Jornalista Ricardo Perna acrescenta que «há uma nova maneira de viver em Igreja, que tem de ser preparada»
Lisboa, 16 out 2023 (Ecclesia) – Os jornalistas Octávio Carmo e Ricardo Perna acompanharam o início dos trabalhos da primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, no Vaticano, destacando objetivos, “tensões”, numa Igreja que “está a passar por uma transformação”.
“Este sínodo sobre a ‘sinodalidade’ tem um objetivo muito transversal que é iniciar processo de transformação das comunidades, – não é tomar decisões sobre matérias -, para que quem faz parte das comunidades tenha uma atitude mais responsável e mais responsabilizada, tenha mais intervenção, mais capacidade de intervir nos processos de tomada de decisão, mais opções pastorais, missionárias”, disse Octávio Carmo, chefe de redação da Agência ECCLESIA.
O jornalista considera que o debate “incomoda muita gente”, porque lida diretamente com “a questão do poder e dos ministérios de liderança”.
Ricardo Perna acrescenta que a Igreja Católica tem “bem clara o que é que a definição de poder, o que é que é a definição de serviço”, mas a prática “nem sempre tem ido ao encontro dessas definições que estão bem-feitas”, e o que tem de acontecer “é a mudança da prática”.
“A mudança da prática assusta, as pessoas que estão habituadas ao que sempre foi feito têm dificuldade em gerir uma forma diferente de fazer as coisas. Há uma nova maneira de viver em Igreja que tem de ser preparada”, assinalou o entrevistado desta segunda-feira no Programa ECCLESIA (RTP2).
Octávio Carmo salienta que a mudança que “é exigida numa Igreja sinodal é extremamente implicativa dos membros da comunidade” e isso exige muito dos leigos e leigas.
A primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos decorre até 29 de outubro, com o tema ‘Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão’; Francisco decidiu que a mesma terá uma segunda etapa, em 2024.
“Expectativas sobre alterações muito específicas fazem condensar o discurso mediático em matérias que não são o todo do sínodo”, alerta Octávio Carmo.
Neste contexto, o chefe de redação da Agência ECCLESIA deu como exemplo o Sínodo sobre a Família, também realizado em duas sessões (2014 e 2105, onde, a certa altura, centraram a questão dos trabalhos “no acesso dos divorciados aos sacramentos e aqueles trabalhos de dois anos foram muito mais do que isso”.
Ricardo Perna salientou que é nas “tensões que se consegue crescer”, observando que há a tendência para pensar, em cada tempo, que “é aquele que é complicado, aquele do grande cisma, das grandes divisões, das grandes tensões”, e este é um momento na história em que “a Igreja está a passar por uma transformação”.
Octávio Carmo observa que quem vê neste sínodo um sinal de esperança e “possibilidade de caminhos novos para a Igreja no século XXI obviamente celebra com muito entusiasmo”, da mesma forma que existem “pessoas que veem neste Sínodo uma ameaça a fundamentos que julgam necessários e imutáveis da vida da Igreja”.
“É preciso ter noção que os discursos mediáticos são de certa forma controlados e controláveis. Há quem queira passar determinadas mensagens, de um sinal ou de outro”, realça.
A assembleia sinodal que está a decorrer foi precedida por consultas e relatórios realizados a nível das comunidades locais, das dioceses, nacionais, por conferência episcopal, e continental, e Ricardo Perna, lembrando o tempo que ainda vai demorar até ao documento final do Papa, explica que este tempo de reflexão e de caminho “tem de ser aproveitado” pelas comunidades para iniciarem os seus próprios sínodos paroquiais, diocesanos, “no sentido de transformação e de leitura daquilo que foram as reflexões e perceção do caminho que tem de ser percorrido localmente”.
A Conferência Episcopal Portuguesa está representada no Sínodo pelo seu presidente e vice-presidente, D. José Ornelas e D. Virgílio Antunes, respetivamente.
HM/CB
A assembleia sinodal tem uma composição fora do habitual e os dois jornalistas destacaram também a disposição da sala onde decorrem os trabalhos, na Sala Paulo VI, que é “uma experiência diferente””. “Um grande círculo de mesas redondas: as pessoas vão não só ouvindo mas conversando entre si e debatendo, simbolicamente mais importante do que as questões estatísticas. É um sínodo que passa uma imagem de Igreja menos piramidal e em que as pessoas têm de aprender o confronto, mas o confronto saudável, de ideias, de debate e de se colocarem num lugar de escuta”, desenvolveu o chefe de redação da Agência ECCLESIA. Ricardo Perna assinala que este Sínodo dos Bispos é “nitidamente o culminar de um processo” iniciado, “aos poucos”, nos outros sínodos, porque “todos tiveram pequenas novidades que vieram juntar-se todas nesta dinâmica”. “Essa também era uma grande preocupação: Garantir que os trabalhos que foram feitos antes, a nível diocesano, a nível nacional e a nível continental, chegavam depois ao ‘Instrumentum laboris’ e aos trabalhos do próprio sínodo”, acrescenta. Sobre os participantes, Octávio Carmo realça a “possibilidade de um voto alargado a sacerdotes, a religiosas, e a leigos e leigas”, um leque “bastante significativo” de pessoas que têm direito a voto nesta assembleia sinodal. A assembleia sinodal tem 365 votantes – 54 mulheres – a quem se somam, sem direito a voto, 12 representantes de outras igrejas e comunidades cristãs (delegados fraternos), oito convidados especiais e colaboradores da Secretaria-Geral do Sínodo. Outras 57 pessoas, entre elas 20 mulheres, vão participar como peritos, à imagem do que acontecia no passado, ou “facilitadores”, ou seja, “pessoas especializadas cuja missão é facilitar os trabalhos nas diferentes fases”, sem direito a voto. Os jornalistas Octávio Carmo e Ricardo Perna integraram a parceria Consistório e Sínodo, que juntou vários órgãos de comunicação social e gabinetes de imprensa. |