritas, direcionadas para “um todo” e não para responder a situações concretas que divergem “de situação para situação, família para família, de cidade ou zona rural, do interior para o litoral”, e, por isso, funcionam como um “chapéu”.
“O Estado tem uma visão de chapéu que olha pelas vulnerabilidades e procura encontrar medidas politica que corrigem ou possam apoiar o desaparecimento das vulnerabilidades. Com a diversidade que encontramos no território, que transforma a situação de cada família numa situação diferente da outra, o Estado central não consegue lá chegar, o Estado local tem uma visão mais clara sobre o que se passa mas as medidas políticas não são determinadas pela proximidade, mas são chapéu e iguais para todos”, lamenta.
Por isso entende que 125 euros, a prestação dada pelo Estado para que as famílias possam enfrentar o aumento do custo de vida “está longe de ser uma solução para resolver problemas”.
“Vai trazer uma alegria num mês. 125 euros é dinheiro e fará a diferença no momento em que é recebido, mas está longe de ser a solução e não vai resolver os problemas que são estratégicos e duradoiros”, indica.
Rita Valadas explica que uma ação sobre a pobreza tem de agir sobre o rendimento e uma prestação de um mês não age sobre o rendimento: “É um subsídio, não um rendimento”.
A Presidente da Cáritas alerta para necessidade de se acabar com “dogmas” que antes tiravam do ciclo de pobreza quem tinha um emprego: “Hoje temos um elevado número de pessoas com um emprego estável mas encontram-se no limiar da pobreza”.
“A ação tem de ser sobre o rendimento e na proximidade. Cortar este ciclo vicioso a que assistimos, desde sempre – e é uma grande frustração para quem trabalha nesta área sempre com o foco promocional – tem de ser com ganhos sucessivos, com pessoas que efetivamente consigam sair dessa situação que os agarra a si e aos seus familiares à mesma situação de pobreza. Falamos de muitas instituições que trabalham há muitos anos para resolver o problema e não conseguem”, lamenta.
A responsável deixa ainda a nota da necessidade de ter esperança e não baixar os braços, porque “todos são úteis”.
“Não há ninguém que não seja útil à alteração da qualidade de vida. Os verbos são é esperançar e perseverar. São verbos que dizem muito sobre o que deve ser a nossa atitude e não baixar os braços”, finaliza.
LS